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04 de Maio de 2020 às 18:29

Nova democracia iliberal

Os dinheiros da Europa, hoje, podem ser armas de destruição maciça de uma sociedade que se quer livre do Estado, como se este não fosse um conjunto de pessoas que quer dominar um outro conjunto de pessoas: a sociedade.

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A FRASE...

 

"’Ou os senhores se põem finos ou nós não pagamos a dívida’ e se o fizermos ‘as pernas dos banqueiros alemães até tremem’".

 

Pedro Nuno Santos, Negócios, 15 de Dezembro de 2011

 

A ANÁLISE...

 

O vírus da guerra sanitária pode estar a ser debelado. Ainda não o sabemos. A democracia liberal, todavia, está a perder a guerra com as emergências, as calamidades e as dívidas públicas e privadas. Com o medo, na versão marcelista, a preservação da estabilidade e do institucionalismo, domina-se uma sociedade.

 

Os empresários individualmente estão aquietados, pese embora as intervenções saudáveis dos órgãos patronais a exigirem que o Estado pague o que está a destruir. Os media estão emaranhados com a sua precariedade. O Estado paralisou os mercados e destruiu assim o capital das empresas por via de uma guerra sanitária, e agora não quer pagar as reparações de guerra. Ou melhor, quer fazê-lo à sua maneira para consolidar um projeto de poder disfarçado de um rumo a uma sociedade justa. Com o capital dos alemães e holandeses, os governos querem nacionalizar as perdas que criaram. Uma tarefa sem sucesso. Os tiques autoritários, e não de autoridade, emergem sempre nos tempos conturbados em que o rebanho anda à procura do pastor.

 

A fórmula da geringonça permitiu aceder ao poder, diretamente ou por interpostos atores, uma nova classe inqualificável e provinciana que desconhece a história da Europa e a recente portuguesa. A ideia da Europa não se coaduna com as nacionalizações por prolongado tempo, seja do que for, nem de ajudas de Estado para manter quem lhes agrada, ou substituir quem não lhes dá confiança, só porque os manuais das juventudes partidárias congelaram no tempo, por desconhecerem os resultados da propriedade coletiva dos meios de produção à escala de um país, ou para ter acesso a recursos para manietar a sociedade civil. Os povos da Europa do Leste provaram o fel dos impérios, a sua derrocada e a ascensão do maior embuste histórico que foi o socialismo soviético. Estes querem o crescimento económico para se tornarem mais livres e fazerem parte do clube dos ricos.

 

Os ex-dirigentes comunistas reconverteram-se à democracia e capitalismo, sabendo que o controlo do poder mediático e judicial, ou a autocensura generalizada, a par de eleições democráticas, perpetua uma democracia iliberal. Os dirigentes do Sul, com a memória dos fascismos e nacionalismos, fingem defender a mais elevada doutrina de justiça social e de liberdade, como refere Tolstoi na sua Rússia, e fingem que educam o seu povo nessa doutrina, apenas para ter o domínio sobre esse povo. "Somos um povo de esquerda", perpassa na opinião publicada até irromper o líder de direita que transforma o povo. Uma sociedade envelhecida, endividada, empobrecida, permite o germinar do iliberalismo. Os democratas que estejam atentos: os dinheiros da Europa, hoje, podem ser armas de destruição maciça de uma sociedade que se quer livre do Estado, como se este não fosse um conjunto de pessoas que quer dominar um outro conjunto de pessoas: a sociedade.

 

Este artigo de opinião integra A Mão Visível - Observações sobre as consequências diretas e indiretas das políticas para todos os setores da sociedade e dos efeitos a médio e longo prazo por oposição às realizadas sobre os efeitos imediatos e dirigidas apenas para certos grupos da sociedade.

maovisivel@gmail.com

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