Opinião
O Salazar que habita em cada português...
Maria do Céu Guerra verberou (no Facebook) a contratação de Paulo Futre para "dobrar um filme para crianças". Tudo porque os actores profissionais precisam de contratos e de trabalho, mas são suplantados por "qualquer pessoa que se notabilize em qualquer área".
Maria do Céu Guerra verberou (no Facebook) a contratação de Paulo Futre para "dobrar um filme para crianças". Tudo porque os actores profissionais precisam de contratos e de trabalho, mas são suplantados por "qualquer pessoa que se notabilize em qualquer área". A actriz, que até aprecio, lembra que Lili Caneças já fez de Tenessee Williams, prejudicando "não sei quantas actrizes" que estavam desempregadas. E pergunta porque um banqueiro vai para "administrador da Gulbenkian".
Não sei se Céu Guerra meditou no que disse. Porque o que defende é corporativismo. Puro. É partir do princípio que deve haver "guildas" a defenderem o acesso a certas profissões (a propósito, a Troika não anda de olho nisso?). No fundo, Céu Guerra está a defender aquilo que o dr. Salazar implementou em Portugal durante 40 anos: a primazia das corporações sobre a sociedade.
Não sei se Paulo Futre fez ou não bom trabalho na dobragem do referido filme. Mas era bom que Céu Guerra se informasse disso primeiro. E que criticasse o seu trabalho apenas em função do resultado: saiu-se bem? Saiu-se mal?
Tenho todo o respeito por actores profissionais. Mas esse respeito não inclui a criação artificial de mercado apenas para dar emprego a quem não o tem. Há desemprego entre os actores? Há. Como noutros sectores da economia. Mas se eles querem fugir a esse estigma, só têm de fazer uma de duas coisas: reinventar-se… ou optar por fazer outra coisa. Eu, como cidadão, não estou disposto a defender o corporativismo, um dos maiores entraves ao desenvolvimento do país. E, sobretudo, não estou disposto a tolerar práticas salazarentas mais de 40 anos depois da morte do seu principal promotor.