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Quais foram os grandes desafios profissionais e quais foram os sítios onde se sentiu mais desafiado?
Quando comecei a minha trajectória sempre ligado à tecnologia, a cultura tecnológica era muito reduzida. Era preciso explicar às pessoas que os resultados nunca surgem no curto-prazo. Estive em algumas empresas, em que era muito difícil explicar aos accionistas porque é que tinham de fazer investimentos tecnológicos sem um retorno imediato.
A tecnologia não se constrói de um dia para o outro. Mesmo hoje com toda a celeridade que estes processos têm e que as startups conseguem imprimir, há sempre, na tecnologia, uma aposta no médio e longo prazo, e que pode falhar.
A tecnologia é sempre vista com laivos mágicos em vez de ser olhada como parte do negócio?
Trabalhei muito para a indústria, Na época do PEDIP I (1988-1994), a seguir à adesão à União Europeia, explicar na indústria por que é que se tinha de utilizar a tecnologia, era um desafio gigantesco. Hoje em dia é mais fácil, mas os traços de um país que chegou tarde à Revolução Industrial continuam a estar presentes. As pessoas têm muita dificuldade em entender por que é as apostas são sempre a médio e longo prazo e nunca a curto-prazo. Se tivesse que sintetizar, foi este o maior desafio que tive ao longo da minha vida profissional.
Quando arranquei com a primeira empresa de sistemas industriais, a Globalsis, a indústria não investia em tecnologia. No início era uma dificuldade muito grande encontrar um bom projecto industrial. Quando deixei a Tecnotron em 1997, dei uma volta por todos os meus clientes e o país industrial tinha mudado radicalmente, num período de 10 anos. O salto que as indústrias, que sobreviveram, deram, é uma coisa assombrosa.
Quando saiu foi para a Açoreana Seguros. Foi uma experiência nova…
Foi uma mudança de quem estava cansado de andar a lutar para que a indústria investisse em tecnologia. Foi uma experiência muito interessante a minha passagem pelo sector financeiro. Era um mundo radicalmente diferente. A minha experiência não foi muito vasta mas era um sector em que a tecnologia era mais acarinhada do que na indústria. Os bancos e as seguradoras investiam muito em tecnologia. Foi um processo muito interessante onde acompanhei todo o processo de transição do ano 2000, que foi muito dinâmico.
Mas sempre gostei muito de indústria e depois desafiaram-me e voltei para a indústria e fui representar a EDP na administração da EID, era uma empresa que trabalhava para o sector militar e que tinha uma série de aplicações civis, que ainda hoje existe e onde comecei a minha carreira.
Depois seguiu-se a experiência da ONI...
Onde também estive por indicação da EDP. Costumo dizer que teria participado no projecto Oniway mesmo que não me tivessem pago. A Oniway foi o lançamento de um operador de telecomunicações de terceira geração UMTS, que foi um projecto fantástico, pela sua dinâmica e pelos seus recursos e que depois, por razões várias, nunca arrancou. Mas a operação estava pronta para ir para o mercado. Era uma empresa que estava a nascer de raiz e com tecnologia avançada. Foi um projecto com lições e uma experiência riquíssimas.
Como profissional que é sentiu por o projecto não ter arrancado?
A empresa não arrancou mas não foi por não estar operacional. Foram decisões dos accionistas. Na altura até fomos elogiados porque desmontámos a Oniway com tanto profissionalismo como a tínhamos montado.
Depois voltei à Edinfor porque a minha relação na ONI tinha sido através da Edinfor e não da EDP. A EDP tinha a intenção de fazer o outsourcing dos seus sistemas de informação e havia um grande trabalho a fazer por parte de Edinfor e de negociação com os futuros prestadores de serviços.
Estive envolvido no processo de transformação da Edinfor e, mais tarde, a negociação com o que viria a ser o ganhador, que foi a Logica.
Foi um processo muito complexo?
