Opinião
As mulheres ao poder
Não vou contar o fim para não estragar o prazer de quem for ver a película (acto que deveria ser obrigatório para os jornalistas e que é muito recomendável para quem trabalha com escrita em geral).
Meryl Streep não é uma atriz, é uma matriosca. Quantas pessoas viverão dentro do seu corpo?
Meryl exagera no direito de ser brilhante. As suas performances equiparam-se a desportistas de alta competição.
Meryl é Phelps, é Shaquille, é Ronda, é Tiger, é Senna, é Cristiano, é as irmãs Williams juntas ao mesmo tempo agora.
Começo por Meryl, mas quero falar sobre o filme "The Post" como um todo.
Há muito que Hollywood não produzia um filme tão pertinente, tão necessário quanto este.
Pertinente por falar dos grandes temas da agenda do dia: a eterna luta entre o bom e o mau jornalismo (ou, ao menos, entre o jornalismo combativo e o irrelevante; o empoderamento feminino; o poder político a desafiar as regras da democracia na tentativa de criar uma realidade alternativa.
Necessário pois inteligente: ajuda a trazer alguma luz e ponderação onde dominam as polémicas e o obscurantismo.
Além do mais, "The Post" é uma aula de "storytelling".
Para quem não conhece a história (que é baseada em acontecimentos verídicos), a longa mostra-nos uma "jornada de heroína" exemplar.
No começo dos anos 60, com o suicídio do marido, Katharine Graham herdou um jornal que já era seu por direito. Anos antes, o pai de Kat preferiu entregar o poder do "The Post" ao genro do que a uma mulher, no caso, a própria filha.
Tratada com desdém por todos os homens à volta, ela hesita em tomar posições de confronto quando chamada à luta.
Tem um mentor que a acompanha e tenta prepará-la para o combate, mas sabendo que só ela mesma pode sair daquele torpor e revelar-se uma guerreira.
Quem conhece o esquema da "Hero's Jorney" descrito por Joseph Campbell (base teórica para o guião de "Star Wars", por exemplo) reconhecerá no filme um arco narrativo perfeito.
Não vou contar o fim para não estragar o prazer de quem for ver a película (acto que deveria ser obrigatório para os jornalistas e que é muito recomendável para quem trabalha com escrita em geral).
Mas fica a dica: durante quase a totalidade do tempo Meryl diz uma série de coisas, mas a pensar justo o contrário. E é nesse subtexto permanente que vemos todo o seu talento. Que mulher!
Ou como diria o meu Tio Olavo, citando Simone de Beauvoir: "Ninguém nasce mulher: torna-se mulher."
Publicitário e Storyteller
Artigo em conformidade com o novo Acordo Ortográfico