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Amândio Santos: “Os clientes internacionais dirigem-se mais a Portugal do que aos outros países”

Amândio Santos, presidente da Portugal Foods, reforçou o potencial de liderança das empresas portuguesas no setor agroalimentar e a necessidade de as promover a nível internacional. Apesar de Portugal ser um país mais associado ao clima ou à gastronomia, é cada vez mais reconhecido em inovação e tecnologia.

24 de Fevereiro de 2023 às 15:00
Amândio Santos, presidente do Conselho de Administração da Portugal Foods Vítor Chi
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A Portugal Foods gerou uma revolução no setor agroalimentar. Passados 15 anos desde a sua criação, o setor viu como as exportações cresceram de forma consistente na última década. Superaram os 8 mil milhões de euros no setor agroalimentar, representando cerca de 7% das exportações totais, segundo os dados de 2022 . O sucesso da estratégia do cluster Portugal Foods  está na integração, nesta associação, de entidades regionais e nacionais do setor agroalimentar português com empresas científicas e tecnológicas. Amândio Santos, presidente do Conselho de Administração da Portugal Foods, foi o convidado do jornalista João Ferreira no videocast Agricultura Agora | Conversas sobre Sustentabilidade. Estas entrevistas realizam-se no âmbito do Prémio Nacional de Agricultura (PNA) e têm como objetivo interagir com especialistas da área da agricultura, numa vertente mais direcionada para a sustentabilidade. Esta iniciativa do BPI e da Cofina, que conta com o patrocínio do Ministério da Agricultura e o apoio da PricewaterhouseCoopers, visa premiar os agricultores e as empresas portuguesas que se destacam como casos de sucesso no setor da agricultura em Portugal.

 

Esta tendência de subida no setor agroalimentar português deve-se, em parte, à Portugal Foods?

Deve-se, em parte, aos empresários e ao ecossistema agroalimentar, mas acima de tudo a uma estratégia de eficiência coletiva que teve início em 2008. A Portugal Foods foi um elemento aglutinador, capaz de gerar uma integração entre as diferentes empresas e associações, e que se comprometeu  a desenvolver uma estratégia que promovesse o setor agroalimentar português no exterior, realçando aquilo que temos de melhor. Nesse sentido, a Portugal Foods  contribui para este percurso muito positivo do setor na última década.

 

Qual foi a motivação para a criação da Portugal Foods?

Foi percebermos que somos muito pequenos no contexto internacional, e que competimos com países que têm um caminho muito mais consolidado e marcas  privadas, que Portugal não tinha. Quando somos capazes de construir em conjunto, superamo-nos .

 

Em 2022, Portugal alcançou quase 8 mil milhões de exportações neste setor. Quanto é que este valor representa no total das exportações?

Esses dados são de novembro, por isso esse número até vai ser ultrapassado, e representa cerca de 7 ou 8% das exportações totais do nosso aglomerado nacional.

 

São dados notáveis, até porque o setor agroalimentar é complexo, engloba variadíssimos produtos...

Se considerarmos o setor mais agrícola de fruta, legumes e flores, como por exemplo a Portugal Fresh, ou dos vinhos, a Vini Portugal, juntamente com o papel regulatório da Federação das Indústrias Portuguesas Agro-Alimentares (FIPA), encontramos um ecossistema que junta todas estas dinâmicas agregadoras e promove o setor de uma forma muito estruturada.

Preocupações como a redução de sal, ou embalagens mais amigas do ambiente, são pensadas de forma agregada, permitindo reduzir o investimento das empresas

Como se cria uma estratégia comum num setor com esta diversidade toda?

 São muitas entidades e associações, algumas de cariz mais regional, e todas pretendem marcar posição, sendo fundamental que haja uma liderança e coordenação nos processos. Foi assim que ganhámos muita motivação para nos comprometermos  com resultados.

 

A Portugal Foods tem duas linhas de força bem identificadas: o apoio à internacionalização das empresas e a aposta na inovação e investigação científica. Como é que isso funciona em termos práticos?

A área do conhecimento é fundamental no trajeto que as empresas pretendem desenvolver e, quando se fala em mercados externos, não é apenas vender a tradição dos produtos portugueses que são apreciados e reconhecidos. Há que ser capaz de responder às exigências que os mercados  nos  colocam. São mercados muito competitivos e sofisticados, como os Estados Unidos, Canadá, Japão, Coreia, alguns  na Europa, e existem dinâmicas próprias em mercados específicos. A Portugal Foods comprometeu-se, desde o início, em reduzir as dificuldades de linguagem e de comunicação entre o sistema científico nacional e as empresas.

Como é que a Portugal Foods facilitou essa comunicação entre a ciência e as empresas?

Por exemplo, ao juntar 40 entidades (universidades, entidades do sistema científico e tecnológico e empresas), que trabalham inovação e desenvolvimento, e ao transferir tecnologia para processos que são comuns e transversais a empresas de vários setores – das carnes, aos laticínios, cereais, bolachas, chocolates  ou bebidas. Preocupações como, por exemplo, a redução de sal, ou embalagens mais amigas do ambiente,  são pensadas de uma forma agregada, permitindo reduzir o investimento necessário pelas empresas e fazendo com que o resultado da investigação pré-competitiva produza muito mais valor.

