Notícia
Empreste o PC à ciência
Pelo menos durante uma parte do dia, os computadores que temos em casa não funcionam. Mantêm a capacidade de computação à espera do próximo requisito do utilizador. Mas há quem não goste de desperdícios e, quando não está a usar o PC...
15 de Julho de 2009 às 10:25
Já pensou que nas alturas em que não usa o seu computador este pode ser colocado ao serviço da ciência, ajudando a criar um super-computador, sem sair do escritório?
Pelo menos durante uma parte do dia, os computadores que temos em casa não funcionam. Mantêm a capacidade de computação à espera do próximo requisito do utilizador. Mas há quem não goste de desperdícios e, quando não está a usar o PC, empresta-o à ciência, dando o seu contributo para projectos que procuram todos os recursos possíveis para aumentar a capacidade de prever e de calcular. Antecipar alterações genéticas e climáticas ou procurar vida extraterrestre são apenas algumas das iniciativas em marcha, responsáveis por redes mundiais constituídas por milhões de computadores.
Ao serviço da investigação científica, os projectos mais emblemáticos de computação distribuída nasceram no final dos anos 90 e mantêm-se activos. Ou nasceram de raiz, ou vieram substituir o funcionamento de super-computadores, encerrados num mesmo espaço, multiplicando a sua capacidade a custos significativamente mais baixos.
Para participar, é necessário instalar um programa, de acesso gratuito que, uma vez no computador, vai usar os períodos em que este está ligado mas com baixa actividade do CPU (processador) ou em inactividade, para contribuir para as pesquisas. Em tempo real ou em períodos específicos, o computador de quem doa capacidade e os servidores que a acolhem comunicam e o trabalho feito na sua máquina lá de casa é recolhido e associado ao de outros voluntários.
Esta troca que não requer a intervenção do utilizador, que pode acompanhar no "site" o progresso do trabalho realizado - através de um "interface" próprio do programa que descarregou -, ou na página de Internet do projecto, através da área de estatísticas.
Universidades são os grandes dinamizadores
Uma larga percentagem das iniciativas deste género é coordenada por departamentos de investigação de universidades, que recorrem ao voluntariado para acelerar a capacidade de fazer cálculos. De forma a maximizar o espectro de potenciais contributos, a grande maioria dos projectos está apoiada em programas de "software" que podem ser instalados em computadores que corram diversos sistemas operativos (Windows, Mac, versões Linux), mas também é possível colaborar a partir da PlayStation 3.
O Folding@home, que estuda o funcionamento das proteínas, acolheu o interesse da Sony em ver a última geração da consola como veículo para ajudar a investigação e desenvolvimento (I&D) e conseguiu multiplicar por vários milhares o número de participantes no projecto, mas, sobretudo, a capacidade computacional ao dispor, graças às características do "chip" que dá vida à PS3, o Cell.
O projecto bateu, entretanto, vários recordes, graças à colaboração de milhares de pessoas em todo o mundo. No último trimestre de 2007 atingiu o "petaflop": conseguiu juntar capacidade suficiente para assegurar a capacidade de realizar um trilião de cálculos por segundo, o que lhe valeu um registo no livro de recordes do Guiness, na condição de maior projecto de computação distribuída alguma vez realizado.
Só para se ter uma ideia, apenas em Maio deste ano chegou à Europa o primeiro sistema de computação com esta capacidade, na concepção tradicional do termo. Trata--se de um super-computador que foi instalado no Centro de Investigação Julich, na Alemanha, e é um dos três únicos no mundo a reservar tal capacidade de processamento à I&D.
Enquanto a Europa atinge esta marca, o Folding@home já passou à seguinte. Em Maio deste ano, chegou aos 8,1 "petaflops". São 8.100.000.000.000.000 de cálculos realizados por segundo, algo que nenhum outro projecto do género conseguiu. Tudo graças à capacidade de atrair voluntários para o projecto.
