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Investir com a cabeça nas nuvens

O "cloud computing" está a tornar-se um negócio cada vez mais importante para os gigantes da internet. Esta tecnologia, que permite o armazenamento de dados e a execução de programas na nuvem, está a conquistar mais e mais empresas. Será uma oportunidade de investimento?

21 de Maio de 2019 às 12:20
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Recorda-se dos primeiros computadores pessoais lançados na década de 80? Dá vontade de rir quando pensamos na capacidade de memória que tinham.

O modelo lançado pela IBM, em 1981, possuía uma ou duas drives de disquetes, com 180 kb (184.320 bytes) de memória cada. Não dava para armazenar uma única foto. Foi, por isso, uma revolução quando a Apple lançou, alguns anos mais tarde, o Macintosh com discos rígidos de 20 e de 40 MB (1 megabyte equivale a 1.024 kilobytes).

O que mudou desde então? Hoje, não precisa de comprar um supercomputador para arquivar as centenas de fotos que tirou nas férias, ou os vídeos com as brincadeiras dos filhos, os "powerpoints" que fez para a empresa onde trabalha ou para a universidade. Pode pôr tudo na "cloud" (nuvem), com a máxima segurança, sem correr o risco de perder a informação. Os dados, e até programas, estão acessíveis esteja onde estiver, na Nova Zelândia ou na Índia, desde que tenha uma rede de internet à disposição, um smartphone ou um computador, que podem nem ser seus. Potentes servidores informáticos, localizados em "datacenters" gigantes, encarregaram-se de armazenar os dados na "cloud". Enquanto consumidores, os serviços de nuvem mais utilizados são iCloud, Dropbox e OneDrive. Mas as potencialidades da nuvem vão muito além.

A proposta para as empresas é sedutora. Em vez de terem de suportar custos com a aquisição de computadores e outros equipamentos informáticos, a sua manutenção e atualização, espaço para a instalação e recursos humanos, podem pagar uma subscrição para aceder a esses recursos. Além de o investimento ser muito inferior, é mais flexível, pois permite aumentar ou reduzir facilmente a capacidade à medida das necessidades.

Revolução em curso

O "cloud computing", ou computação na nuvem, é relativamente recente e o seu desenvolvimento tem sido possibilitado pelo aumento da capacidade das redes de internet fixa e móvel. A fibra ótica e, no caso da internet móvel, as redes 4G (agora a evoluir para o 5G) permitem a transferência cada vez mais rápida de quantidades de dados cada vez maiores.

O crescimento do setor foi muito rápido nos últimos anos. Segundo a consultora Gartner, as receitas do mercado da nuvem terão crescido 21% para 176 mil milhões de dólares. Em 2021, deverão chegar aos 278 mil milhões, o que representa um crescimento médio de 17% ao ano. A congénere Wikibon perspetiva 522 mil milhões, para 2025, o que faz da nuvem um dos segmentos mais dinâmicos do setor tecnológico. Estima-se que mais da metade dos gastos com tecnologias de informação, em 2020, sejam em projetos de "cloud computing". Não admira que os três líderes de mercado sejam a AWS (Amazon), a Microsoft Azure e a Google Cloud (Alphabet). O quarto é a chinesa Alibaba Cloud.

Vamos agora ao essencial. Faz sentido investir nestas empresas que oferecem soluções de armazenamento de dados, execução remota de programas e outros serviços associados? Quão sustentável é esta mudança tecnológica? Será uma moda, como as dot.com, no início do milénio, ou traz oportunidades potenciais de investimento para além de um horizonte imediato? Como tecnologia emergente, o "cloud computing" está ainda a evoluir e, por isso, sujeita-se a mudanças ao longo do tempo. Algumas empresas já colhem frutos dos esforços (veja a primeira página e ao lado), mas a tecnologia envolve investimentos avultados. E nada garante que não apareça algo mais disruptivo.


A atividade tem crescido dois dígitos por ano, o que tem levado as empresas a adaptar a estratégia de negócio.


