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Em 1963, a produção industrial portuguesa ultrapassou a produção agrícola, o que fez de Portugal a última nação industrial da Europa Ocidental. Esta nova vaga industrial tinha as componentes tradicionais do têxtil e do calçado mas baseava-se, sobretudo, no impulso da metalomecânica, aço (Siderurgia Nacional), construção naval (Lisnave).
Hoje, quando se fala de industrialização – e é um "mantra" que assola Portugal e a Europa – está a falar-se de quê? Pedro Lains, historiador económico, relembra, como curiosidade histórica, que "Portugal industrializou-se tarde, e tão tarde que o sector industrial nunca foi o principal sector da economia portuguesa. Primeiro, foi a agricultura e, logo a seguir, de uma forma marginal, os serviços". Acentua que a divisão entre sectores primário, secundário e terciário começa a ser um conceito pouco rigoroso".
Um velho industrial português Henrique Sommer, que esteve na origem da Cimpor, dizia: "não gosto de engenheiros de secretária". Américo Amorim é mais radical: "se vires um quadro técnico com uma caneta na mão, corta-lhe a mão". Estes empresários referem que, mesmo nas profissões que se poderiam realizar nas fábricas, há uma certa aversão à indústria. É o que num recente relatório da PwC, "Principais desafios da indústria em Portugal", se define como uma percepção social da indústria pouco positiva. Explica que "esta percepção deve-se à imagem das condições de segurança e trabalho e ao impacto ambiental associado.
Por outro, há uma tendência para se considerar a indústria como um elemento do passado, em vez de um ingrediente-chave para o desenvolvimento futuro". O facto de a indústria não ter uma boa reputação implica que seja mais difícil atrair talento.
No mesmo sentido se pronunciou Augusto Mateus, economista e ex-ministro da Economia, dizendo ao "Público" que "a indústria é um conceito vago, as fronteiras praticamente acabaram. Em todo o lado há uma mistura de bens e serviços. O próprio documento de estratégia de re-industrialização do Governo entende o conceito de indústria em sentido lato: "integra toda a cadeia de valor de produção industrial – do acesso às matérias-primas ao serviço pós-venda – incluindo portanto actividades económicas dos sectores primário, secundário e terciário".
Um problema europeu
Em Portugal, este debate, é a projecção de um espectro que percorre a Europa e que é o da re-industrialização. A indústria representa, hoje, cerca de 16% do PIB europeu, abaixo dos 24% em Portugal. O objectivo europeu é que em 2020 esse valor se cifre em 20%.
O vice-presidente da Comissão Europeia e comissário para Indústria, Antonio Tajani, é um dos arautos desta redescoberta e todos os membros da União Europeia devem lançar um plano industrial para que a Europa volte a ser uma fábrica. Mas os números revelam, em termos relativos, um Portugal mais industrial do que a Europa. Em 1995, a industria tinha um peso de 29% no PIB (77.281 milhões de euros) e 30% do emprego. Em 2011, representava 24% do PIB (149.266 milhões de euros e 24% da população empregada (2010) e mais 800 mil empregos nas indústrias extractiva e transformadora (2011).
Se Augusto Mateus defende que se fale em re-desenvolvimento, Pedro Lains defende que "a ideia agora da re-industrialização nem faz muito sentido. O que faz sentido é perguntar se o Estado deve intervir para que determinadas actividades não fechem numa crise".
Crescimento e produção
Pedro Lains defende o regresso da política económica. Na base do plano do Governo ("Estratégia para o crescimento, emprego e fomento industrial, 2013-2020") está a revitalização do tecido produtivo como meio de chegar ao crescimento económico e de dinamizar as exportações, de modo a que estas passem dos 34% a 38% do PIB que tem caracterizado os últimos 20 anos para 50% em 2020. Entre 2000 e 2009, Portugal registou um crescimento médio do Produto Interno Bruto de 0,9% contra 3,4% entre 1990 e 1999 (graças sobretudo aos serviços) e de 2,9% entre 1973 e 1990.
Para uma redefinição do perfil produtivo de Portugal, há desafios fundamentais. O país tem de ser mais produtivo, mais qualificado, ter custos de energia mais acessíveis, dotar-se e privilegiar uma logística mais vocacionada para as exportações, custos de contexto mais reduzidos em que haja menos burocracia e as entidades oficiais ajam mais coordenadas e ajudando no cumprimento das regras.
Depois, há ainda questões estruturais do tecido empresarial português e que passam pela sua capitalização, pela criação de dimensão, mais capacidade de inovar e se articular com os sistemas de inovação e aumentar a capacidade de gestão. Como disse uma vez Alberto de Castro, professor na Universidade Católica do Porto: "precisamos de mais dez mil empresas como as melhores que já temos".
O perfil da indústria portuguesa
O documento do Governo que define a estratégia de reindustrialização estrutura a indústria em torno de grupos homogéneos, que partilham características de negócio semelhantes, utilizando a metodologia da McKinsey em "Manufacturing the future: The next era of global growth and innovation" (McKinsey Quaterly).
Foram definidos cinco grupos industriais distintos, caracterizados pelas suas semelhanças em termos de factores-chave para a competitividade: estrutura de custos, nível de inovação e pendor para o comércio internacional.