Opinião
A esquina do Rio
Um amigo meu disse-me esta semana que não tem intenção de votar em Lisboa, onde vive, baseado numa máxima que tem seguido toda a vida: "voto em quem limpou, não voto em quem promete limpar, promessas leva-as o vento".
Back to Basics
Ter dinheiro é melhor que ser pobre - quando mais não seja por razões financeiras.
Woody Allen
Abstenção
Um amigo meu disse-me esta semana que não tem intenção de votar em Lisboa, onde vive, baseado numa máxima que tem seguido toda a vida: "voto em quem limpou, não voto em quem promete limpar, promessas leva-as o vento". Eu não posso estar mais de acordo e faço minhas as suas palavras. Também não votarei. Ainda agravo mais os meus sentimentos quando olho à volta e vejo ruas muito alcatroadinhas de fresco após anos de buracos, e dou comigo a pensar: mais vale aproveitá-las antes que chegue a chuva forte e o alcatrão se comece a diluir no Inverno, como é hábito e tradição lisboeta.
Só daqui a quatro anos, nas autárquicas que hão-de vir, é que havemos de ter alcatrão novo como este, que é afinal o maior cartaz da campanha eleitoral - e que não é pago pelos partidos, mas pelos contribuintes. O período pré-eleitoral caracteriza-se por promover rapidamente obras que há muito deviam ter sido feitas e por fazer toda a espécie de promessas. Por exemplo, Hernâni Dias, candidato do PSD à Câmara de Bragança, promete construir uma auto-estrada de Quintanilha até Zamora, em Espanha, num curioso caso de promessa de exportação de obra pública; e Miranda Calha, candidato do PS à freguesia de Belém/Restelo, garante que, se ganhar, na sua Junta os estudantes terão cursos de mergulho e de carta de marinheiro, certamente inspirado pela vocação marítima emanada da Torre de Belém.
Estas eleições hão-de ficar recordadas por "slogans" disparatados e pelo uso excessivo de "photoshop" em péssimos cartazes. Mas estas são também as eleições em que os partidos se abstiveram de clarificar a lei sobre os dinossauros autárquicos, em que a CNE se recusou a encarar a realidade e em que as televisões privadas resistiram a serem programadas pelos políticos. Nesta véspera de voto, quero recordar o que António Sérgio Rosa de Carvalho escreveu no "Público" a 22 de Agosto: "O papel da cidadania participativa é o de exclusivamente estimular, de forma critica e permanente, a reforma do sistema de representatividade política e de representar, sem o constrangimento dos compromissos, as verdadeiras ansiedades dos cidadãos, transformados posteriormente em votantes."
Semanada
• A receita do IVA desceu 2% este ano; a colecta de IRS aumentou 30% • o aumento da despesa com o subsídio de desemprego foi de 10% • o Tribunal da Relação do Porto absolveu um contribuinte que dirigiu um e-mail classificando as Finanças de "ladrões" • o investimento público caiu 500 milhões de euros até Agosto • a dívida directa do Estado aumentou mais de 19 mil milhões de euros nos últimos 12 meses • o número de dormidas em hotéis de 5 e 4 estrelas aumentou 16,8% em Julho • o vencimento líquido médio em Portugal é de 803 euros • a revista "Reader's Digest" fez um "ranking" de honestidade de 16 cidades e Lisboa ficou em último lugar na devolução de carteiras perdidas • Álvaro Santos Pereira anunciou estar em fase avançada a escrita das suas memórias de dois anos no Governo e disse ter retomado a escrita de um romance • em 82% das câmaras municipais, há um presidente ou vice-presidente que se candidata de novo, há 151 presidentes recandidatos, há 20 presidentes que substituíram os anteriores e que vão a votos pela primeira vez, e apenas 35 candidatos novos • o Índice da Economia Paralela de 2012 revela que o valor da economia paralela nesse ano foi de 44,28 mil milhões de euros, 26,74% do PIB, o que representa um crescimento de mil milhões de euros face ao ano anterior.
Arco da velha
António Costa reclamou da decisão do Tribunal Constitucional que o obriga a entregar ao diário "Público" um relatório dos serviços camarários, pedido por um jornalista e que o Presidente da Câmara de Lisboa se recusa a fornecer. O relatório, feito por um seu vereador, é sobre a adjudicação, por ajuste directo, a um reduzido número de empresas, de obras da autarquia. Como diz o cartaz, ele precisa de uns votos para continuar a fazer habilidades.
