Opinião
A esquina do Rio
O desfecho do julgamento do caso Bragaparques é um belíssimo exemplo do que tem sido a política nos últimos anos em Portugal.
Back to basics
O nosso destino não está nas estrelas mas sim em nós próprios.
William Shakespeare
Semanada
• As empresas públicas voltaram a furar os tectos de subida de endividamento, que atingiu 5,4% em 2013, quando o limite fixado era de 4% • o número de casais em que os dois estão desempregados aumentou 688% no espaço de três anos • a meio do primeiro período lectivo, ainda há 35 mil alunos sem professores e já há escolas que estão a defender o adiamento dos exames • Alberto João Jardim propôs uma revisão constitucional que estabelece um mandado único de dez anos para o Presidente da República • Rui Rio defendeu a realização de eleições primárias no PSD • apoiantes de Rui Rio, do Fórum Democracia e Sociedade, defendem a realização de um congresso antecipado do PSD • 30 dias após vencer as primárias do PS, António Costa continua sem apresentar propostas concretas • o guião para a reforma do Estado foi apresentado há um ano e continua por executar • em todo o mundo, são enviados 100 milhões de "e-mails" por minuto • o primeiro "banner" publicitário na Internet apareceu há 20 anos no pioneiro "site" da icónica revista "Wired" • a Internet já é hoje o segundo meio com maior investimento publicitário em Portugal, a seguir à televisão • Mira Amaral propôs que os investigadores dos laboratórios do Estado sejam classificados em função das patentes criadas e do trabalho feito em ligação com as empresas • o Instituto Politécnico de Bragança tem 1.200 alunos estrangeiros • aguarda-se que Alexandre Soares dos Santos se pronuncie sobre a compra do célebre hotel Paris Marriott Champs Elysées por uma empresa chinesa.
Golpe
O desfecho do julgamento do caso Bragaparques é um belíssimo exemplo do que tem sido a política nos últimos anos em Portugal. Advogados habilidosos e imaginativos, em conluio ideológico com agentes do Ministério Público, criaram, na última década e meia, sobretudo na sua primeira metade, um sistema de fabrico de processos jurídicos para contestar decisões políticas. Nem é bem só a judicialização da política, é o alinhamento ideológico do sistema de investigação judicial que é o mais chocante. O agora vereador José Sá Fernandes foi um dos especialistas nesse assunto e, por isso, o Bloco o recrutou sob o lema "O Zé faz falta". Cedo se percebeu que, a ele, fazia mais falta o apoio de António Costa que o do Bloco - e lá está o Zé a alugar a avenida para feiras e a fazer vários dislates autárquicos, sob o manto diáfano do politicamente correcto. A verdade é que este processo da Bragaparques foi o que levou à queda do executivo autárquico de Carmona Rodrigues e à oportuna convocação de eleições municipais antecipadas em Lisboa, que acabaram por colocar António Costa na linha de partida para as suas ambições, agora já perfeitamente claras. Costa deve a Sá Fernandes a construção dessa rampa de lançamento e os eleitores devem à conspiração justicialista o estado em que a cidade está - do Marquês do Pombal às inundações, passando pelas sujidades. Sobre a acusação, cito a decisão do Tribunal, que absolveu Carmona Rodrigues e os outros réus, na época afastados da Câmara: este processo teve por base um conjunto de "suspeições, impressões, convicções não sustentadas, boatos e rumores". Lá vai Lisboa...
Dixit
"Não é por razões fiscais que as pessoas vão ter filhos".
Rui Morais, Presidente da Comissão de Reforma do IRS
Folhear
Tenho, desde há uns anos, um fascínio pelo exemplar trabalho realizado pela Aperture Foundation no campo da divulgação e estudo da fotografia - seja nas exposições e debates que promove, seja nos livros que edita ou na revista que publica quatro vezes por ano, a Aperture Magazine. Só há pouco tempo tive ocasião de conhecer o local onde funciona, em plena zona de Chelsea, em Nova Iorque, num andar amplo em que coexiste o espaço de exposições e a livraria - no caso, a exposição era de imagens que fizeram a primeira página do The New York Times e marcaram a História. A Aperture Magazine tem 132 páginas, em grande formato, é excepcionalmente bem impressa em bom papel. Cada edição é dedicada a um tema, além de conter noticiário variado e sugestões. O tema central da edição de Outono da Aperture Magazine é "Fashion" e este número tem, como editores convidados, a dupla Inez & Vinoodh, que há 25 anos colaboram criando imagens invulgares de moda. Aqui estão referências à célebre responsável da Vogue Francesa, Emmanuelle Alt, e várias reflexões, de que destaco estas duas: a fotografia de moda foi uma incubadora de inovação e reflexão culturais, especialmente nos anos 60, 70 e 90 e, depois, a seguir ao 11 de Setembro; a outra é a que explora as ligações entre o trabalho da fotografia documental e o trabalho dos fotógrafos de moda. Destaque para os "portfolios" de Ed van der Elsken e de Jason Evans, este último com os trabalhos para a revista japonesa Hanatsubaki - são imagens impactantes. Há também um "portfolio" histórico com fotografias marcantes de Richard Avedon, Guy Bourdin, Annie Leibovitz, Bruce Weber, David Bailey, Deborah Turbeville, e Hans Feurer e uma revisitação da época de ouro das revistas britânicas como a I-D e The Face. Mais uma vez, neste número especial sobre a moda, a Aperture Magazine (disponível na Amazon), consegue conciliar a descoberta com a memória e a tradição.
