Em 2019, os combustíveis fósseis representavam 74% da energia disponível em Portugal, dizia o Eurostat. Hoje, os dados da Associação Portuguesa de Energias Renováveis (APREN) dizem que apenas cerca de 38% da eletricidade consumida em Portugal é oriunda de fontes não renováveis, como o gás natural, o petróleo ou o carvão. Isto quer dizer que as alterações climáticas e a sustentabilidade estão a despertar os sistemas energéticos e a motivá-los para investirem em estratégias que lhes permitam promover mais e melhor inovação e, desta forma, acelerar a transição energética e a consequente neutralidade carbónica da sociedade em 2050, como está estabelecido no pacote de medidas europeu Green Deal. José Grácio, CEO da TrustEnergy, considera que é notório o aumento sustentado do consumo de energias renováveis, representando já a maioria do consumo energético. Contudo, é também possível observar que os combustíveis fósseis e a importação de eletricidade "são ainda necessários para salvaguardar a segurança do sistema elétrico nacional, compensando a intermitência das fontes renováveis".
O investimento nas energias renováveis, na eficiência energética ou noutras tecnologias limpas e com baixas emissões é uma das prioridades estabelecidas para chegar mais depressa a esta neutralidade climática. Até 2050, a UE, através do esforço conjunto dos Estados-membros, pretende atingir um grau de descarbonização entre 80 e 95% em relação aos níveis de 1990. Por cá, Portugal assumiu o compromisso de atingir a neutralidade das emissões de gases com efeito de estufa até ao final da primeira metade deste século. No Índice de Transição de Energia 2020 do Fórum Económico Mundial (FEM), Portugal surge no 19.º lugar no que diz respeito à transição para energias limpas.
Renováveis dão a mão à descarbonização
A 21 de maio de 2020 foi aprovado em Conselho de Ministros o Plano Nacional Energia e Clima 2021- 2030 (PNEC 2030), que define, a partir de oito objetivos estratégicos, as principais linhas de atuação, medidas a adotar e objetivos e metas a atingir, constituindo-se no principal instrumento de política energética para a próxima década. Nele é apontada a meta de 80% para a produção de eletricidade a partir de fontes de energia renováveis (FER) até 2030, juntamente com o aumento da capacidade instalada de todas as tecnologias renováveis, que deverá atingir um total de 28,7 GW, partindo dos atuais 14,5 GW.
O reforço da aposta nas energias renováveis contribuirá para a desejável redução da dependência energética do país para 65% em 2030, promovendo a eletrificação da economia e a diversificação de fontes de energia endógenas e renováveis.
Assim sendo, o setor energético encontra-se numa fase de transição importante e com objetivos ambiciosos, em que as energias renováveis surgem como trunfos importantes e que oferecem o melhor rácio custo-eficiência para a descarbonização do setor eletroprodutor. O mercado nacional responde afirmativamente às renováveis e dá sinais disso mesmo, nomeadamente ao ver cair o consumo de combustíveis fósseis. Segundo a Direção-Geral de Energia e Geologia, em março de 2021, o consumo global de combustíveis fósseis, expresso em ano-móvel, diminuiu 11,4% relativamente ao mês homólogo do ano anterior e diminuiu 0,1% face ao ano-móvel do mês anterior, fundamentalmente devido à redução do consumo de carvão de origem fóssil, utilizado nas centrais termoelétricas, assim como no consumo de combustíveis rodoviários. A quebra ocorrida nestes derivados do petróleo, no ano-móvel em análise, foi da ordem dos 12,7%, quando comparado com igual período do ano anterior.
Por sua vez, ao nível da produção de energia, dados da APREN e da Zero – Associação Sistema Terrestre Sustentável revelam que todos os centros eletroprodutores de Portugal continental produziram, em 2020, um total de 49.324 GWh de eletricidade, proveniente em 61,7% de fonte renovável. Este total foi maioritariamente suportado pela tecnologia hídrica, que representou 28%. A produção de eletricidade a partir de combustíveis fósseis apresentou um decréscimo de 5,6 % face a 2019, devido à reduzida taxa de utilização de 32% das centrais, com ênfase nas centrais a carvão, cuja taxa de utilização foi de apenas 15%. Verificou-se ainda uma significativa melhoria na produção elétrica através do solar fotovoltaico, resultante da entrada em operação de novas centrais acrescentando 124 MW à capacidade instalada nacional.
Francisco Ferreira, presidente da Zero, considera que 2020 "foi um ano marcante pela transição que será consumada em 2021, ano em que chega ao fim uma era na qual um dos combustíveis fósseis mais determinantes à escala mundial, o carvão, deixará de ser utilizado em Portugal para produzir eletricidade. É assim determinante que, de forma tão sustentável quanto possível, se invista na redução dos consumos de energia, assegurando maior eficiência e em fontes de energia renováveis, assegurando novos e mais empregos e uma efetiva descarbonização".
Consumiu-se menos energia em 2020
A pandemia e o confinamento provocaram uma quebra do consumo de energia em 2020. De acordo com dados da REN – Redes Energéticas Nacionais, o consumo de energia elétrica atingiu o valor mais baixo desde 2005: 48.800 GWh, o que traduz uma queda de 3,1% face ao ano anterior. Também o consumo de gás natural apresentou uma variação negativa de 1,6% face ao ano anterior, tendo sido registado um consumo de cerca de 66.900 GWh.