A computação distribuída neste âmbito de voluntarismo para a I&D tem defensores e opositores. Se, por um lado, é uma forma barata de criar um super-computador, é também um desafio, por supor a capacidade de pôr a trabalhar para um mesmo objectivo milhares de máquinas com diferentes configurações. Estes factores podem aumentar a margem de erro potencial face a uma investigação realizada pelos meios convencionais, mas dificilmente esta segunda hipótese conseguirá superar a capacidade gerada pela primeira.
Para o utilizador, o risco pode ser o menor desempenho do PC, caso o programa funcione mesmo quando estão a ser desempenhadas outras tarefas no computador. A grande mais-valia será a de saber que deu o seu pequeno contributo para criar um mundo melhor.
Quatro projectos para o seu computador
Desmontar os segredos das proteínas
Tornou-se um dos mais populares projectos de computação distribuída, depois de uma parceria com a Sony ter permitido apelar à colaboração dos utilizadores da PlayStation 3, para que também eles cedessem capacidade de computação ao desafio de simular o processo de "enrolamento" das proteínas para estudar os efeitos, sempre que acontecem anomalias. As proteínas desenvolvem sempre este processo antes de realizar as suas funções químicas mas, quando não o fazem correctamente, podem surgir doenças como o Alzheimer ou Parkinson, entre outras. Quem colabora com o Folding@home, ajuda a dar escala às simulações que podem contribuir para encontrar respostas valiosas. Cada utilizador pode juntar-se a uma lista já criada ou formar a sua própria.
Endereço: http://folding.stanford.edu/
Membros activos: 395 mil
Dinamizador: Centro Médico da Universidade de Standford/Pande Group
Prever o tempo que vai fazer em 2080
Como será a temperatura na terra em 2080? Não é preciso ser cientista para perceber que há muitas variáveis a considerar e que é preciso afinar as variáveis dos modelos usados para conseguir resultados cada vez mais fiáveis. É isso que faz o Climate Preditions: testa repetidamente modelos, encaixando todos os dados novos que vão surgindo. Quem se liga tem a oportunidade de ceder capacidade de computação, sempre que o PC esteja ligado. Em pano de fundo, terá a correr a aplicação correspondente, sem que isso afecte os recursos do equipamento e as tarefas que está a realizar. Graças à colaboração da comunidade mundial, já foram produzidas previsões para 43 milhões de anos modulares.
Endereço: http://www.climateprediction.net/
Membros activos: mais de 44 mil
Dinamizador: Universidade de Oxford
Procurar inteligência extraterrestre
É um desafio antigo, o de procurar inteligência extraterrestre, e é também o tema de um dos projectos de computação distribuída activo neste momento. O Seti@home analisa informação recolhida pelos satélites que viajam no espaço, em busca de sinais de rádio fora do comum e que possam sugerir a utilização de tecnologia. Se os detectarem, são pistas a explorar sobre a possível existência de vida inteligente fora da Terra. A funcionar desde Maio de 1999, o projecto acaba de comemorar o seu décimo aniversário. Nestes 10 anos, mais de cinco milhões de pessoas "prestaram serviço à ciência", cedendo capacidade de computação. Hoje, são 140 mil membros para 235 mil máquinas a processar em simultâneo, substituindo o modelo anterior em que a análise dos sons recolhidos a partir dos satélites era feita em super-computadores localizados nos próprios satélites, reforçando essa capacidade de análise.
Endereço: http://setiathome.ssl.berkeley.edu/
Membros: 140 mil
Dinamizador: Universidade de Berkeley
Participar na maior rede do mundo
O World Comunity Grid é, entre os projectos referidos, o mais recente. É promovido pela IBM e quer criar a maior rede de computação distribuída do mundo. Aqui não há um único objectivo, mas vários. A ideia é a de associar capacidade de computação e, a cada momento, colocá-la ao serviço daquilo que se revelar mais necessário. Intitula-se a maior rede de computação do mundo, neste momento com mais de 450 mil membros e um total de 1,2 milhões de dispositivos ligados. Desde 2004, já produziu 240 milhões de resultados, ajudando na pesquisa de respostas contra alguns tipos de cancro, alterações climáticas em África ou na pesquisa de novos medicamentos para a gripe.
Endereço: http://www.worldcommunitygrid.org/
Membros: 450 mil
Dinamizador: IBM