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Horta Osório defende que dinheiro dos contribuintes "não deve servir para salvar bancos"

O CEO do banco britânico Lloyds, que esta semana voltou a ser totalmente privado, fala sobre o estado da banca em Portugal, em entrevista à TSF e ao Dinheiro Vivo.

Miguel Baltazar/Negócios
Negócios 20 de Maio de 2017 às 21:11
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"Penso que dinheiro dos contribuintes não deve ser utilizado para salvar bancos como regra geral. Como qualquer sector, os bancos têm de ser bem geridos, ter pessoas adequadas à frente e quando as coisas correm mal, os gestores devem ser responsabilizados por isso, no sentido de as empresas irem à falência", defendeu António Horta Osório em entrevista à TSF e ao Dinheiro Vivo.

 

No entanto, frisa que há situações excepcionais que, pela sua gravidade, poderão requerer outro tipo de intervenção. No caso de crises como a de há 10 anos, o presidente executivo do Lloyds, do qual tomou as rédeas em 2011, considera que "os governos, em Portugal, Inglaterra, como no resto Europa e EUA, tomaram a decisão acertada de intervir nos bancos, porque se não o tivessem feito as consequências tinham sido muito piores".

 

"Mas isso foi por serem circunstâncias excepcionais e, portanto, o que tem de ser feito, desde aí, e que está a ser feito sobretudo nos EUA e Inglaterra, é evitar que alguma vez o dinheiro dos contribuintes seja de novo utilizado para salvar bancos. O dinheiro dos contribuintes é usado para outras questões mais relevantes", sublinhou.

 

Conhecedor na primeira pessoa do regime no Reino Unido, destaca nesta entrevista duas medidas importantes tomadas pelas autoridades britânicas: o ‘ring fencing’, medida que entra em vigor dentro de ano e meio e que obriga os bancos a separar as actividades arriscadas de trading e banca de investimentos internacional das actividades que apoiam a economia real; e os planos de recuperação e resolução.

 

Relativamente à segunda medida, reforça que as autoridades têm poderes, nos EUA e Europa, para "intervir na gestão de um banco que não está a ser bem gerido, substituir a gestão, impedir a distribuição de dividendos e bónus e, caso as coisas cheguem a um momento ainda pior, têm a capacidade de resolver esses bancos".

 

"O que as autoridades inglesas estão a fazer é obrigar os bancos a terem planos de resolução prontos até 2021, e a partir desse momento os bancos podem, se forem mal geridos, ir à falência e os accionistas terem responsabilidade disso, ou seja, perderem o seu dinheiro".

 

Horta Osório defende esta medida, "porque é para isso que os accionistas põem dinheiro nas empresas: para terem lucro quando corre bem e perderem dinheiro quando corre mal". E acrescenta que os bancos portugueses vão seguir esse caminho com a transposição das directivas comunitárias, especialmente no que diz respeito às instituições de risco sistémico.

 

Contribuintes têm o direito de saber onde se gastou o dinheiro da CGD

 

Questionado sobre a Caixa Geral de Depósitos, o CEO do Lloyds diz que "os contribuintes têm o direito de saber onde se gastou o dinheiro".

 

"Houve erros muito significativos na CGD anteriormente e acho que seria lamentável que não houvesse os resultados da investigação que se disse que ia acontecer", afirmou, acrescentando que é preciso que fique claro "que responsabilidades foram, quem emprestou o quê a quem".

 

Isto porque "o dinheiro não é dos accionistas, é dos contribuintes e estes têm o direito de saber como é que o seu dinheiro e o seu banco foi utilizado e as pessoas devem ser responsáveis perante aquilo que fizeram. Isso é essencial e gostaria muito que isso fosse conhecido".

 

Em relação ao futuro, diz ter uma posição simples: "o governo decidiu que vamos injectar mais dinheiro dos contribuintes na CGD, que é um banco completamente público. Dado que assim é, a CGD tem essa responsabilidade muito especial de apoiar fortemente a economia real do país, que bem precisa, que são as famílias e as PME". 