 

A fórmula para esse conhecimento pode depois ser aplicada em empresas completamente diferentes?

Essa é a chave. Uma grande empresa tem uma tecnologia, processo ou ingrediente que pode estar disponível para outra empresa que não tenha nada a ver com o seu setor, com o objetivo de partilhar o seu conhecimento. O que verificamos é que esta partilha de conhecimento começa a ser muito transversal. Naturalmente existem compromissos de confidencialidade, utilização de processos, informação e conhecimento, mas numa ótica de consórcio.

As empresas portuguesas têm de ser capazes de demonstrar que estão à frente, sabem liderar e muitas vezes são melhores do que os concorrentes

Isso ajuda a que Portugal tenha sucesso no setor agroalimentar no mercado mundial?

Os nossos clientes internacionais dirigem-se mais a Portugal do que aos outros países com quem concorremos. Temos de ser melhores do que os outros. Muitas  vezes, não somos reconhecidos como um país que tem atributos de confiança, segurança e tecnologia e sim como um país  mais associado a atributos emocionais como o clima, a gastronomia ou a empatia. As empresas portuguesas têm de demonstrar que estão à frente, sabem liderar e muitas vezes são melhores do que os  concorrentes.

 

Têm dois lemas "Sozinhos podemos ir mais rápido mas juntos chegamos mais longe" e "Sozinhos fazemos coisas pequenas, juntos fazemos coisas grandes." Estes slogans são a  essência  da Portugal Foods na área da internacionalização?

O primeiro  é um provérbio africano que demonstra que, num país tão pequeno como o nosso, juntos conseguimos seguramente chegar mais longe.  Isso tem pautado a nossa atuação nestes 15 anos, que é, essencialmente, demonstrar que todas as empresas podem ganhar com estas sinergias que se aplicam ao nível do conhecimento e dos mercados.

 

Nesta missão de apoio à internacionalização, surgiu recentemente o movimento Marcas por Portugal, lançado por algumas figuras da sociedade civil, do meio empresarial e social. Este movimento ajudou?

Quando entrei nestas dinâmicas  dos  mercados externos, muitas empresas  tinham alguma dificuldade em assumir Portugal como a sua bandeira. Todos os movimentos  que projetem a marca Portugal e lhe deem a confiança e a notoriedade que precisa, reforçam muito o papel das empresas. 

Há uma década, quando iniciamos a nossa presença no setor alimentar dos  grandes eventos internacionais, Portugal tinha uma presença residual. Hoje tem uma mancha de presença conjunta e apresenta-se como um país  com dimensão e diversidade, uma boa opção para qualquer mercado.

 

A própria Portugal Foods é de certa forma um chapéu de chuva de todas estas empresas que fazem parte da associação?

Hoje, a Portugal Foods  tem empresas  grandes, médias  e pequenas. Mas , acima de tudo conseguiu, com outras entidades, gerar uma dinâmica nestes mercados onde não competimos – as empresas portuguesas não competem entre si nos mercados internacionais, complementam-se – e nesse sentido sim, é uma marca chapéu que, pela primeira vez, juntou e acelerou esta força e gerou confiança.

 

Como funciona a dinâmica de apoio à internacionalização das empresas?

Tudo começa pelo conhecimento e informação dos  mercados onde as empresas  pretendem apostar as  suas dinâmicas  de expansão. Por exemplo, o caso de empresas  do complexo animal ou vegetal que querem ir para o mercado chinês exige um conjunto de habilitações e homologações. Muitas  vezes,  as empresas não têm este conhecimento e a Portugal Foods  tem um business  intelligence e radar de negócios que permite dar esta informação. É uma interface que simplifica a presença nos mercados externos, fazendo a ligação entre as grandes  empresas  ou aquelas  com  muita experiência, que alavancam e arrastam outras empresas.

 

Quais os  vossos principais desafios para o futuro?

Temos um grande desafio que é consolidar os mercados  maduros, como o de Espanha –  que continua a representar mais de um terço das nossas exportações, – França, Alemanha, Itália e Bélgica. Depois temos  os  mercados com um forte potencial de crescimento, como os Estados Unidos, Canadá e o Sudoeste Asiático. O desafio é conseguirmos ter nestes mercados uma dinâmica comercial, não tanto de promoção, mas de conhecimento, penetração e capacidade negocial.

A Portugal Foods tem de ser um ponto avançado na negociação junto dos clientes  nestes  mercados. . Outro grande desafio do futuro é a agenda mobilizadora do Plano de Recuperação e Resiliência Português (PRR), coordenada pela Portugal Foods. Integra 49 entidades, liderada pela Sonae MC, com 100 milhões de euros de  investimento público, e tem o objetivo de alavancar o setor alimentar para outro nível, tornando-o mais robusto e capacitado no futuro.

Veja aqui o videocast


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