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As insurtechs na cadeia de valor das seguradoras

Na Europa, por causa do peso da regulação, as insurtechs surgem para atacar os pain points da atividade seguradora, mas nenhuma vem como desafiante.

11 de Abril de 2019 às 14:45
Gastão Taveira um dos intervenientes neste iniciativa do Negócios que antecipa a grande conferência anual dos seguros que este ano terá a sua sexta edição. David C. Santos
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"Aquilo de que precisamos no nosso ecossistema é de mais challengers, de quem desafie o statu quo da nossa atividade. Assistimos ao aparecimento de insurtechs para atacar os pain points da atividade seguradora, mas nenhuma vem como desafiante. Serviria para catalisar todo o processo de transformação tecnológica e digital que é precisa no nosso mercado", analisa Miguel Mamede, account manager da baseline.

Por isso Miguel Mamede considerou que o anúncio de que a Lemonade se prepara para entrar no mercado europeu seria "uma lufada de ar fresco. Não sabemos se vem para Portugal, mas os prémios podem ser uma barreira à entrada".

"As insurtechs são bem-vindas ao mercado, mas não vemos aparecer na Europa insurtechs do tipo da Lemonade. Acredito que um problema é a regulação europeia, como a Solvência II ou diretiva da distribuição, que é muito mais pesada e tem maiores custos do que a dos Estados Unidos", mostrou José Galamba de Oliveira, presidente da Associação Portuguesa de Seguradoras.

Há ainda que ter em conta "as exigências de capital que são uma barreira", aduziu José Galamba de Oliveira, o que ajuda a explicar o facto de a quase totalidade das insurtechs a aparecer na Europa abordarem determinados pontos na cadeia de valor onde desenvolvem ideias muito inovadoras.

Por sua vez, Nuno Luís Sapateiro, associado coordenador da área de Seguros de PLMJ, diz que uma das coisas que mais lhe agrada no mercado único "é o tema de não precisarmos de passaporte e de termos uma base diretiva que uniformiza legislação, mas pesar de me agradar este processo de uniformização, quando olho para a diretiva da distribuição não encontro a palavra telemática, por exemplo". Acrescenta que "uma seguradora americana não tem de ficar à espera desta evolução toda, de que alguém inicie uma diretiva, para dar passos em frente. Temos o RGPD e quando me falam de wearable lembro-me logo do RGPD".

Ótica de cooperação

"O que tem sido interessante é que a indústria seguradora mais tradicional ou legacy ou incumbentes olha para estas insurtechs numa ótica de cooperação, é uma forma de trazerem inovação para dentro de casa, e para as insurtechs é interessante porque adquirem logo um mercado ou uma massa crítica que lhes seria mais difícil de atingir", assinala José Galamba de Oliveira.

Na Europa muitas das insurtechs estão a fazer acordos de cooperação, que até passam por aquisições e acabam por funcionar como polos de incubação do setor segurador. Em Portugal já existem algumas experiências e há companhias de seguros que têm programas específicos para identificar essas insurtechs e até a participar no capital, atraindo-as para a sua própria cadeia de valor.

Por sua vez, Gastão Taveira, CEO da i2S, afirmou que a grande inovação das insurtechs aconteceu "na relação com o cliente, não na questão da gestão do risco", como aconteceu com a Lemonade com o peer behavior. Mas como salientou o gestor, a Lemonade e outras empresas fazem muito o front-end, mas resseguram 60% ou 70% dos riscos, por isso as seguradoras não estão fora do caminho, até pela sua muita experiência na gestão de riscos, na gestão de carteiras, na diversificação do risco.

"Coloca mais em causa o papel de alguns corretores ou mediadores do que das seguradoras sólidas. Acho que as insurtechs não respondem a isso, são essencialmente complementares das seguradoras se estas forem inteligentes e souberem usá-las".

As Big Techs são a verdadeira ameaça

A Amazon entrou no capital de uma seguradora na Índia, a Apple anunciou a entrada nos serviços financeiros. O papel das big techs pode ser ameaçador, mas também pode ter um papel transformador.

"As big techs são a grande ameaça do setor segurador, porque tem uma grande capacidade financeira, informação sobre os clientes que os próprios não têm", refere José Galamba de Oliveira. Além disso, "têm uma experiência na distribuição e capacidade de chegar aos consumidores que o setor segurador não tem, mesmo através do canal da mediação, que em teoria seria o canal que melhor conhece os clientes".

A Amazon entrou no capital de uma seguradora na Índia e é "uma experiência que está a ser muito monitorizada". Mas José Galamba de Oliveira considera que as Big Techs se têm atrasado na entrada no mercado dos seguros por causa da "sua complexidade. É mais complicado do que os pagamentos, e por causa dos modelos de negócio, com a análise de risco e a subscrição, e pelo grande peso regulatório".

Mas as Big Techs "têm bolsos fundos, até mais do que as próprias seguradoras", como diz Gastão Taveira, e por tanto vão entrar neste negócio. Por isso, o setor tem de estar atento a esta ameaça. Para alguns casos pode ser uma oportunidade para grandes seguradoras internacionais fazerem parcerias com essas Big Techs, mantendo a fábrica de produtos e entregando a distribuição.

Mas a questão das Big Techs também levou José Galamba de Oliveira a falar da ética no tratamento dos dados, "que pode ser uma oportunidade para o setor segurador para se diferenciar junto dos consumidores finais, dos clientes, porque as seguradoras tratam a informação de uma forma ética, cuidada, e as Big Techs não são conhecidas por tal", como mostram os vários casos que têm afetado o Facebook. 

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