 

"É fácil acertar à segunda-feira nos resultados do futebol ao domingo"

 

Sobre a actuação dos últimos anos por parte do órgão regulador em Portugal e, mais precisamente, por parte do governador do Banco de Portugal, Horta Osório salienta que Carlos Costa foi o único a ter "a coragem de enfrentar Ricardo Salgado".

 

"Quando uma coisa corre mal, obviamente que a supervisão tem aí uma responsabilidade muito importante, como tem o governo no caso em que tem intervenção directa. Diria que foi negativo aquilo que aconteceu em certos bancos, mas não devemos confundir, já disse isso várias vezes, o polícia com o ladrão", afirmou.

 

Quanto às críticas que são feitas a Carlos Costa, o presidente executivo do Lloyds frisa que "todos nós podemos sempre fazer coisas melhores e acho que é um princípio bom para qualquer pessoa e que tento seguir sempre. É fácil acertar à segunda-feira nos resultados do futebol ao domingo".

 

"A supervisão podia ter feito coisas melhores, ninguém discute isso, nem o próprio governador. Mas eu gostava de destacar que o governador teve um papel fundamental no que se passou em relação a prevenir problemas maiores no grupo Espírito Santo. Os problemas foram muito significativos e o governador teve a coragem, naquela altura em que ninguém levantava a voz, apesar de alguns agora virem dizer que levantaram. Foi ele que tomou medidas frontais no sentido de tentar limitar ao máximo os problemas que estavam a acontecer. Não foi possível evitar a queda do banco, mas penso que teve um papel fundamental em efectuar as mudanças que foram implementadas há cerca de três anos", acrescentou.

 

Na sua opinião, "o principal problema que aconteceu no BES é da responsabilidade de quem o geria". "E, depois, acho que o governador teve um papel fundamental em tomar medidas duras, difíceis, que ninguém estava a preconizar. Nunca saberemos o que teria acontecido se ele não as tivesse tomado", rematou.

 

O exemplo do Lloyds

 

O banco que Horta Osório lidera viveu momentos de apuros e recebeu ajuda do Estado em Outubro de 2008, quando o Tesouro britânico injectou 20,3 mil milhões de libras (23,9 mil milhões de euros). Nessa altura em que o Lloyds foi intervencionado, o Estado ficou com 43,4% do seu capital. Agora, está tudo reembolso e o Tesouro encaixou 1.060 milhões de euros.

 

Agora, na passada quarta-feira, 17 de Maio, o Departamento do Tesouro britânico anunciou que vendeu as últimas acções que detinha no Lloyds, com um lucro de 900 milhões de libras (1.060 milhões de euros) para os contribuintes do país.

 

"O governo britânico anunciou hoje a venda das últimas acções no Lloyds Banking Group, recebendo mais de mil milhões de euros acima do valor que investiu no banco", comentou Horta Osório em comunicado, relativamente a esta operação.

  

Há algum tempo que o Tesouro britânico vinha a reduzir a sua presença no banco. A venda das participações estatais no Lloyds começou em Setembro de 2013 e foi retomada em Outubro do ano passado com o objectivo de concluir, no espaço de 12 meses, a venda da participação de 9,1% que o Estado então detinha. 

 

"Há seis anos herdámos um banco muito fragilizado e em situação financeira muito precária. Graças ao trabalho árduo desenvolvido por todas as equipas do banco, o Lloyds é hoje um banco muito sólido, rentável, a pagar dividendos e a apoiar a economia britânica", acrescentou o CEO do banco.

 

Horta Osório tem um longo historial na banca. Depois de uma passagem pelo Citibank Portugal e pelo Goldman Sachs, integrou o Santander em 1993, como CEO do Banco Santander de Negócios Portugal. Em 2006 transitou para o Santander UK e a 1 de Março de 2011 substituiu Eric Daniels no cargo de CEO do Lloyds – função que tinha sido anunciada em Novembro de 2010.

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