Olhando para trás o que foi mais relevante não foi o processo em si, mas o facto de ter sido um contrato que durou os dez anos e que foi bem sucedido tanto para o fornecedor como para a EDP. Entre o momento do outourcing e o momento do fim de contrato, os custos operacionais de IT, e a empresa cresceu muito internacionalmente, mantiveram-se ao mesmo nível. Houve uma contenção, eu diria uma redução, significativa dos custos, em que o aumento de qualidade foi exponencial. A EDP de 2005 a 2015 tinha uma qualidade de serviço assinalável.
Não encontra muitos contratos de outsourcing, nascidos depois do ano 2000, que tenham sido um caso de sucesso, e que tenham durado dez anos não encontra outro.
Ao longo da sua vida profissional o que é que marcou mais?
Gosto de fazer o que faço ainda hoje. A que marca mais é a última que fazemos se não estivermos magoados com ela. De todas as transformações a que assisti nos últimos anos, a digital é a mais radical e cujos contornos e impactos nós ainda não vislumbramos totalmente.
A fórmula de fazer o desenvolvimento aplicacional hoje é muito diferente do que se fazia há cinco ou dez anos. O potencial que as tecnologias da cloud trazem às empresas é uma mudança radical, a forma de gerir o desenvolvimento e as aplicações são mudanças profundas na forma como se trabalha.
O desafio da digitalização da EDP
Depois de ter passado por empresas participadas pela EDP, entrou para a eléctrica portuguesa .
Em 2010 veio para a EDP e para a transformação digital…
Nos primeiros anos a tarefa fundamental foi endogeneizar competências ao nível dos negócios e do IT, porque tinham-se perdido muitas competências para o outourcing. Nos últimos anos iniciamos um processo forte de transformação digital, que foi acelerada com a criação em 2018 da Digital Global Unit.
A transformação digital mais do que uma alteração tecnológica é uma alteração na forma de trabalhar, de se relacionar com os seus clientes. O que diferencia este processo de outros que houve no passado é o facto de esta mudança se fazer com base na tecnologia. A tecnologia é não só o facilitador mas a essência.
Empresas como a EDP nasceram com base na tecnologia, têm muitas aplicações informáticas, mas que correspondem a um tempo em que se automatizavam, acelerava-se, melhorava-se a qualidade e a fiabilidade dos processos que existiam. Não se desenvolviam novos negócios com base na tecnologia. As pessoas não pensavam digital, mas analógico, e automatizavam o que faziam com ganhos de eficiência muito grandes.
Mas a digitalização é outra coisa…
O processo de transformação digital é um processo em que as coisas nascem de raiz, suportadas em tecnologias que se desenvolveram nos últimos anos. As empresas de sistemas legados têm muitos sistemas dentro e, portanto, não é possível transformá-la sem mexer na sua base tecnológica. Se digitalizar parte, o sistema fica a funcionar à velocidade da sua peça mais lenta.
Entre Portugal, Espanha e Brasil a EDP tem 400 aplicações diferentes. Não há nenhuma área da EDP que não esteja suportada por tecnologias de informação. A visão, que tivemos há quatro anos, foi que a empresa teria de ser digitalizada. Fizemos um plano com um trajecto em várias frentes e hoje a empresa está a discutir a aceleração digital, que foi facilitada pela emergência das metodologias ágiles aplicacionais. O princípio é que toda a arquitectura seja ágil e a velocidade seja maior.
Outra coisa foi a migração para a cloud e mesmo o que não foi para a cloud é feita por máquinas virtuais e está a estudar-se a criação de uma cloud privada.
Uma vida na tecnologia
1980 - Licenciatura em Engenharia Electrotécnica pela Faculdade de Engenharia da Universidade de Coimbra Pós-graduação em Engenharia de Qualidade pela FCTUNL
1981 - Estágio na CET-CTT
1982 - Centrel I&D
1983 - Timex - Qualidade e Engenharia Industrial
1989 - Globalsis- Administrador, Sistemas Industriais
1991 - Tecnotron Administrador Executivo
1997 Açoreana Seguros - Director Coordenador IT e Organização
1999 - EID Administrador Executivo
2001 - OniWay - Administrador Executivo
2003 - Edinfor, depois Logica, Administrador
2010 (julho) EDP Directo Corporativo - Direcção Sistemas de Informação
2018 (julho) Assessor do Conselho de Administração Executivo da EDP