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23 de Agosto de 2013 às 00:01

A esquina do Rio

Verão quente, na temperatura, na política, na maldição dos incêndios. Nos incêndios sabe-se que muitos começam inexplicavelmente de noite.

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Back to basics
A televisão é pastilha elástica para os olhos.
Frank Lloyd Wright

 

 

Agosto
Verão quente, na temperatura, na política, na maldição dos incêndios. Nos incêndios sabe-se que muitos começam inexplicavelmente de noite. O espírito incendiário domina também a política, como se constatou no Pontal, com Passos Coelho a lançar fagulhas para o Tribunal Constitucional. Eu diria que há alguma falta de jeito na manobra do Pontal - das duas uma: ou se sabe que o TC vai contra as medidas anunciadas e, nesse caso, mais valia ter feito o trabalho de casa antes; ou, não se sabe, está-se na dúvida e, nesse caso, acirraram-se os ânimos desnecessariamente. O querido mês de Agosto tem, no entanto, este ano, uma novidade: a confusão que vai nos tribunais por causa dos candidatos autárquicos.
Bem sei que a Lei é confusa, mas será que a latitude de confusão chega para justificar decisões opostas e contraditórias? Tudo isto faz duvidar ainda mais dos tribunais e das razões que motivam os juízes. Estamos perante mais um caso de judicialização da política, uma moda que por cá começou nos túneis, passou para despachos ministeriais e agora já vai na validação de candidaturas eleitorais. Alguma coisa vai muito mal quando há duas regras para uma só situação - a culpa disto é, em primeiro lugar, da Assembleia da República, que se recusou a clarificar uma confusão que os senhores deputados, eles próprios, criaram com a lei que aprovaram; mas é também de um sistema que produz juízos tão opostos em casos iguais. Tudo isto é a prova do mau funcionamento do regime e da inconsciência com que os partidos políticos lidam com estas situações.
Neste Verão assistimos a um desfilar de entrevistas a figuras públicas, umas mais retiradas que outras da actividade política, algumas até em funções oficiais, e em muitas se pode ler uma crítica implícita à maneira como o regime e os partidos políticos estão a actuar. Há uma parte do país que se pôs à margem das pessoas - vai vivendo num mundo muito próprio, frequentemente irreal, transmitindo recados codificados. Estão num círculo fechado, desde dirigentes partidários a juízes. Importam-se apenas uns com os outros. Assim, isto não vai a lado algum.

 

 

Semanada
Metade do valor da bolsa portuguesa está nas mãos de apenas 15 entidades investidoras - o conjunto das cotadas do PSI 20 tem um valor de mercado de 53,7 mil milhões de euros e as 15 entidades com maiores participações na bolsa portuguesa têm investimentos avaliados em 26,6 mil milhões de euros  os investidores angolanos são os estrangeiros que têm uma maior posição nas cotadas do PSI 20, com posições na Galp, Zon Multimédia e BPI  até ao início desta semana, os portugueses já tinham gasto mais de mil milhões de euros, este ano, em jogos sociais - metade do valor foi para apostar no Euromilhões  o Fundo de Pensões do Banco de Portugal tem maior investimento em dívida pública belga ou francesa que em dívida portuguesa - entre os seus beneficiários está Vítor Gaspar, que dias antes de se demitir deu instruções ao fundo da Segurança Social para reforçar o investimento em dívida soberana portuguesa  a Alemanha está a ganhar cerca de 41 mil milhões de euros com a crise europeia graças à redução dos juros que lhe são cobrados, segundo a revista "Der Spiegel"  só 3,9% dos portugueses vão de férias para o estrangeiro.

 

 

Arco da velha
Sábado à noite, a meio de Agosto, o trânsito na Avenida da Liberdade era caótico e as filas começavam ao fundo da Fontes Pereira de Melo, antes do Marquês. Em vários cruzamentos, agentes da PSP gesticulam, gritam, ninguém explica nada. O trânsito desencontrado nas laterais ajuda à complicação. António Costa transformou o trânsito da cidade num caos, não quer saber do conforto dos lisboetas. Desgoverna a cidade, enquanto promove festejos eleitorais.

