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A inovação não é um evento isolado, mas um processo contínuo

O papel da inovação num mundo em transformação foi o tema em debate da 3.ª edição do Prémio Nacional de Inovação. Os intervenientes destacaram que a sustentabilidade da inovação depende da cultura organizacional, do financiamento e da colaboração entre empresas, universidades e o setor público.

13 de Fevereiro de 2025 às 14:29
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A terceira edição do Prémio Nacional de Inovação proporcionou um debate alargado sobre o papel da inovação na competitividade das empresas, que contou com a participação de Ricardo Arroja, presidente da AICEP, Rafael Alves Rocha, diretor-geral da CIP, Paulo Reis, diretor-geral Portugal e diretor Hub Europa da FI Group, Teresa Silva e Sousa, diretora de Organização, Qualidade e Inovação do BPI, Sérgio Silvestre, diretor-geral de Inovação da Claranet Portugal, e Ana Almeida Simões, diretora de Inovação do Grupo Brisa.

"Está mais do que estudado que as empresas que investem em inovação e em propriedade intelectual são as que mais rapidamente se internacionalizam e captam interesse de investidores sofisticados", afirmou Ricardo Arroja, presidente da AICEP, para quem a inovação deve ser entendida como um ativo estratégico das empresas, particularmente no que diz respeito à propriedade intelectual. No entanto, destacou que muitas empresas ainda não reconhecem os seus próprios processos inovadores. "Frequentemente, há inovação dentro das organizações que não é assumida como tal e, por isso, não é aproveitada estrategicamente", alertou.




Inovação em forma de tradição

No debate, Rafael Alves Rocha, diretor-geral da CIP, abordou o exemplo do setor da cortiça, destacando um projeto da Corticeira Amorim que conseguiu reduzir significativamente o tempo necessário para a primeira colheita de cortiça. "A primeira colheita de cortiça demora 25 anos. O produto premium, a cortiça de qualidade para rolhas, só se obtém ao fim de 43 anos", explicou. Para responder a um mercado global em crescimento, a empresa juntou investigadores e universidades para desenvolver um processo que permite a colheita ao fim de apenas 10 anos. "Isto é inovação num setor tradicional. Não estamos a falar de tecnologia de ponta, mas sim de encontrar novas soluções para velhos desafios", reforçou.

A necessidade de criar condições para um ecossistema de inovação mais robusto foi um dos temas centrais da intervenção de Paulo Reis, da FI Group, que apontou a dificuldade de muitas empresas em obter financiamento como um entrave à inovação. "Portugal tem talento, universidades e centros tecnológicos de excelência, mas falta agilidade no acesso a apoios financeiros", afirmou. Defendeu ainda que o próprio Estado deve ser inovador nos instrumentos de financiamento que disponibiliza às empresas. "As políticas nacionais de investigação e desenvolvimento têm que acompanhar o ritmo das empresas e não o contrário", acrescentou. 

Transformação digital também implica inovação

A inovação foi também abordada sob a perspetiva da transformação digital. Para Sérgio Silvestre, da Claranet, a ligação entre inovação e competitividade é incontornável. "Existe uma relação direta entre inovação e competitividade. O crescimento pode não ser imediato, mas a médio e longo prazo, empresas inovadoras são sempre mais competitivas", disse. Apontou ainda a inteligência artificial e a cibersegurança como dois dos temas críticos para as empresas nos próximos anos. "Estamos a viver uma revolução tecnológica e temos que aprender a usá-la a nosso favor", destacou.

Ana Almeida Simões, da Brisa, defendeu que a inovação deve ser encarada como parte da cultura organizacional, sublinhando que o maior risco para uma empresa não está em inovar, mas sim em não inovar. "Tem de haver uma cultura de inovação dentro das organizações. O meu objetivo enquanto diretora de inovação é que, um dia, a direção de inovação deixe de ser necessária porque já está disseminada por toda a empresa", afirmou. Acrescentou ainda que eventos como o Prémio Nacional de Inovação ajudam a partilhar experiências entre empresas, permitindo encontrar novos casos de uso para tecnologias emergentes. "Hoje, ao ouvirmos a Sogrape, já estávamos a trocar ideias sobre como aplicar o metaverso à mobilidade", revelou. 

O papel do setor financeiro na inovação

A inovação requer financiamento e a banca desempenha um papel essencial nesse processo. Teresa Silva e Sousa, do BPI, explicou que os bancos financiam empresas com maturidade financeira, mas isso não significa que não possam apoiar startups e scale-ups de outras formas. "Muitas vezes, para uma startup, mais do que financiamento, o mais importante é a credibilidade de trabalhar com uma grande empresa", explicou. O banco tem investido em parcerias com startups e fintechs, lançando produtos inovadores como o BPI VR, o Diverse, um marketplace de ativos digitais, e o Pulso, uma aplicação de gestão para pequenos negócios desenvolvida em colaboração com a NOS. "Trabalhar em conjunto permite-nos acelerar o processo de inovação e oferecer valor agregado aos clientes", afirmou.

No encerramento do debate, um repto: identificar o maior desafio para garantir que a inovação seja consistente e sustentável.

Ricardo Arroja defendeu que a inovação deve ser um processo contínuo e repetido no tempo. "As empresas precisam de estruturar a inovação de forma sustentada, e não apenas em respostas pontuais a desafios do mercado", afirmou.

Rafael Alves Rocha trouxe um exemplo internacional para demonstrar o perigo de estagnar na inovação. "Há 30 anos, marcas como Sony, Toshiba e Panasonic dominavam o setor da eletrónica. Hoje, são a Samsung e a LG que lideram. O Japão percebeu que deixou de inovar e agora está a redesenhar a sua estratégia para semicondutores e energias renováveis", explicou.

Para Paulo Reis, o maior desafio está na criação de redes de confiança entre empresas, universidades e centros de investigação. "A inovação não acontece sozinha. Precisamos de colaboração e de criar condições para que os projetos inovadores possam crescer e escalar", disse.

Sérgio Silvestre apontou para o fator humano como um elemento crítico. "Precisamos que as pessoas dentro das empresas percebam que têm um papel ativo na inovação. E os líderes precisam de colocar a inovação no centro do debate", afirmou.

Já Ana Almeida Simões reforçou que a principal barreira à inovação não é tecnológica, mas sim cultural. "A resistência à mudança é o maior entrave. A tecnologia já existe, os processos podem ser ajustados, mas se as pessoas não estiverem abertas à inovação, ela não acontece", alertou.

Por fim, Teresa Silva e Sousa destacou que a cultura de inovação dentro das empresas precisa de tempo para maturar. "No BPI, no início, havia resistência. Hoje, as outras áreas vêm ter connosco em vez de sermos nós a tentar vender as ideias. A inovação só é sustentável quando se torna parte natural do funcionamento da organização", concluiu.

A sessão terminou com uma mensagem comum: a inovação não é um evento isolado, mas um processo contínuo, essencial para o futuro das empresas e da economia nacional.

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