Contudo, o facto de nenhum dos gigantes se concentrar exclusivamente na nuvem é uma vantagem. Esta é apenas uma pequena parte dos seus negócios, não o core business. Por enquanto, pois o "cloud computing" é uma fonte bem-vinda de crescimento e diversificação, com a vantagem de trazer receitas e liquidez recorrentes. A atividade tem crescido dois dígitos por ano, o que tem levado as empresas a adaptar a estratégia de negócio.

No caso da Amazon, há quem equipare o comércio online aos "Pollos hermanos" (referência à série "Breaking Bad", cuja trama se centra numa atividade de fachada), enquanto a "cloud" é o verdadeiro negócio.

O que pode não estar longe da realidade.

Segundo os resultados de 2018, a Amazon Web Services contribuiu com 60% para o lucro operacional do grupo.

Depois da grande progressão dos últimos anos, já não há muitas oportunidades de compra entre os líderes do setor tecnológico, ainda que empresas como a Microsoft e a Alphabet mereçam ser mantidas em carteira, dadas as perspetivas de crescimento. Apenas a IBM nos parece ter ainda um potencial de valorização. A empresa não participou na escalada da generalidade do setor porque esteve, e está, a executar uma transição para negócios de maior valor acrescentado, e marca presença na promissora "blockchain" e inteligência artificial. Não é uma transformação fácil. O volume de negócios caiu durante seis anos consecutivos, mas, em 2018, as receitas voltaram a crescer, tendo superado a expectativas dos analistas. Desde janeiro, a cotação do título já valorizou 23 por cento.

Alternativa de investimento

Outra forma de investir em "cloud computing" é adquirir um fundo cotado em bolsa. Atualmente, só existe um ETF dedicado à nuvem. Tendo em conta que o setor tecnológico está muito valorizado, consideramos que o First Trust Cloud Computing tem um valor correto. Contudo, a necessidade de diversificar numa área em que há poucas empresas acaba por dispersar o foco deste fundo, que fica parecido a outros dedicados à tecnologia.

Entre os investimentos do ETF encontramos o Facebook ou a Zynga (Farmville), que abandonou os seus esforços na nuvem em 2015 e usa agora a Amazon Web Services.


Alphabet

A Alphabet Cloud tem uma quota de mercado de 9%, mas a empresa-mãe não discrimina as suas atividades nas contas, integrando-as no segmento "Outras receitas", que geram 14% dos resultados totais. O grande negócio da Alphabet continua a ser o da publicidade digital no Google, sendo a nuvem apenas uma das pontas de lança para crescer no futuro. Há outras, como a inteligência artificial e a condução autónoma. Apesar de ser uma das empresas mais promissoras na área tecnológica, os últimos resultados foram recebidos com pouco entusiasmo pelos investidores. Os elevados investimentos requeridos nesta área pesam nos bolsos da Alphabet, que viu a sua rentabilidade operacional diminuir.

A evolução lenta do projeto da condução autónoma, bem como o risco de multas dos reguladores, em particular da Europa, devido a práticas concorrenciais e tratamento de dados pessoais, levam-nos a refrear o otimismo em relação à dona do Google.

Conselho da PROTESTE INVESTE
À semelhança da Microsoft, a Alphabet tem indicadores razoáveis para uma líder tecnológica. Consideramos, por isso, que tem algum potencial de valorização, mas não ao ponto de recomendarmos a compra.


Alibaba Cloud

A líder do comércio online chinês tem uma quota de mercado mundial na nuvem estimada em 4%, mas reivindica possuir 48% do comércio chinês. No último trimestre, o volume de negócios da Alibaba Cloud cresceu 86%, representando 6% da faturação do grupo.

Conselho da PROTESTE INVESTE
A situação da Alibaba é muito semelhante à da sua concorrente direta, Amazon. Está em níveis que consideramos muito caros. O PER é de 46 e o rácio Enterprise Value/EBITDA de 41, o mais elevado de todas as empresas analisadas. A recomendação é vender.


Atores Secundários

Com menos de 3% de quota de mercado, há outras companhias que merecem ser mencionadas. É o caso da Oracle, especialista em software de gestão para empresas, da Tencent, outra gigante chinesa da internet, e da Salesforce.com, precursora, desde 1999, de soluções 100% na cloud.

