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Crise energética corta produção de metais e atira preços ao alto
A atividade mineira é intensiva em eletricidade, um bem que tem escasseado e cujo custo tem vindo a disparar. Resultado: as empresas do setor cortam a produção, os stocks caem e os preços sobem. E isto numa altura em que a procura aumenta.
Os preços dos metais industriais – cobre, alumínio, zinco, níquel, estanho e chumbo –têm estado a disparar e, nalguns casos, estão já em valores que não se viam desde meados da década de 2000. Uma das principais causas é a da escassez de energia e consequente aumento do seu custo, o que está a obrigar a cortes na produção destas matérias-primas.
Entre as mais recentes vítimas estão algumas das maiores produtoras de zinco. É o caso da Nyrstar, que na semana passada anunciou que iria cortar em 50% a sua produção em três fundições europeias (Bélgica, França e Países Baixos) devido à subida dos preços da eletricidade e aos custos associados às emissões de carbono. Na sexta-feira foi a vez de a Glencore comunicar um corte de produção nas suas três instalações europeias de fundição, de modo a reduzir a exposição aos períodos de picos de preços durante o dia.
A subida de preços destes metais de base deveria significar um incremento dos lucros para as mineiras, mas, como resulta da escassez de energia e de estrangulamentos a nível logístico, isso também está a fazer subir os custos para os produtores. Com efeito, a crise energética global já começou também a pressionar as fundições – de que muitas mineiras dependem para que processem aquilo que elas retiram do solo –, que deverão começar a encarecer as taxas de fundição e refinação.
As disrupções na oferta acontecem num momento crucial para a economia global, ameaçando trazer mais tensão às cadeias de abastecimento. “Os cortes de oferta começaram na China, com o país a restringir a eletricidade aos setores mais intensivos em energia, e agora espalharam-se à Europa, numa altura em que a região se depara com a sua própria crise energética, alimentada pelos preços recorde do gás natural”, sublinha a Bloomberg.
O aumento generalizado das cotações das matérias-primas – com os metais e a energia em destaque – está igualmente a intensificar os receios dos decisores políticos de que a inflação se mantenha consistentemente alta. Enquanto isso, os intervenientes do mercado que têm apostado nestas “commodities” vão encaixando suculentas mais-valias.
“Enquanto se debate se a inflação é transitória ou duradoura, muitos investidores procuram alternativas de cobertura para os efeitos adversos dessa situação”, frisa Daniel Mayor, analista de investimentos da Portolocom, dizendo que algumas das opções são as obrigações ligadas à inflação, ativos reais (imobiliário ou infraestruturas) ou matérias-primas. Sob o prisma da sustentabilidade, o alumínio e o cobre são boas alternativas, acrescenta numa nota de “research” a que o Negócios teve acesso.
Wenyu Yao, estratega de matérias-primas do ING Bank, também põe o foco no facto de os preços dos metais de base estarem a disparar com o agudizar da crise energética e considera que “os maiores receios em torno da inflação estão a reacender o entusiasmo dos investidores”. Com efeito, as preocupações com a subida do índice dos preços no consumidor “podem aumentar a procura por metais, dado haver a perceção de que são uma cobertura contra a inflação, o que é especialmente verdade no caso do cobre”, sublinha.
E tudo aponta para que este cenário esteja para durar. “Os preços deverão manter-se elevados enquanto a crise energética continuar a impactar o mercado dos metais”, refere a consultora Shangai Metals Market numa nota de “research”.
Uma forma de haver algum alívio no curto prazo é a de os detentores de reservas que requisitaram o metal nos últimos dias decidirem repô-lo no mercado para aproveitarem os altos preços. Mas será que o vão fazer ou deixar que as cotações subam ainda mais?
Os preços dos metais de base já vinham a ganhar terreno ao longo do último ano, à conta da retoma pós-pandemia e do futuro risonho associado à revolução verde. O cobre é um dos que têm beneficiado com o seu crescente uso nas tecnologias de energias limpas, desde turbinas eólicas a veículos elétricos, salienta o Financial Times.
A queda dos stocks
A juntar à menor oferta de metais industriais está o aumento da procura, à boleia da retoma da atividade económica e dos progressos na transição para economias mais verdes, o que tem levado os inventários a diminuírem fortemente.
Na semana passada, os stocks de cobre no Mercado Londrino de Metais (LME) caíram para o nível mais baixo desde 1974. Depois de uma escalada das encomendas deste metal na Europa, os inventários no LME já afundaram 89% este mês. E as reservas têm estado a diminuir rapidamente em mercados rivais e nas empresas de armazenamento privado, levando a que os “spreads” nos contratos de negociação da bolsa londrina tivessem entrado em níveis históricos de “backwardation” – quando os contratos com prazos de entrega mais próximos transacionam em valores mais elevados do que os contratos para entrega mais tardia, sinalizando que a procura imediata está a suplantar a oferta.
A 15 de outubro, o cobre atingiu os 10.244 dólares/tonelada, em máximos de 10 anos, e o ganho semanal de 9% foi o mais acentuado desde 2016. Os contratos com vencimento a um dia negociaram com um prémio de 175 dólares face aos contratos que expiravam um dia depois, naquele que foi o maior fenómeno de “backwardation” desde 1998. Já o diferencial entre os contratos de entrega a pronto e os contratos a três meses disparou para 350 dólares por tonelada, um máximo de sempre.
Depois das novas encomendas deste metal na sexta-feira, ficaram apenas 14.150 toneladas de cobre disponível nos armazéns do LME, numa indústria que consome cerca de 15 milhões de toneladas anualmente. “Se não entrar mais metal no mercado, a situação será difícil”, comentou à Bloomberg o diretor de análise de metais no Bank of America, Michael Widmer. “Neste momento, o LME está a gerir um contrato físico que, na verdade, não está garantido pelo metal físico.”
Também os inventários de cobre na China estão a diminuir. Na passada sexta-feira, caíram para 41.668 toneladas no mercado de futuros de Xangai, naquele que é o mais baixo nível desde 2009.
Nestas circunstâncias, Dominic Schnider e Wayne Gordon, estrategos do UBS, elevaram a estimativa para o preço do cobre, de 10.000 para 12.000 dólares por tonelada nos próximos trimestres. “Apesar de ainda haver stocks suficientes a nível global, a falta de disponibilidade do metal é preocupante”, referem numa análise a que o Negócios teve acesso.
“Backwardation” visível
Cinco dos seis contratos de metais industriais no LME estão em “backwardation”, sinalizando assim uma grande pressão sobre a oferta no imediato. O único que “escapa” é o alumínio, mas apenas face aos contratos a três meses – porque face aos vencimentos mais longos (como dezembro de 2022, 2023 e 2024), o preço a pronto está mais alto.
“Com a maioria dos metais em backwardation e com uma elevada procura física, estão reunidos os ingredientes para preços mais altos, nomeadamente do alumínio e zinco mas também do cobre e estanho”, referiu Kieron Hodgson, analista da Panmure Gordon, à Bloomberg. “É cada vez mais provável que estas cotações elevadas persistam no quarto trimestre, antes do inevitável ‘regresso à terra’”, apontou.