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O último relatório da Portugal Fintech Report não hesita em adotar uma linguagem forte para enfatizar o impacto da transformação digital no setor financeiro. O documento ressalta que as inovações - desde a aplicação de inteligência artificial generativa até a digitalização dos serviços bancários e o lançamento de iniciativas como o piloto do Euro Digital - não representam apenas melhorias incrementais, mas sim uma verdadeira "revolução tecnológica" que está a redesenhar os modelos de negócio e a experiência do cliente. Aliás, apesar de muito amplo, o conceito de Fintech, quando entendido como trazer tecnologia para o setor financeiro, "é desde logo inovador", disse ao Negócios João Freire de Andrade, presidente da Portugal Fintech. "O trabalho das Fintech passa muito por criar infraestruturas para que tudo corra sobre rodas. É quase como andar de comboio, ninguém se lembra que são necessários os carris...", exemplificando com a "caso" Loqr, uma empresa da Felgueiras cuja tecnologia está integrada em muitos dos bancos portugueses para proceder à abertura de contas digitais. "O cliente nem percebe e acha que está a interagir com o banco A, B ou C. Mas por trás está uma fintech a processar toda aquela jornada digital e é isso que ajuda na vida das pessoas".
Revolut: a materialização do conceito
A Revolut oferece uma visão prática e concreta dessa revolução apontada pelo relatório da Portugal Fintech. Rúben Germano, general manager da Revolut Portugal, explicou ao Negócios que a proposta de valor desta fintech - que recentemente abriu sucursal em Portugal, podendo agora oferecer contas de depósitos com IBAN nacional - centra-se na conveniência digital, na transparência e numa experiência de consumidor que adjetivou de rápida, simples, eficaz e sem burocracias. "Introduzimos em Portugal uma experiência bancária diferente daquela oferecida pelos bancos tradicionais, com uma abordagem de constante inovação".
Um dos pilares deste conceito é uma aplicação como figura central das operações. "Somos uma one-stop-shop aliada a uma experiência de consumidor fluida e sem fricções. Quer isto dizer que os nossos clientes podem tratar de tudo - abrir e gerir a sua conta, fazer pagamentos, transferências, investir, pedir crédito - tudo dentro de uma única app de uma maneira fácil, rápida e cómoda". Basicamente, diz Rúben Germano, a Revolut veio "transformar a experiência do cliente ao oferecer uma plataforma digital completa, intuitiva e com funcionalidades inovadoras que respondem às necessidades de um consumidor moderno e globalizado".
A marca continua a evoluir com a introdução de novos produtos e serviços "que complementam as necessidades bancárias tradicionais" - como shops, stays, acesso a Lounges VIP, etc.. No caso de Portugal, no último ano, lançaram obrigações portuguesas, a primeira oferta de crédito pessoal, Fundos Monetários Flexíveis com juros diários, vending machines no aeroporto do Porto com cartões, "e ainda fortalecemos o sistema de fidelização com mais ofertas nos RevPoints".
Facilitar a vida às empresas
No campo empresarial, a fintech Rauva assume ter nascido para transformar a forma como as pequenas e médias empresas, que representam 99,9% do tecido empresarial nacional, gerem as suas finanças. "Ao oferecer uma solução 100% digital e integrada, eliminamos a complexidade associada à criação de uma empresa", garantiu ao Negócios Jon Fath, cofundador e CEO da Rauva.
Através da plataforma da marca é possível abrir uma conta empresarial "em poucos minutos, realizar pagamentos instantâneos gratuitos e ilimitados, emitir faturas certificadas e gerir despesas sem burocracia". Além disso, Jon Fath avançou que integraram Inteligência Artificial para fornecer insights financeiros personalizados e otimizar processos como a reconciliação automática de pagamentos. "Com esta abordagem, garantimos que os negócios têm uma visão clara da sua saúde financeira, permitindo-lhes tomar decisões mais informadas e estratégicas. Assim, contribuímos para o seu crescimento, potenciando a inovação e a economia nacional".
De resto, a marca posiciona-se como um "complemento à banca tradicional, trazendo inovação e agilidade para um segmento muito importante da economia portuguesa: as pequenas e médias empresas". E diferenciam-se ao oferecer uma "solução all-in-one, que integra serviços financeiros e contabilísticos numa única plataforma, simplificando a gestão diária dos negócios".
Oferta da banca tradicional é mais extensa
A banca tradicional parece confortável com esta complementaridade das fintech, até porque como explicou Afonso Eça, administrador executivo do BPI, a banca incumbente de serviço universal - todo o tipo de particulares e todo o tipo de empresas-, como é o BPI, oferece uma abrangência e complexidade de produtos muito maior do que as fintech. "Temos investido muitos recursos na automação de processos e na inteligência artificial para oferecer produtos, serviços, condições e experiências que antecipem ou estejam totalmente alinhados com as necessidades dos clientes em qualquer momento das suas vidas". O executivo é da opinião de que a inteligência artificial continuará a moldar a forma como operam, com a cloud a "forçar" a adoção de arquiteturas mais abertas e flexíveis.
