Opinião
Três candidatos diferentes
Portugal organiza uma eleição Presidencial mas não assegura o voto por correio à generalidade dos Portugueses. As desculpas sucedem-se, mas não convencem. Bastava ter visto a televisão para se lembrarem de organizar o voto por correio em Portugal.
Na pré-campanha para as eleições presidenciais organizaram as televisões debates com os vários candidatos.
Na maioria dos debates a maioria dos candidatos repetiu pela milionésima vez, sem originalidade ou brilho, as frases gastas que esquerda e direita usam vezes sem conta. Trata-se de um "blá-blá-blá" a que já poucos prestam atenção.
Três candidatos, contudo, marcaram a diferença.
Um pela negativa, André Ventura. Com o seu discurso de divisionista ("Não serei o Presidente de todos os Portugueses") anticonstitucional ("Não quero esta Constituição"), autoritário ("É preciso alargar os poderes do Presidente") e racista contra as minorias nacionais. Gozando de permissividade que lhe seria negada na generalidade das democracias europeias foi levado ao colo pelos apresentadores que não o interromperam, não o contradisseram, não o confrontaram com as mentiras do seu discurso. Um passeio na carpete vermelha estendida a seus pés. A normalização da extrema-direita fascista como integrante legítima da democracia, com "d" pequeno, portuguesa.
O segundo destaque vai para João Ferreira. Muito sólido na argumentação, perspicaz na leitura dos acontecimentos, com um discurso novo, não extravasando, como outros candidatos, os limitados do Presidente e defendendo a ordem constitucional vigente. Muitas novidades em relação ao discurso tradicional comunista, nomeadamente em termos de política europeia, defesa dos direitos laborais e até no campo das políticas ambientais. Infelizmente foi sistematicamente interrompido pelos jornalistas que adotam sempre esta tática de desinformação com os candidatos dessa área política. As perguntas sobre a Venezuela e a Coreia do Norte, países cujo nível de vida não é, apesar de bloqueios económicos persistentes, substancialmente diferente do português mas que são apresentados como se fossem o inferno na terra, não ajudaram ao debate e à exposição das suas ideias. Aliás se a Venezuela fosse o que a pintam por que razão centenas de milhares de portugueses preferem lá ficar a voltar a Portugal?
O terceiro e maior destaque vai para Vitorino Silva. Foi ele que marcou o debate. Ganhou todos os confrontos. Eclipsou AV com a metáfora das pedras e foi o único a defender os Ciganos lembrando que dificilmente lhes dão trabalho tal é o preconceito da sociedade portuguesa, explicou o grande risco que a sociedade portuguesa corre de desbaratar os fundos europeus com a parábola da represa.
E foi ele que levantou a questão do adiamento das eleições que se realizam em pleno pico de pandemia e a elevada abstenção que vai acarretar. Foi ele quem interrogou Marcelo sobre a sua futura legitimidade se a maioria da população não for votar. Foi ele que colocou Marcelo como candidato populista (os três candidatos popular populistas, um só popular, ele próprio Vitorino, um popular populista, Marcelo e outro só populista, adivinhem) e elitista (diferença entre o candidatos da sardinha e o do caviar).
Vitorino também deu aos eleitores do PS a grande razão para não votar Marcelo – num segundo mandato em que já não precisa de votos para ser reeleito seguirá o percurso de todos os anteriores Presidentes e tudo fará para derrubar o Governo do PS.
Acresce ainda foi o único a levantar a questão das mulheres, com o seu enfoque na luta contra a violência doméstica, e da juventude. Ao ponto de Marcelo adotar em pleno debate a ideia de Vitorino de nomear um jovem para o Conselho de Estado.
É de facto obra. Um candidato isolado que marca a agenda e passa com brilho as suas ideias, todas elas razoáveis e cheias de bom senso. Que contraste com os candidatos do grande centro (da Iniciativa Liberal ao Bloco) de que não recordamos uma frase, um dito ou uma ideia inovadora.
Por ultimo uma palavra para a diferença entre a democracia na América e em Portugal. Todos vimos que as eleições americanas foram marcadas pelos milhões de votos pelo correio. Foram estes que deram a vitória a Biden. Se não fosse essa possibilidade milhões de americanos não teriam ido votar em plena pandemia. Era isso que Trump queria. Priva-los do voto.
Ora Portugal organiza uma eleição Presidencial mas não assegura o voto por correio à generalidade dos Portugueses. As desculpas sucedem-se, mas não convencem. Bastava ter visto a televisão para se lembrarem de organizar o voto por correio em Portugal.
Economista