Opinião
Uma guerra entre tronos
Porque só as almas amenas comem a farinha 33 de que apareceu ali um camião que levou de uns paióis distantes da rede cortada algum material militar. Esta narrativa não aguentaria para um filme de 007.
Nestes dias de início da nova temporada de "A Guerra dos Tronos", as palavras de Cersei Lannister são eternas: "Os deuses não têm piedade; é por isso que eles são deuses." No mundo da guerra e da política, estas palavras podem parecer cruéis e exageradas. Porque nele, apesar de tudo, há piedade. Coisa que não acontece no mundo dos sete reinos. Mas, se lermos a redacção do CEME, o general Rovisco Duarte, que parece querer encerrar de vez a balbúrdia de Tancos, fica-se com a ténue sensação de que não há aqui guerra nem paz, nem piedade nem autoridade. É um textinho escrito na água. O CEME fala em "conclusões" de diversas "averiguações" e, assim, volta a nomear os comandantes exonerados à pressa logo a seguir ao "assalto" a Tancos. Exonerações que levaram a demissões, recorde-se. Agora o CEME parece comprar um detergente eficaz para limpar qualquer nódoa incómoda. Nada que admire: o ministro que ainda não sabe que já não o é, Azeredo Lopes, e o CEME, que tenta sobreviver, são fortes candidatos a criar a aldeia da roupa branca do século.
O caso de Tancos foi demasiado grave para terminar assim. Com a transferência do paiol para outras unidades militares. Com o fim das exonerações. Com o risível valor do material desaparecido. Esta redacção do CEME não é um ponto final. Tancos não foi uma brincadeira de soldadinhos de chumbo ou um exercício de Rambos internacionalistas. É um poço com fundo. Porque só as almas amenas comem a farinha 33 de que apareceu ali um camião que levou de uns paióis distantes da rede cortada algum material militar. Esta narrativa não aguentaria para um filme de 007. Sabe-se que os problemas são outros. Espera-se que o DCIAP e a PJM vão até ao fim e que tudo não termine na terceira gaveta de uma qualquer secretária. Porque o rastilho é longo e incendiável. As Forças Armadas portuguesas não merecem prosas românticas como as de Rovisco Duarte. Pelo que têm feito, aqui e no estrangeiro, merecem mesmo um melhor CEME. E um melhor ministro.
Grande repórter