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Os seguros como financiadores do Serviço Nacional de Saúde

A sustentabilidade do SNS não passa pelo aumento da prestação da saúde privada, e “o primeiro parceiro e o mais interessante para um sistema sustentável pode ser a indústria seguradora”, defendeu Francisco Ramos.

16 de Novembro de 2022 às 16:30
Francisco Ramos, professor associado convidado da Escola Nacional de Saúde Pública da Universidade Nova de Lisboa Pedro Catarino
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"Como conseguimos tornar o SNS mais sustentável? Devemos incidir na prestação ou no financiamento?", perguntou-se Francisco Ramos, professor associado convidado da Escola Nacional de Saúde Pública da Universidade Nova de Lisboa e que desempenhou as funções de secretário de Estado da Saúde em cinco governos constitucionais liderados pelo Partido Socialista.

Considerou que a sustentabilidade do SNS não passa pelo aumento da prestação da saúde privada, porque o seu modelo de negócio e de desenvolvimento, enquanto empresas privadas de saúde, "é um modelo de crescimento do volume de negócios, o que é conflituante com um modelo de sustentabilidade".

Para Francisco Ramos, "o primeiro parceiro e o mais interessante para um sistema sustentável pode ser a indústria seguradora". Este passo em frente na sustentabilidade pode ser dado com "os financiadores privados, nomeadamente as seguradoras, porque estão naturalmente interessadas em que o modo de funcionamento de prestação de cuidados seja mais eficiente, mais enxuto, mais liberto de desperdício, portanto, que seja também mais sustentável com o negócio e a atividade a médio e longo prazo das seguradoras".

Deduções no IRS

A fórmula de colaboração, para Francisco Ramos, pode basear-se na dedução dos prémios dos seguros no IRS. Os seguros poderiam ser vocacionados para as áreas que tradicionalmente o Estado tem mais dificuldades em sustentar, como a saúde oral, os óculos, por exemplo. "Esta era a forma mais inteligente, mais descomprometida, de melhorar a sustentabilidade do sistema", sintetiza Francisco Ramos.

"O Estado deve pensar como é que se melhora a proteção da saúde dos portugueses, mais uma vez, de uma forma suplementar ou complementar. Complementar se for dirigida a áreas subcobertas pelo SNS, suplementares para as mesmas áreas mas em que há dificuldades em prestar cuidados de saúde a tempo e horas", disse Francisco Ramos.

Adiantou ainda que "um dos handicaps que o SNS tem é exatamente os pagamentos diretos das famílias, nem sequer é despesa privada. Em termos de despesas ‘out of pocket’ andam à volta dos 25%, que são cerca de 6 mil milhões de euros, as seguradoras não chegam a mil milhões de euros".

Estratégia inconstitucional

Para Adalberto Campos Fernandes e Maria de Belém Roseira, ex-ministros da Saúde, esta proposta seria inconstitucional do ponto de vista jurídico, político e ético.

"Era um subterfúgio para colocar o sistema privado financeiro no sistema de saúde, quando a Constituição não permite nem copagamentos, nem coberturas financeiras suplementares, e diz que a saúde é uma responsabilidade do Estado, universal, geral e tendencialmente gratuita. Era escamotear aquilo que tem sido a falha sistémica dos governos todos de empurrar despesas das famílias 30% e alavancar isto nas seguradoras, que passavam a ser supletivas do Orçamento do Estado", defendeu Adalberto Campos Fernandes. Para o presidente do Hospital da Cruz Vermelha, a Constituição fala da universalidade das prestações, o que incluiu próteses e ortoses e saúde oral. "É imoral do ponto de vista do direito fiscal de cada um de nós, porque não tenho de comprar um seguro para que os direitos que estão na Constituição sejam assegurados. Havia um negócio colateral dos financiadores em cima do Estado, este abdicava da sua obrigação constitucional de proteger e de dar gratuitidade e as seguradoras passavam a ter negócio com o Estado em vez da saúde privada", concluiu Adalberto Campos Fernandes, que se mostrou contra "uma obrigação contributiva nova, fiscal, social, solidária, tem de comprar um seguro aos privados para prestações que o sistema público não tem".
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