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Opinião
03 de Janeiro de 2013 às 10:55

Flexibilidade no trabalho e horário concentrado

A flexibilidade veio para ficar e irá acentuar-se em 2013, que se estima ser um ano de grandes desafios e mudanças.

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Com os avanços das tecnologias de informação e comunicação (TIC), a terciarização da economia, a globalização, a mobilidade de fluxos financeiros, a deslocalização do trabalho, a subida do desemprego e a crise internacional, a Flexibilidade tem vindo a assumir maior protagonismo nos mais diversificados domínios, particularmente, na Gestão de Recursos Humanos, na Economia, na Sociologia do Trabalho e no Direito do Trabalho, com vista à redução de custos e uma maior produtividade e competitividade das empresas.


Tudo indica que a flexibilidade na sua acepção mais ampla (compreendendo nomeadamente as diferentes formas de contratação laboral, modelos de organização dos horários de trabalho, mobilidade funcional, mobilidade geográfica e pluralidade de formas de cessação do contrato de trabalho) veio para ficar e irá acentuar-se em 2013 que se estima ser um ano de grandes desafios e mudanças.


A flexibilidade torna-se, cada vez mais, um marco importante do século XXI e factor de convergência entre os diferentes Estados que procuram aproveitar as melhores práticas de cada um, sem descurar a diferença de contextos.


Actualmente, o objectivo primordial dos países do mundo ocidental consiste em "atingir um nível ideal de flexibilidade, susceptível de manter a competitividade das empresas e da economia, a par do bem-estar dos seus cidadãos" 1 .


Tal objectivo deverá também ser abraçado por empregadores, trabalhadores e parceiros sociais que aquando da implementação de qualquer medida de flexibilidade deverão ter presente que o sucesso da mesma dependerá da sua capacidade para manter a competitividade a par do bem-estar dos trabalhadores e que é necessário definir estratégias tendo em vista o bem comum a curto, médio e longo prazo.


Assim, esgotadas todas as medidas de racionalização possíveis (por parte de empregadores e trabalhadores sobretudo na optimização do tempo de trabalho), os empregadores ao serem confrontados com o desafio de alcançar um equilíbrio entre a necessidade de fazer face a picos de trabalho decorrentes das pressões do mercado e imposições dos clientes e de assegurar a segurança, saúde e conciliação da vida pessoal dos trabalhadores, deverão procurar procedimentos e escolher modelos de organização do trabalho mais adequados.


Para além dos modelos prosaicos, as organizações (através do seu quadro de pessoal actual) podem recorrer contemporaneamente a regimes de flexibilidade temporal tais como a adaptabilidade de horários, o banco de horas ou o horário concentrado.


Tais regimes, embora não isentos de críticas, permitem a redistribuição dos tempos de trabalho sem qualquer aumento do período normal de trabalho (PNT) estabelecido por Lei, por Instrumento de Regulamentação Colectiva de Trabalho (IRCT) e/ou por contrato de trabalho, ou seja, possibilitam a trabalhadores e empregadores fazerem uma gestão mais adequada às necessidades sentidas das horas diárias, semanais ou mensais a que o trabalhador se encontra contratualmente obrigado.


Em síntese, o regime da adaptabilidade assenta no cálculo do tempo de trabalho em termos médios, exigindo que o trabalhador que trabalhe mais horas num determinado dia ou semana tenha de prestar menos noutro dia ou semana, com vista a que a média do tempo trabalhado num período legalmente definido (designado período de referência) corresponda ao PNT a que o trabalhador se encontrava contratualmente obrigado.


O banco de horas, embora também assente no cálculo do tempo de trabalho em termos médios, distingue-se do regime da adaptabilidade na medida em que não se encontra sujeito a um período de referência legalmente estabelecido, nem implica a observância do prazo legal para a afixação dos horários de trabalho em caso de alteração dos mesmos.


Quanto ao horário concentrado, este distingue-se dos regimes da adaptabilidade e do banco de horas que foram abordados em artigos anteriores, não podendo ser aplicado em simultâneo com a adaptabilidade.


Mais precisamente o horário concentrado admite que o PNT diário seja aumentado até quatro (4) horas diárias com recurso a uma das seguintes vias: (i) por acordo entre empregador e trabalhador ou por IRCT para concentrar o PNT semanal no máximo de quatro (4) dias de trabalho; ou (ii) por IRCT para estabelecer um horário de trabalho que contenha, no máximo, três dias de trabalho consecutivos, seguidos no mínimo de dois (2) dias de descanso, devendo a duração do PNT semanal ser respeitado, em média, num período de referência de quarenta e cinco (45) dias.


Ao IRCT,ao contrato de trabalho ou ao acordo celebrado, posteriormente, com os trabalhadores que regule o horário concentrado compete estipular a retribuição e outras condições da sua aplicação. Para o efeito, tal como ocorre no caso do banco de horas, não existem aqui quaisquer imposições mínimas.


Note-se que a presença das formas flexíveis de organização do tempo de trabalho conta com uma menor incidência em Portugal do que na generalidade dos países europeus, continuando a recorrer-se primordialmente às modalidades clássicas. Tal facto deve-se, desde logo, à dificuldade associada à obtenção de respostas adequadas e imediatas às variadas incertezas que as prescrições legais suscitam no momento da escolha e implementação destes mecanismos por quem gere uma organização.


Até à presente data, o horário concentrado não tem merecido significativa regulação em sede de IRCT. Para que se possa inverter a tendência de quase inexistência de modelos de flexibilidade temporal nos IRCT torna-se fulcral a total transparência e uma verdadeira vontade negocial entre as partes, sem qualquer pretensão de aproveitamento de adversidades económicas.


É, igualmente, crucial que exista uma maior optimização da gestão de tempo, seja posto termo a casos de administração deficiente e não sejam implementadas medidas restritivas injustificadas.


Em suma, é preciso tornar a mudança possível neste novo ano reforçando-se, desde logo, as relações de confiança entre os diversos actores sociais.

 

 
Tome nota
1. Os regimes de flexibilidade temporal, como a adaptabilidade de horários, banco de horas ou horário concentrado, permitem a redistribuição dos tempos de trabalho sem qualquer aumento do período normal de trabalho (PNT);

2. O horário concentrado pode ser implementado por acordo entre o empregador e o trabalhador ou por Instrumento de Regulamentação Colectiva de Trabalho (IRCT);

3. O horário concentrado não pode ser aplicado em simultâneo com a adaptabilidade;

4. Para inverter a tendência de quase inexistência de modelos de flexibilidade temporal nos IRCT, torna-se fulcral a total transparência e uma verdadeira vontade negocial entre as partes.

 


1 - CORREIA, António Damasceno (2008), A Flexibilidade nas Empresas, Lisboa, Edições Silabo, p. 21.


*Associada da Teixeira de Freitas, Rodrigues e Associados
claudia.torres@tfra.pt

 

** Sociólogo
rjm.tome@gmail.com

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