O setor energético tem vindo a sofrer mudanças profundas nos últimos anos, muito associadas ao ambiente, à necessidade de diminuição de custos e consumo e às energias renováveis. Em entrevista ao Negócios, o CEO da Associação Portuguesa de Energias Renováveis (APREN) diz ver com bons olhos as medidas desenvolvidas pelo Governo português, mas recorda que há ainda um longo caminho a percorrer.
Como está o panorama nacional em termos de energias renováveis?
Ao nível da geração de eletricidade renovável, todos os centros eletroprodutores de Portugal continental produziram, em 2020, um total de 49.324?GWh de eletricidade, proveniente em 61,7 % de fonte renovável. Este total foi maioritariamente suportado pelas tecnologias hídrica e eólica, que representaram 28% e 24%, respetivamente. Já a produção de eletricidade a partir de combustíveis fósseis apresentou um decréscimo de 5,6 % face a 2019. Se olharmos mais recentemente, o cenário é ainda mais positivo. Fevereiro contou com uma representatividade renovável na geração de 88,5 %, e mais de 100% relativamente ao consumo de Portugal continental. Um mês histórico, destacando-se ainda o acumulado dos dois primeiros meses de 2021 com 80% de geração renovável.
Sentem que o Governo português aposta efetivamente neste campo?
Enquanto parte integrante da União Europeia, o Governo português, à semelhança dos seus congéneres europeus, tem estabelecido uma estratégia para o clima e para a energia em linha com os acordos internacionais assumidos, impondo metas para dar resposta ao Acordo de Paris, que pede um esforço mundial na redução de emissões de GEE para a longo prazo limitar o aumento da temperatura média global a níveis bem abaixo dos 2°C.
Mas como se concretizou isso?
Na elaboração e aprovação do RNC 2050, do Plano Nacional de Energia e Clima para 2030 e da Estratégia Nacional para o Hidrogénio (EN-H2). O Governo português recentemente apostou também, e, a nosso ver, bem, na nova fileira de hidrogénio, com a aprovação da EN-H2, na qual está prevista a instalação de 2 a 2,5 GW de eletrolisadores até 2030.
De forma a fomentar também o desenvolvimento da tecnologia solar fotovoltaica, o Governo português promoveu já dois leilões, em 2019 e 2020, de reserva de capacidade de injeção na rede elétrica de serviço público. O Governo prevê que as poupanças dos dois leilões solares para os portugueses sejam de cerca de 1,2 mil milhões de euros na fatura da luz.
E que medidas falta tomar?
Resta ainda muito por fazer. É necessário identificar e implementar soluções concretas para resolver os problemas e ultrapassar as barreiras que o setor enfrenta. Implementar medidas como a criação de um ponto único de contacto no processo de licenciamento, a expansão e adequação da rede elétrica para tornar exequível o cumprimento das metas de capacidade e o reforço e desenvolvimento das entidades administrativas, essenciais ao crescimento do setor.
Como olha para o Green Deal?
A APREN vê com bons olhos o European Green Deal. Contudo, a existência do Green Deal por si só não é suficiente. É necessária a criação de estratégias assentes nos princípios do European Green Deal a nível europeu e nacional, e a total adaptação das metas e do quadro regulatório em linha com a nova ambição europeia global de redução dos GEE em 55% em relação a 1990.
E Portugal está no bom caminho para cumprir estas metas?
Estamos no começo do caminho e com as metas adequadas. Também as recentes medidas e desenvolvimentos do setor apontam para aí. Mas como já temos vindo a referir, temos de adicionar ao sistema eletroprodutor até 2030 cerca de 15.000 MW de nova potência/capacidade renovável. É um desafio enorme e requer um alinhamento generalizado de todos os stakeholders do setor, desde o Governo aos municípios, passando por todas as entidades oficiais chamadas a pronunciar-se e/ou aprovar todo o complexo processo de licenciamento de uma central de produção de eletricidade.
O papel da APREN
A Associação Portuguesa de Energias Renováveis (APREN) desenvolve trabalho em conjunto com organismos oficiais e outras entidades congéneres, a nível nacional e internacional, constituindo um instrumento de participação na elaboração das políticas energéticas para Portugal. Ao mesmo tempo, a associação promove o aproveitamento e a valorização dos recursos renováveis nacionais para produção de eletricidade.
Em termos institucionais, a APREN privilegia uma coordenação e permanente contacto com o Governo, ministérios da tutela e respetivos organismos, bem como um diálogo com os principais stakeholders nacionais ligados à produção de eletricidade renovável e representantes da sociedade civil.