 

 

Ouvir
Keith Jarrett, Gary Peacock e Jack DeJohnette estão musicalmente juntos, em trio, há três décadas. Há quem diga que este "Somewhere", editado este ano, mas gravado ao vivo há quatro anos, a 11 de Julho de 2009 na Suíça, retrata de forma exemplar a maneira como Keith Jarrett encara e assimila a sua própria obra. O título que dá o nome ao disco, "Somewhere", é um tema de Leonard Bernstein, incluído em "West Side Story". Mas aqui estão também outros clássicos como "Solar" de Miles Davis, "Stars Fell On Alabama", "Between The Devil And The Deep Blue Sea" , "Tonight" ou " I Thought About You" - além de dois originais de Jarrett, "Deep Space e "Everywhere". Poucos trios tradicionais (piano, baixo e bateria) se podem gabar desta capacidade de interpretação, desta irresistível forma de criar ritmo e emoção, sem alarde nem exibicionismo. (CD ECM, na Amazon).

 

 

Dixit
Nenhum de nós é tão poderoso quanto pensa.
Marcelo Rebelo de Sousa, ao Negócios

 

 

Ver
Os encontros de Fotografia de Arles são, desde há muitos anos, um dos momentos mais marcantes no campo da fotografia europeia. Para quem não possa lá ir, sugiro uma visita demorada a http://www.rencontres-arles.com, para se poder ter uma ideia do que é o conceito dos "Rencontres", mas também do trabalho de autores como Hiroshi Sugimoto, Sergio Larrain, Guy Bourdin, Alfredo Jaar, Vivianne Sassen, Gilbert Garcin ou Arno Rafael Mikinnen. Outro ponto alto é a exposição "Transition", que junta 12 fotógrafos sul-africanos e franceses. "le Mag", uma das áreas do site dos Rencontres, dá uma boa ideia do que se tem passado e se quiserem ter uma noção razoável, naquilo que a distância permite, uma hora de navegação por este Arles digital permite, pelo menos, perceber tendências e visualizar o rumo que a fotografia está a tomar.

 

 

Gosto
Investimento feito por jovens agricultores já vale 16% do capital aplicado no sector.

 

 

Não gosto
Devido à queda demográfica, o ensino básico perdeu 13 mil alunos em apenas um ano.

 

 

Folhear
"At Work" é um livro que relata o processo criativo da fotógrafa Annie Leibovitz. Mostra as primeiras fotografias que fez, da família, mas passa logo para as imagens que a tornaram uma fotógrafa incontornável, como as da demissão de Nixon em 1964, de Hunter S. Thompson em 72, de Tom Wolfe a conduzir no mesmo ano, dos Rolling Stones em 1975, de Lennon e Yoko em 1980, de Demi Moore em 1988 e tantas outras que se tornaria maçador. O livro inclui vários textos da própria Leibovitz sobre o seu método de trabalho e conta mesmo como algumas imagens foram obtidas. Também explica o equipamento que tem usado e inclui dez perguntas que todos gostaríamos de lhe fazer - com as respectivas respostas. Cito apenas uma, quando, respondendo ao pedido de conselho que pode dar a alguém que quer começar a fotografar, ela sugere que o faça perto de casa, na sua rua, na sua família, nos seus amigos - o essencial é que a fotografia faça sentido para quem a faz. São 240 maravilhosas páginas para quem gosta de fotografia e de livros de fotografia. A edição é da Jonathan Cape, de Londres, e às vezes encontra-se na FNAC - senão, vale a pena encomendá-lo da Amazon - Annie Leibovitz, "At Work", edição original de 2008, reimpressa em 2011.

 

 

Provar
Quando, ao fim da noite, a fome aperta, e a bolsa ainda resiste, uma boa possibilidade é o prego no prato do Gambrinus. Pode ser servido grelhado, com o tradicional molho Gambrinus, ou com um molho de natas - eu prefiro o segundo, o mais tradicional. A coisa consiste num pedaço de boa carne de bife, corte fino mas não demasiado, mal passado, com um ovo estrelado e batata frita - mas peçam-na bem frita para não vir encruada, o que às vezes acontece e é aborrecido. Por mim, neste caso, opto pela mostarda Savora para molhar o bico da batata, mas a casa disponibiliza também Dijon. A acompanhar só pode vir a túlipa Gambrinus, uma cerveja de pressão mista. Na mesa há-de estar pão de centeio cortado fino, e torrado, barrado de manteiga, adequado para o ovo e o molho. E, claro, para entreter enquanto não chega o prego, vale a pena pedir um dos deliciosos e insuperáveis croquetes da casa, feitos no momento. Devo dizer que tudo isto me recompôs da desilusão que foi o espectáculo daquele a quem chamavam Prince.

 

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