Opinião
O parceiro polaco
A direita polaca ganhou um mandato eleitoral para promover políticas conservadoras e nacionalistas que vão obrigar a UE a arrepiar veleidades federalistas e renegociar consensos sensatos.
A vitória de domingo do partido Lei e Justiça (PiS), na sequência da eleição presidencial do seu candidato em Maio, Andrzej Duda, saldou-se pela primeira maioria absoluta da era pós-comunista num Parlamento que não contará com qualquer representante de esquerda, novidade absoluta desde a restauração da independência em 1918.
Os 38% do PiS permitem-lhe inclusivamente negociar acordos com o movimento conservador de Pawel Kukiz - músico rock e actor que após conseguir 20% nas presidenciais chegou aos 9% nas legislativas - de modo a atingir os 307 votos necessários entre os 460 deputados da câmara baixa para uma revisão constitucional.
Ganhar em toda a linha
Os 24% da Plataforma Cívica, o partido de centro-direita do actual presidente da UE, Donald Tusk, são a paga da arrogância e displicência de elites urbanas bem instaladas e indiferentes à insatisfação e expectativas defraudadas de camadas jovens, e populações rurais.
O PiS venceu em 14 das 16 províncias, foi maioritário entre homens e mulheres de todos os níveis educacionais e de rendimentos, arrebatou todos os grupos etários, mas impôs-se em especial nas áreas rurais, seduzindo, ainda, pessoas com qualificações mais baixas, jovens e eleitores entre os 50 e os 59 anos.
As propostas avançadas pelo PiS de redução da idade de reforma, baixa de impostos e subsídios para faixas de menores rendimentos, apoios à natalidade, aumento da carga fiscal sobre a banca e cadeias de retalho alimentar (com forte presença de grupos estrangeiros, entre eles o Novo Banco e a Jerónimo Martins) esbateram a glorificação estatística da aliança governamental da Plataforma Cívica e do Partido Agrário.
Crescimento médio anual do PIB de 3,2% em oito anos de governação, desemprego a cair para os 9,7 % (dados de Setembro), de nada valeram ante a campanha do partido de Jaroslaw Kaczynski para a sua protegida Beata Szydlo levar de vencida a primeira-ministra Ewa Kopacz.
Jaroslaw e a protegida
Antropóloga, filha de mineiro e assistente social, nascida em 1963 em Oswiecim, a Auschwitz da ocupação nazi, Szydlo, antiga presidente da câmara de Brzeszcze, cidade do sul da Polónia em que foi criada, deu um verniz de ponderação à campanha do PiS, aliviando o fardo divisivo de Kaczynski.
Szydlo terá, contudo, de provar que não é mera figurante descartável do homem-forte da direita polaca.
Jaroslaw, fundador do PiS com seu irmão gémeo Lech - presidente eleito em 2005 e morto no desastre aéreo de Smolensk, Rússia, em 2010 -, foi entre 2005 e 2007 um chefe de governo incendiário até perder as eleições legislativas para ser batido de novo nas presidenciais de 2010.
Os gémeos, porta-vozes da direita tradicionalista ultraconservadora católica, tentaram, repudiando as taras do anti-semitismo, instaurar uma IV República livre de gente conivente com o chamado arranjismo de ex-comunistas, para-comunistas, pós-comunistas, liberais, plutocratas e arrivistas da transição dos anos 80 e 90, afora homossexuais e ateus.
Nacionalistas e católicos
Falharam, então, mas o conservadorismo nacionalista de Jaroslaw cala fundo na Polónia e quadra bem com a contestação de Estados do centro e leste às políticas de acolhimento obrigatório de candidatos a asilo que Bruxelas tenta negociar.
A veia anti-russa, a suspeita ante ucranianos, são ainda notórios na Polónia conservadora que vota PiS, mas o ódio anti-alemão aparentemente surge mitigado ante o almejado padrão de prosperidade vislumbrado a ocidente. Kaczynski irá exigir respeito pela liberdade de circulação na UE para salvaguardar os emigrantes polacos na Grã-Bretanha e Alemanha, e acentuará a divergência política entre a eurozona e países visceralmente antifederalistas em convergência com os conservadores de Londres, críticos da gestão da moeda única, do centralismo de Bruxelas ou de poderes do Parlamento Europeu.
Em todas as frentes
O governador do Banco Central de Varsóvia será substituído em 2016, o Parlamento nomeará novos membros da administração, e, assim, o PiS poderá, em princípio, concretizar a promessa de injectar 350 mil milhões de zlotys (82 mil milhões de euros) no sistema bancário para financiamentos a pequenas e médias empresas a par do aumento da despesa pública.
A prevista política expansionista conta com exigências de renegociação em Bruxelas de contrapartidas para a indústria do carvão polaca, a maior do continente, ameaçando o acordo de redução até 2030 em relação a 1990 de 40% da emissão de gases com efeito de estufa.
Na oposição de Varsóvia ao expansionismo russo, a governação do PiS acentuará a necessidade de maior coordenação com os aliados bálticos da NATO e o compromisso de instalação de meios tácticos de resposta rápida militar nos estados da linha da frente leste.
As louvações de nacionalistas ucranianos dos feitos da guerrilha antipolaca na II Guerra Mundial sempre calaram mal em Varsóvia, mas pela banda do PiS passam a contar com condenação que terá custo político bem pesado.
Jornalista