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11 de Agosto de 2015 às 21:20

Retorno ao nuclear

A reactivação da central de Kensai marca um incerto e polémico retorno à produção nuclear de energia eléctrica no Japão depois da suspensão de todos os reactores em Setembro de 2013 na sequência do desastre de Fukushima.

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Os elevados custos da importação de petróleo, gás natural liquefeito e carvão, além da pressão do poderoso lóbi das empresas de energia, levaram o governo de Shinzo  Abe a rever a promessa de reduzir o máximo possível a dependência do nuclear após a catástrofe de Março de 2011.   

 

A produção nuclear supria, então, cerca de 30% das necessidades energéticas e o recurso a importações para colmatar o ocaso da indústria redundou em quatro anos de défices comerciais.

 

Uma fragilidade histórica

 

Num país em que apenas 9% da energia provinha de fontes renováveis - essencialmente hidroeléctricas apesar do elevado potencial geotérmico e solar -, uma lenta reconversão saldou-se por custos acrescidos: a electricidade desde 2011 subiu 29% para empresas e 25% para particulares.    

 

O Japão sempre dependeu do acesso a fontes de energias fósseis no estrangeiro que cobriram desde o início da industrialização no final do século XIX 90%  do consumo, o que suscitou investidas militaristas contra a China e as colónias europeias do sudeste asiático.

 

A partir da década de 60, a tecnologia norte-americana permitiu ao Japão desenvolver um programa nuclear civil que, apesar de graves acidentes industriais no arquipélago nos anos 90 - subestimados ou ocultados pelos poderes vigentes -, ultrapassou os traumas dos desastres de Three Mile Island, em 1979, na Pensilvânia, e Chernobil, Ucrânia soviética, em 1986.

 

O sismo e o maremoto

 

Fukushima obrigou, contudo, a rever as regras de segurança, e dos 43 reactores operacionais apenas cinco foram até agora aprovados para eventual reactivação.

 

O reactor n.º 1 de Kensai, na ilha de Kyushu, no sudoeste do arquipélago, poderá  funcionar em pleno em Outubro e, se não surgirem objecções de segurança, um segundo reactor entrará em actividade no final de 2015.

Mesmo que em Kagoshima tudo corra pelo melhor, a recuperação do sector nuclear é problemática e, por exemplo, a UBS estima que, mesmo no caso de serem aprovados os pedidos apresentados por 25 centrais para retomarem a produção, a descida de preços  da electricidade se quede os 9%.

 

A oposição ao retorno ao nuclear civil é significativa: 54% dos inquiridos numa  sondagem realizada na semana passada pelo Manichi Shimbun, um dos maiores diários nipónicos, pronunciava-se contra a reactivação de Kensai, sendo a favor 36%. 

 

Temor, após falhas insanáveis de segurança, e suspeitas crescentes quanto à conivência entre entidades administrativas e interesses empresariais alimentam a contestação, o que explica que tenham sido aprovadas apenas cinco pedidos de reactivação de reactores dos 25 solicitados e que dois sejam contestados nos tribunais.

 

A gestão das 17 mil toneladas de lixo nuclear é, também, questão a resolver não tendo sido possível aos sucessivos governos de Tóquio encontrarem até agora local  para depósito dos resíduos.    

 

Incongruências e compromissos

 

Estimativas do Ministério da Economia, Comércio e Indústria de Tóquio, divulgadas em Julho, passaram a apontar como metas para 2030 22% da produção de electricidade para o nuclear e 24% por conta de energias renováveis, enquanto o Ministério do Ambiente subia para 36% a quota de hidroeléctricas, fontes geotérmicas, solares, eólicas, ondomotrizes, etc. 

Além das incoerências do poder político avolumam-se dúvidas em relação à capacidade de o Estado japonês gerir o dossiê nuclear civil.

Como poderá a terceira economia mundial ultrapassar carências energéticas sem pôr em causa a sua autonomia de decisão política e os compromissos internacionais para redução em 20% em 2030 de gases com efeito de estufa em relação aos níveis de 2013?

 

Jornalista

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