Conselho da PROTESTE INVESTE
Mantenha a Oracle, que nos parece corretamente avaliada, mas venda a Tencent e a Salesforce.com, que consideramos caras.


AWS

Jeff Bezos é o "rei" da nuvem, com uma quota de mercado de 32 por cento. A Amazon, apesar de ser conhecida como a líder mundial do comércio online, retira da Amazon Web Services (AWS) 60% do seu lucro operacional, ainda que represente apenas 11% das receitas do grupo (+46% do que no período homólogo).

O mercado descobriu há muito tempo os méritos da Amazon, que no último ano chegou a ultrapassar um bilião de dólares de valor em bolsa. Se as perspetivas de crescimento são extraordinárias, a valorização atual é igualmente estratosférica. O PER (rácio entre a cotação e o lucro) é de 81. Por outras palavras, seriam precisos mais de 80 anos de lucros para pagar o valor atual das ações. A partir de 20 já se considera um título caro, ainda que, no setor tecnológico, se aceitem valores mais altos. Até o rácio cotação/vendas começa a parecer caro.

Atualmente, está em 3,5, sendo 2 um valor correto.

Quanto à relação entre o Enterprise Value (valor das ações e da dívida líquida da empresa ajustado) e o EBITDA (lucros antes de impostos, juros e depreciação e amortizações) está em 29. Seriam precisos quase 30 anos para os negócios da Amazon acumularem dinheiro suficiente para pagar a empresa (dívida incluída), antes de juros e impostos. Valor que é sensivelmente o dobro do mercado americano (15). Embora tenha anunciado, no final do ano, resultados líquidos de 3 mil milhões de dólares, os investidores estão preocupados com os investimentos que a Amazon precisa de fazer este ano. As receitas aumentaram quase 20%, no último trimestre de 2018, mas estão aquém dos valores de 2015. Há expectativas muito elevadas relativamente ao título e qualquer desilusão pode castigá-lo severamente. Por exemplo, a cotação atingiu um máximo histórico no início de setembro, mas até final de dezembro perdeu cerca de um quarto do seu valor (-24,7%), uma queda mais do forte do que a dos índices de referência S&P 500 (-13,1%) ou NASDAQ (-16,6%). Desde essa data tem, no entanto, recuperado.

Conselho da PROTESTE INVESTE
As atividades na nuvem, são, como referimos, muito mais lucrativas do que o comércio online. Aliás, a Amazon teve, em 2018, prejuízos com as operações de retalho fora dos Estados Unidos, que representam 28% das receitas. Tudo indica que a AWS continuará a crescer a dois dígitos, mas, pelos motivos apontados, consideramos a Amazon uma ação cara e, por isso, recomendamos a venda do título.


Microsoft Azure

A líder mundial de software é a número dois na nuvem, com uma quota de mercado de quase 17 por cento. A sua plataforma de "cloud" (Azure) e os serviços associados geram 28% das receitas, o que é assinalável dado o ritmo de crescimento, no último trimestre (48%). No final de fevereiro, a Microsoft apresentou a Azure Sentinel, uma nova ferramenta de segurança que combina a inteligência artificial, para analisar grandes volumes de dados, com a capacidade de computação escalável que a Azure disponibiliza.

Em termos de valorização, os níveis da Microsoft são muito mais razoáveis do que os da Amazon. O rácio cotação/ lucro está em 26, enquanto o valor da empresa (dívida incluída) representa 16 vezes o EBITDA dos últimos 12 meses.

Valores esses que seriam caros para uma ação mediana, mas aceitáveis no caso de uma firma com os atributos da Microsoft.

Conselho da PROTESTE INVESTE
O título não está barato ao ponto de recomendarmos a compra, mas os investidores que querem apostar no "cloud computing" devem ficar com ele debaixo de olho, tendo em conta a conjugação interessante da quota de mercado (em crescimento) com o peso relevante do negócio nas atividades da empresa e o crescimento generalizado das receitas e dos resultados.


