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Sem adultos na sala

Foi na Europa que os partidos democratas cristãos e sociais-democratas - o centro - construíram a liberdade, a democracia, os direitos humanos e civis, os direitos sociais, e os seus povos conheceram o que a humanidade praticamente não conhece fora desta União.

A paz e a união dos países da Europa, nos últimos 70 anos, é porventura a maior realização política colectiva da História.

 

Quando, na Primavera de 1950, a retórica bélica voltou, a memória do desastre ainda era o dia-a-dia da maior parte das pessoas que não tinham podido deixar de o viver.

 

Imagino eu… Que, dos senhores Monnet, Schuman , Adenauer e, já agora,  José Mendes Martins,  herdei uma vida tranquila.

 

Muito mais do que uma vida tranquila: uma vida farta. A pretexto da gestão do carvão e do aço, entre as duas potências que protagonizaram o início das desgraças do século, foi possível ir construindo cada vez mais os laços económicos e políticos que deram ao nosso eurocentrismo um estribo moral sem paralelo.

 

Foi na Europa que os partidos democratas cristãos e sociais-democratas - o centro - construíram a liberdade, a democracia, os direitos humanos e civis, os direitos sociais, e os seus povos conheceram o que a humanidade praticamente não conhece fora desta União.

 

Não foi só a paz, um bem que não deixa de ser o mais precioso, mesmo depois de várias gerações passarem pela Terra sem dar pela sua necessidade. Foi também o pão que se redistribuiu de maneira que o socialismo, no outro lado do muro, provou nunca não ser capaz de fazer.  

 

Claro que quando fomos avançando, nos sucessivos alargamentos, a governabilidade passou a ser cada vez mais difícil e quando chegamos a ser mesmo muitos, voltou muito a realidade de não sermos todos iguais no mando. É da vida.

 

Mas só muita falta de mundo ou de curiosidade se pode demonizar a Europa. Já a miopia dos que a dirigem hoje pode deitar muito a perder. E um fim-de-semana como este só pode alegrar tolos.

 

É verdade que, coerente com a sua consciência (nunca os antecessores do seu pensamento ou do da Sr. Le Pen teriam permitido esta Europa que conhecemos), o Syriza decidiu enfrentar aqueles de quem mais precisava: a União Europeia.

 

Tinham caminho fácil de explicar que os governos que os antecederam eram os primeiros responsáveis do estado a que o seu país chegou. Decidiram o contrário. Quiseram mudar as regras europeias para manter o estado das coisas na Grécia. O Sr. Tsipras conseguiu o pior de todos os mundos: depois de um referendo e de umas eleições, os gregos percebem esta semana que elegeram um líder que pura e simplesmente não tem palavra.

 

Entre a espada e a parede, no fim da traquinice, escolheu uma cama de pregos. Um acordo em que não se acredita, o contrário de tudo o que disse querer e em que fez acreditar os seus que queria.

 

Mas, pior estiveram os alegados adultos, para dizer a verdade... Por muito que seja preciso assustar a Sr. Le Pen e outros de igual calibre e que isso seja política, pura e dura - nada justifica o prazer de exibir esta crueldade gratuita. As crianças ensinam-se pelo exemplo, e quando se castigam não é com rancor.

 

Em vez de preparar a solução que o acordo não resolverá - nada ali permite esperança para economia grega - os líderes europeus decidiram disfarçar o problema com um remendo em que ninguém acredita e que só vai adiar mais a necessidade de reformas de fundo na política monetária europeia.

 

Em simultâneo, conseguem, espantosamente, que uma opinião pública - felizmente desabituada de dificuldades - os tome por algozes nessa novidade que é o de imaginar como natural uma obrigação perpétua de solidariedade sem retorno como parece que a Grécia precisa…

 

Nada se resolveu. Está mesmo na altura de voltar a eleger adultos antes que tanta garotada deite a perder este módico de tranquilidade que tanto trabalho deu a conquistar.

 

Advogado

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