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Ganhos da IA não vão chegar a toda a gente, avisa Rogoff

Na conferência anual do Negócios, o economista norte-americano afastou o rendimento básico universal como uma “pílula dourada” que resolva o impacto da inteligência artificial no emprego.

Além do economista norte-americano, a conferência do Negócios juntou várias pessoas das empresas, das artes e da academia para debater o tema da inteligência artificial. Pedro Catarino
07 de Novembro de 2024 às 23:03
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Embora admita que a inteligência artificial (IA) traz crescimento económico, Kenneth Rogoff, um conceituado professor norte-americano, considera que os ganhos não vão ser suficientes para pagar um rendimento básico incondicional que garanta qualidade de vida a toda a gente.

“Eu não acho que exista uma solução mágica. Um rendimento básico universal [na sequência da IA] e que garanta o suficiente para viver está a 100 anos de distância”, afirmou Kenneth Rogoff.

O antigo economista-chefe do Fundo Monetário Internacional (FMI) foi o orador principal da conferência “O Poder de Fazer Acontecer 2.0” do Negócios, que decorreu esta quinta-feira em Lisboa e que foi dedicada à IA.

Na conferência, Kenneth Rogoff foi confrontado sobre a necessidade da introdução de um rendimento básico incondicional que compense, de certa forma, os trabalhadores que vão ser afetados pela introdução da IA (e a consequente destruição – ou substituição – de emprego).

“Um rendimento básico incondicional de mil euros talvez, mas se quisermos dar 15 mil a toda a gente, estamos a falar provavelmente do PIB português. Não é fazível”, afirmou o professor de Harvard. Na verdade, atribuir esse montante à população ativa representa cerca de um quarto do PIB.

“Não acho que a IA vai necessariamente criar tanto PIB, tanto rendimento”, considerou o ex-economista-chefe do FMI.

A introdução do rendimento básico universal, um rendimento garantido independentemente da condição socioeconómica do beneficiário, tem sido uma das soluções apontadas por várias personalidades ligadas à inteligência artificial. Geoffrey Hinton, considerado o pai da IA, defendeu em maio à BBC uma reforma das transferências sociais que envolvesse um pagamento fixo aos cidadãos, mostrando-se “muito preocupado com o impacto da AI na destruição de empregos”. Essa é também uma linha defendida por Sam Altman, fundador do OpenAI, e por outros líderes ligados às tecnologias, como Ellon Musk (Tesla e X).

“O que [estas empresas] estão a dizer é ‘vamos ter todos os ganhos e vocês vão perder os empregos. Porque é que não nos taxam e ganham algum dinheiro com isso?’”, interpretou Kenneth Rogoff. Mas para o economista, não é assim tão linear.

“Isso seria muito difícil socialmente. As tensões sociais que vão surgir com a IA vão ser surpreendentes”, avisou. Agravará os problemas do populismo, da desglobalização e vai mudar as economias. Mas recusou a linha de um rendimento básico universal. “A maioria dos economistas considera, provavelmente de forma errada, que dar dinheiro às pessoas é melhor do que distorcer o mercado de trabalho”, disse o professor de Harvard. “Essas soluções são boas no papel, na teoria”, disse.

Depois, atirou-se às empresas: “Parece que estão a justificar a não regulação, permitindo que gerem muitos lucros, desde que paguem impostos. E depois o candidato Trump admitiu cortar os seus impostos. Não é coerente”, disse.

Vitória de Trump “não é o fim do mundo”

Na conferência do Negócios, o economista pronunciou-se ainda sobre o resultado das presidenciais norte-americanas da passada terça-feira.

“É uma pena que alguém tivesse de ganhar estas eleições”, ironizou Kenneth Rogoff, admitindo “fazer parte de uma pequena minoria que acredita que a vitória de Trump não é o fim do mundo”.

Segundo o professor de Harvard, “a economia norte-americana, mesmo com a desregulação e com a redução dos impostos, está muito bem”.

Recorde-se que o FMI estimou recentemente que a economia dos EUA cresça 2,8% este ano e 2,2% no próximo, o que compara com um crescimento de apenas de 0,8% e de 1,2% na Zona Euro, no mesmo período.

Depois, olhando para a frente, o antigo economista-chefe do FMI afirmou que “o impacto de Trump na política monetária não será muito grande”. Numa altura em que o mandato de Jerome Powell se aproxima do fim (termina dentro de dois anos), Rogoff antecipa que o novo Presidente dos Estados Unidos indique um novo presidente da Reserva Federal (Fed) “razoável”.

Se não o fizer ou se tentar interferir na política monetária da Fed norte-americana, “os mercados vão esmagá-lo”, com uma depreciação do dólar e um aumento dos juros, avisou Kenneth Rogoff.

“Não vejo um problema imediato na Fed”, diz o economista, que “não tem muito para onde ir”, a não ser cortar as taxas de juro em 25 pontos-base nas próximas reuniões. O problema pode estar no médio e longo prazo. A Fed poderá de lidar com novos picos inflacionistas algures dentro dos próximos “sete, oito anos” – uma tendência que será alimentada também por outras crises e pressões orçamentais, avisou o professor.

“Como defendemos a Europa, o Médio Oriente e Taiwan com um ajustamento orçamental? Alguma coisa vai ter de acontecer. As despesas militares vão ter de aumentar”, considerou, defendendo que Kamala Harris, se tivesse vencido as eleições, também teria de o fazer. “Vamos ver a dívida disparar”, admitiu.

As dúvidas de Kenneth Rogoff sobre o impacto de uma nova administração Trump na economia norte-americana e europeia está no agravamento das tarifas comerciais. “É muito disruptivo”, admitiu. Mas “no balanço final, não sei que impacto terá”, frisou o professor.

Outra dúvida está na possibilidade de Trump “minar as instituições” políticas, admitiu Kenneth Rogoff.

 

Eu não acho que exista uma solução mágica. Um rendimento básico universal [na sequência dos impactos da IA] que garanta o suficiente para viver está a 100 anos de distância.

 

A maioria dos economistas considera, provavelmente de forma errada, que dar dinheiro às pessoas é melhor do que distorcer o mercado de trabalho. Essas soluções são boas em teoria.

 

É uma pena que alguém tivesse de ganhar estas eleições. [...] Faço parte de uma pequena minoria que acredita que a vitória de Trump não é o fim do mundo.

 

O impacto de Donald Trump na política monetária não será muito grande. [...] Não vejo um problema imediato na Fed. [...]. Se Trump tentar interferir na Fed, os mercados vão esmagá-lo. Kenneth Rogoff
Economista, professor de Harvard

 

 

Para o economista, a vitória de Donald Trump não é “o fim do mundo” e para a Fed deverá escolher um moderado.
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