Gosto
Do trabalho de edição de documentários e cinema português em DVD que a Cinemateca Portuguesa, dirigida por José Manuel Costa, começou a fazer em colaboração com o Museu de Etnologia.
Não gosto
Fiscalidade verde faz subir para 19 cêntimos a diferença do preço da gasolina face a Espanha.
Ver
Destaco, em primeiro lugar, os meticulosos e certeiros desenhos a tinta-da-china de Pedro Proença em "O Nu e a Fraude" (na imagem), que estão na Galeria Miguel Nabinho (Rua Tenente Ferreira Durão 18-B), onde a mitologia tem uma presença forte, e que o artista descreve como "uma reflexão sobre a escultura, a pintura e o cinema que não estão lá". Em segundo lugar, destaco a exposição "Objectos Imediatos", que mostra 93 obras de José Pedro Croft, feitas ao longo dos 12 últimos anos, em papel e escultura, em grande parte inéditas. Estão divididas pelo espaço do Torreão Nascente da Cordoaria e pela Fundação Carmona e Costa (Rua Soeiro Pereira Gomes 1). Na Fundação Carmona e Costa, estão 52 obras - 31 gravuras, 20 desenhos e uma escultura. As restantes 41 obras, 12 gravuras, 12 desenhos e 17 esculturas, duas das quais de grandes dimensões, estão na Cordoaria. O conjunto dos trabalhos permite perceber a ligação entre o suporte de papel e a escultura na produção de José Pedro Croft.
Provar
Hoje vou falar de uma instituição lisboeta que é o Bar do Hotel Ritz, situado no lobby, à direita de quem entra. O sítio, como toda a arquitectura do hotel aliás, é magnífico. Quando está bom tempo, pode utilizar-se o terraço, mas a zona interior é espaçosa e confortável, dominada por uma belíssima tapeçaria a evocar motivos vinícolas. Ao longo de todo o dia, o bar serve refeições ligeiras, algumas até algo elaboradas - embora estas estejam só disponíveis à hora de almoço e jantar. Durante a tarde e, sobretudo ao fim da tarde, o Bar do Ritz é um ponto incontornável de encontros entre figuras bem conhecidas da actividade empresarial, da comunicação ou da política. Há mesmo quem faça do local uma espécie de escritório e agende reuniões para o local ao longo da tarde - já vi algumas pessoas ficarem à espera, num qualquer sofá, de falar com uma personalidade porque o encontro anterior demorou mais e ela ainda está ocupada. Mas, reuniões à parte, o Bar do Ritz é um local excelente para petiscar durante uma conversa. Além da inevitável, mas exemplar, salada Caesar, há um belíssimo prego em pão especial (que pode ter ovo ou não), um hambúrguer com pickles e cebola confitada ou uma sanduíche de salmão com queijo Philadelphia e endro, além daquela que é talvez a melhor sanduíche club de Lisboa. Quem quiser só tapas, tem uma selecção de queijos ou de enchidos de barrancos. Os apreciadores de cozinha italiana têm risottos, raviolis e, sobretudo, um famoso fettuccine de lagosta e camarão. De quarta a sexta, há uma carta de sushi. Destaque ainda para a carta de vinhos do Porto e, ao fim da tarde, para os cocktails.
Arco da velha
O director do Instituto de Ciências Sociais deu instruções para que fosse retirado da circulação o mais recente número da revista daquela entidade, "Análise Social", justificando que a publicação continha imagens ofensivas, fotografias de graffiti nas ruas de Lisboa, que ilustram a insatisfação com o Governo e agentes económicos.
Ouvir
Quando comecei a ouvir o novo disco de Leonard Cohen, "Popular Problems", surgiu-me um sorriso. Aos 80 anos, Cohen continua a surpreender, a jogar maravilhosamente com as palavras. É impressionante esta capacidade que continua a mostrar. Defende-se, é claro. O seu estilo está cada vez mais próximo da fala do que do canto e os arranjos de Patrick Leonard permitem dar espaço às palavras e à sua voz, aqui e ali ajudada por outras vozes femininas. Cohen grava discos há 47 anos. Antes disso escrevia canções, como a que, em 1966, entregou a Judy Collins e ficou célebre - "Suzanne". Foi a escrever poesia e ficção que fez as primeiras edições - "Let Us Compare Mythologies", um livro de poemas. Data de 1956 e foi a sua estreia editorial. Há meio século que faz canções, grava discos, escreve livros de poesia e novelas, sempre um observador atento da vida, do amor e das relações entre as pessoas. Tem 15 livros editados, 13 discos de originais, seis mais gravados ao vivo e cinco compilações. Neste "Popular Problems", que me acompanha por todo o lado há umas semanas, destaco os temas "Slow", "Almost Like The Blues", "Did I Ever Love You", "Nevermind" e "Born In Chains". Conjuga o humor com o retrato dos tempos actuais, como faz logo na abertura do disco, em "Open": "I am slowing down the tune/ I never liked it fast/ you want to get there soon/ I want to get there last". Portanto, uma canção deste tempo.
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