Provar
Andava há uns meses para experimentar este restaurante e fico contente porque, um dia destes, ao almoço, não frustrou as minhas expectativas. O "Mercado 1143" fica na LX Factory, é um espaço amplo, confortável e bem decorado. À noite fica cheio, dizem-me que é preciso reservar e que às vezes é um pouco confuso, mas ao almoço, nem por isso. Na mesa, o couvert era constituído por boas azeitonas, azeite e pão decente. Pediu-se polvo ao vapor com legumes - e quer o polvo, quer os legumes tiveram nota alta. O vinho branco que acompanhou era o da casa e cumpriu muito bem. A lista etílica não é enorme mas satisfaz e existe à disposição a já célebre cerveja artesanal Sovina. Aos almoços há saladas e petiscos leves e ao jantar a coisa muda, naturalmente, de figura e podem surgir petiscos como os raviolis de sardinha ou umas pataniscas de enchidos. O serviço foi atento, simpático e eficaz, três pontos que nem sempre andam juntos. Para reservas, o telefone é o 215 900 963 e os detalhes podem ser observados em www.mercado1143.pt ou no habitual facebook.
Dixit
Devemos escolher pessoas que não nos tragam problemas, aventuras e dívidas.
Paulo Portas, numa acção de campanha eleitoral em Sintra, com Pedro Pinto
Ver
O roteiro desta semana começa pela exposição "Youth Of Athens" da fotógrafa Pauliana Valente Pimentel, na Galeria Boavista (Rua da Boavista 50). Ao longo do tempo, Pauliana Valente Pimentel tem vindo a desenvolver a abordagem aprofundada de temas contemporâneos através da imagem fotográfica (e também do vídeo), um trabalho, para além de uma reportagem de circunstância, mais próximo da tradição do ensaio fotográfico que se foi perdendo com a descaracterização da utilização de fotografia em jornais. Uma outra galeria a visitar é a Baginski, no Beato (Rua Capitão Leitão 51), onde coexiste uma exposição de André Romão com uma das mostras mais interessantes da Trienal de Arquitectura, "Traço de Arquitecto", que aborda o processo criativo do português Manuel Aires Mateus e do brasileiro Marcio Kogan, muito focada no desenho de ambos - "pensar a desenhar e desenhar para pensar". Finalmente, até este fim-de-semana, ainda podem viver a Lisbon Week, com numerosas propostas por toda a cidade, que podem ser exploradas em www.lisbonweek.com.
Gosto
Em três dias, a Apple vendeu nos Estados Unidos nove milhões de unidades dos seus novos modelos de telemóveis - praticamente a população portuguesa.
Não Gosto
Em termos mundiais, o rácio entre a população com mais de 65 anos e a população até 14 anos (índice de envelhecimento) atingiu o seu ponto mais elevado, alcançando 131%. Em 2000 era de 102% e em 1990 de 68%.
Folhear
A revista norte-americana "Vanity Fair" está a completar cem anos de vida, a edição de Outubro é dedicada ao centenário e a capa é uma fotografia de Annie Leibovitz, com uma tentadora Kate Upton a segurar o bolo e a vela. Gosto que este número não seja um repositório do passado, deixando o lado de evocação ao livro que Graydon Carter, o brilhante editor da revista nos últimos anos, preparou e que deverá sair este Natal sob o título "Vanity Fair 100 Years". Destaques desta edição: Bob Colacello faz um artigo sobre o rei Juan Carlos de Espanha que vai dar que falar, uma entrevista com Roman Polanski aborda as acusações de sexo com menores, um artigo sobre Julian Assange aborda as suas ambições políticas e eventual participação em eleições, além de uma bela nota sobre a exposição evocativa do surrealista René Magritte no Moma de Nova Iorque. Claro que há um especial que evoca como a "Vanity Fair" abordou os grandes factos da História dos últimos 100 anos - e eu costumo dizer que, se pudesse, era este modelo de revista que eu ambicionava fazer: inteligente, textos bem escritos, reportagens bem investigadas, entrevistas reveladoras e grande fotografia.
Em matéria de revistas, a "Vanity Fair" é a que fica mais perto da perfeição.
Ouvir
Nos últimos anos, Elvis Costello fez mais coisas insípidas que discos interessantes. Quando soube que se tinha envolvido numa colaboração com The Roots, fiquei expectante. O disco redime-o de alguns deslizes recentes e mostra que a soma de dois talentos pode ser maior do que se imagina. "Wise Up Ghost", assim se chama o novo álbum, vem assinado por Elvis Costello & The Roots e a marca de hip-hop que os Roots trouxeram é bem marcada e encaixa que nem uma luva na dureza e tom cáustico e crítico das palavras de Costello - que continua a ser um mestre da escrita. Este conceito musical faz sair Costello da sua zona de conforto e obriga-o a ir a jogo na forma de escrever, que se adapta ao hip-hop nativo dos Roots, apesar de manter muitas referências, recorrentes na obra e em canções antigas de Costello. O momento mais inesperado e mais interessante é o extraordinário dueto com a mexicana La Marisoul, "Cinco Minutos Con Vos". Também gosto de outros temas, como "Stick Out Your Tongue", "Satellite" ou "Tripwire". Som forte, provocador por vezes, este CD não é garantidamente conformista e rotineiro. Não me admirava se "Wise Up Ghost" estiver na lista dos melhores discos deste ano. (CD Blue Note/ Universal)