Susana Ferreira, administradora executiva do Santander Portugal, corrobora a opinião de Afonso Eça, acrescentando que a banca tradicional tem vindo a evoluir o modelo de negócio, com um foco muito particular na experiência de cliente. "Isto acontece essencialmente porque queremos ir ao encontro das expectativas crescentes dos nossos clientes. Também é verdade que os players digitais têm um papel relevante, contribuindo para um elevar da fasquia com soluções inovadoras para segmentos específicos do mercado".
A executiva acredita mesmo que a transformação tecnológica e a adoção de formas de trabalho mais colaborativas e ágeis têm permitido à banca tradicional acompanhar e mesmo liderar em algumas áreas, naquilo que de melhor se faz do ponto de vista de experiência de cliente. "Por outro lado, vivemos um período onde tecnologias como a Inteligência Artificial começam a ter um papel essencial nesta evolução, permitindo-nos compreender melhor as necessidades dos clientes e oferecer-lhes soluções personalizadas. E isto será um fator diferenciador neste mercado".?
Outro fator diferenciador face aos players digitais é a capacidade da banca tradicional de criar e manter relações humanas, com pessoas reais, e não com um chatbot. "Isto pode não ser muito relevante quando estamos a falar de situações do dia-a-dia, mas é extremamente importante em momentos como comprar uma casa, decidir qual a melhor solução de investimento ou, simplesmente, quando temos uma questão e queremos falar com alguém. A criação de uma experiência verdadeiramente integrada entre o físico e o digital é uma vantagem competitiva única da banca tradicional".
| Em discurso direto
Rúben Germano
General manager da Revolut Portugal
De que forma a Revolut colabora com outros players do mercado ou enfrenta a concorrência dos bancos tradicionais?
Ao contrário dos bancos tradicionais, muitas vezes sobrecarregados com sistemas legados, a nossa abordagem ágil e prioritariamente digital permite-nos mantermo-nos na vanguarda, oferecendo continuamente soluções inovadoras que desafiam as práticas bancárias convencionais.
Nas raras ocasiões em que trabalhamos com um parceiro externo, fazemo-lo com grandes players estratégicos no mercado que oferecem vantagens reais aos nossos clientes. Por exemplo, os nossos planos pagos oferecem parcerias com a Uber, Perplexity, WeWork e outras grandes marcas que acrescentam valor aos nossos clientes.
Jon Fath
Cofundador e CEO da Rauva
Que tecnologias emergentes estão a ser utilizadas para garantir transações seguras e a proteção dos dados dos clientes?
A segurança dos nossos clientes é uma prioridade e, por isso, implementámos um conjunto robusto de tecnologias emergentes para proteger as suas transações e dados. A nossa infraestrutura trabalha em cloud, assegurando um ambiente escalável e resiliente, enquanto a encriptação de ponta a ponta e a autenticação multifator garantem a segurança de cada transação. Adicionalmente, através de Inteligência Artificial e Machine Learning, estamos a trabalhar no desenvolvimento da deteção de padrões suspeitos e na prevenção de fraudes em tempo real. Esta abordagem não só é inovadora como essencial, uma vez que as ameaças de segurança estão em constante evolução, tornando a utilização de IA uma ferramenta fundamental para garantir uma proteção contínua aos nossos clientes de forma eficaz.
Afonso Eça
Administrador executivo do BPI
Que medidas a instituição está a adotar para se adaptar à digitalização e manter a relevância num mercado cada vez mais tecnológico?
É importante referir que a digitalização não é uma novidade para o setor bancário. A transformação dos processos e operações teve início há mais de duas décadas, com a introdução gradual de diferentes formas de automação. A inteligência artificial, por exemplo, já era utilizada em várias áreas da banca muito antes de se tornar um tema relevante para a nossa vida quotidiana. No BPI, temos feito um investimento contínuo na modernização dos sistemas de informação que suportam a nossa atividade. Paralelamente, temos apostado na formação e contratação de novos perfis profissionais - como data scientists, data engineers, machine learning engineers e business translators - que até há poucos anos não existiam no setor. Esta aposta tem acelerado a adoção de novas tecnologias em várias frentes, sempre com um objetivo em mente - servir melhor os nossos clientes.
Susana Ferreira
Administradora executiva do Santander Portugal
Que medidas a instituição está a adotar para se adaptar à digitalização e manter a relevância num mercado cada vez mais tecnológico?
Diria que o Santander, tal como a generalidade dos bancos em Portugal, já não está numa fase de adaptação à digitalização. O digital faz parte do nosso dia-a-dia e da nossa cultura. Como costumamos dizer no Santander, somos um banco digital com balcões. Isto é o fruto do desenvolvimento de uma estratégia nos últimos anos assente em várias dimensões. No recrutamento de talento especializado em áreas críticas como data science, cibersegurança, marketing digital, inteligência artificial, cloud, agile, etc, complementado com programas internos de formação para aumentar as competências tecnológicas e digitais das nossas equipas. Na evolução contínua dos nossos sistemas, migrando progressivamente para arquiteturas mais abertas, modulares e baseadas na cloud, permitindo-nos maior rapidez, flexibilidade e escalabilidade. No redesenho do nosso modelo de relação presencial e digital com os nossos clientes, suportado em plataformas mais simples, mais convenientes, com interfaces mais intuitivas, e mais próximas da realidade de cada cliente.