IBM Cloud

A "Big Blue" é líder mundial nos serviços informáticos, mas é um concorrente de menor envergadura na nuvem, com uma quota de mercado de 4 por cento. A IBM tem tido dificuldade em ganhar terreno, mas deverá recuperar fôlego quando concretizar a aquisição da Red Hat. Embora as atividades na nuvem tenham, segundo a Canalys, crescido 27% de 2017 para 2018, a empresa não revela dados, preferindo consolidar os resultados.

Conselho da PROTESTE INVESTE
A IBM é uma tecnológica que transaciona a níveis ainda (relativamente) baratos. Tem um PER (rácio entre a cotação e o lucro) de 15 e um rácio Enterprise Value/EBITDA de 10, razão pela qual recomendamos a compra. Veja com mais detalhe esta ação no nosso portal (www.deco.proteste.pt/investe).

setores

Quem sai a perder

A nuvem representa uma disrupção tecnológica em grande escala. Permitiu o surgimento de novos atores e obrigou os tradicionais a adaptar-se para sobreviver.

Como todas as ruturas, criou oportunidades, mas também desafios. Veja quem está mais exposto a esta mudança e conheça as nossas recomendações.

Armazenamento de dados
Com o desenvolvimento da nuvem, o computador e o smartphone tendem a ser simples terminais de acesso à cloud, necessitando de menos velocidade de processamento e capacidade de armazenamento no disco rígido. As principais vítimas são os fabricantes especializados como a Western Digital ou a Seagate, cujas ações sofreram nos últimos anos. Os fabricantes de servidores informáticos também tiveram de se adaptar. Antecipando este desenvolvimento, alguns gigantes da informática, como a IBM, decidiram há vários anos vender, total ou parcialmente, os seus negócios de hardware, para se concentrarem no software e em serviços mais lucrativos.

O fabricante de PC, Dell, tornou-se, após adquirir a EMC em 2016, líder mundial no armazenamento e análise de dados.

Conselho da PROTESTE INVESTE
Mantenha a Western Digital, a Seagate, a HP e a Dell.

Especialistas em software
Nem todas as empresas que desenvolvem software se adaptaram tão bem como a Microsoft.

Gigantes dos aplicativos para empresas, como a Oracle e a SAP, viram as margens operacionais recuar com o novo modelo de negócios. A nuvem funciona, de um modo geral, em regime de subscrição, com faturação proporcional ao uso. Antes, os clientes pagavam à cabeça por um determinado número de licenças para os
programas, que muitas vezes eram pouco usadas.

Conselho da PROTESTE INVESTE
Venda a SAP e guarde em carteira a Oracle.

Imobiliário

A cloud exige uma infraestrutura considerável em termos de equipamento, consumo de energia e área. Por exemplo, um "datacenter" típico da Amazon pode ter 50 mil a 80 mil servidores, o que exige entre 14 mil e 20 mil metros quadrados (aproximadamente, dois a três campos de futebol).

Sociedades imobiliárias como a Equinix e a Digital Realty Trust tentaram aproveitar esta onda tecnológica e fizeram, nos últimos anos, grandes investimentos em centros de dados.

O sucesso, porém, foi moderado e há o risco de as plataformas abertas que oferecem serem preteridas a favor de centros de dados detidos e operados pelos titãs da nuvem.

Conselho da PROTESTE INVESTE
Venda a Equinix e a Digital Realty Trust.

Equipamentos de comunicações
Uma rede de internet rápida e fiável é uma condição essencial para o desenvolvimento da "cloud", dado o elevado número de dados transmitidos. Com a internet móvel de última geração (5G) a prometer velocidades 10 vezes superiores ao atual 4G, isso não será um obstáculo. As perspetivas de crescimento do setor são, portanto, sólidas. Na linha da frente estão empresas como a Ericsson, a Nokia, a Huawei e a Cisco Systems.

Conselho da PROTESTE INVESTE
Venda a Huawei, que está sob suspeita de espionagem, mas pode manter as restantes, que têm algum potencial de valorização.

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