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29 de Março de 2016 às 19:36

O legado nuclear de Obama

Ao cair do pano sobre a presidência é mitigado o balanço da proclamação de Obama em Abril de 2009 ao garantir a determinação dos Estados Unidos na "paz e segurança de um mundo sem armas nucleares".

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No primeiro grande discurso de política externa, o recém-empossado Presidente denunciou o "terrorismo nuclear como a mais grave e imediata ameaça à segurança global", apelou à não-proliferação e à redução dos arsenais das grandes potências.

 

A Cimeira sobre Segurança Nuclear (CSN) desta semana em Washington permite pesar as ambiguidades das políticas prosseguidas pela Casa Branca desde o discurso de Praga, reacções de aliados, adversários e inimigos.

    

A segurança industrial

 

A guarda segura de materiais radioactivos e matérias físseis, a prevenção e repressão do contrabando, a protecção de instalações da indústria nuclear civil, foram questões abordadas na primeira CSN realizada em Washington em 2010 por iniciativa de Obama.

 

Encontros em Seul (2012) e Haia (2014) ampliaram programas de cooperação bilaterais e multilaterais com as principais entidades responsáveis por questões de segurança: Agência Internacional de Energia Atómica, ONU, INTERPOL, Iniciativa Global para Combate ao Terrorismo Nuclear e Parceria Global Contra a Proliferação de Armas e Materiais de Destruição Maçica.  

 

A CSN apresentou a vantagem de os Estados interessados poderem desenvolver unilateralmente planos, com o compromisso de cooperação de outros países interessados, para acções de segurança nuclear civil. 

 

Importantes reduções ou a eliminação de reservas de urânio enriquecido e plutónio em 25 países, acrescida salvaguarda de materiais radioactivos (em instalações hospitalares e de investigação médica, por exemplo), fornecimento de equipamentos de despistagem em postos fronteiriços, portos e aeroportos, contam-se entre os resultados positivos a assinalar desde 2010.

 

Cerca de 1.800 toneladas métricas de materiais radioactivos em 24 países carecerem ainda de protecção adequada, segundo a Nuclear Threat Iniciative.

 

Uma iniciativa limitada

 

A implementação efectiva de tratados como a Convenção sobre a Protecção Física de Material Nuclear e Instalações Nucleares (1980 e ampliada em 2005) ou a Convenção sobre Terrorismo Nuclear (2005) é, por outro lado, condicionada por imperativos legais (ratificações em falta) e ultrapassa o âmbito da CSN.

 

A Rússia escusou-se a participar no que poderá ser o último encontro neste modelo, argumentando que a CSN esgotou o seu potencial, estando a Agência Internacional de Energia Atómica em condições de desenvolver os projectos necessários de segurança do sector, incluindo  contra ameaças de ciberterrorismo.

 

Os líderes da China, Japão, Coreia do Sul, Índia e Paquistão, pelo contrário, optaram por participar na CSN (Portugal faz-se representar através da União Europeia) e a sua presença demonstra que a política nuclear ultrapassa em muito a segurança da indústria civil.

        

O outro lado

 

Para Islamabade e Nova Deli, potências que nunca ratificaram o Tratado de Não-Proliferação Nuclear (TPI), é importante demonstrar boa vontade política quanto às dúvidas sobre condições de segurança das suas instalações nucleares civis.

 

Sul-coreanos e japoneses contam com nova oportunidade para abordar em Washington medidas contra a Coreia do Norte, assunto que Xi Jiping também discutirá com Obama, ultrapassando a agenda de uma cimeira centrada na segurança do nuclear civil.   

 

Trinta anos passados sobre Chernobil, cinco anos depois de Fukushima e levando em conta o inseguro armazenamento de desperdícios nucleares, os arsenais das grandes potências concentram 83% das existências de urânio enriquecido e plutónio.

 

A segurança destes materiais radioactivos e físseis escapa aos programas concebidos para a indústria civil e as ameaças existenciais derivam essencialmente dos arsenais nucleares.

 

Os Estados Unidos ainda não ratificaram o Tratado de Interdição Total de Testes Nucleares, os acordos de redução de arsenais estratégicos com Moscovo têm um contraponto em desacordos mútuos sobre sistemas de defesa antimísseis e armamento nuclear táctico, projectos de desenvolvimento de novas armas nucleares e ausência de consenso sobre desmilitarização do espaço.

 

O que fica

 

Dos anos Obama restará para averiguação o que advenha do reforço da capacidade bélica nuclear da Coreia do Norte e do acordo de congelamento do programa militar iraniano.

 

O pior dos fracassos, condenando quimeras de abandono de arsenais nucleares a troco de garantias internacionais, ocorreu, contudo, em 2014. 

 

Kiev desmantelou entre 1994 e 1996 o arsenal nuclear herdado da URSS e em contrapartida, nos termos do tratado de Budapeste de Dezembro de 1994, a Rússia, Estados Unidos e Grã-Bretanha comprometeram-se a respeitar a independência, soberania e integridade territorial da Ucrânia. 

 

A Ucrânia foi atacada pela Rússia, a península da Crimeia anexada, e ali se finaram promessas e ilusões.

 

Jornalista

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