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Bancos forçados a criar mais uma almofada de capital

Banco de Portugal aumenta a reserva contracíclica para 0,75% em 2026. Passa a ser aplicada em momentos de “calmaria” em vez de esperar por sinais de agravamento das condições financeiras.

A regulação do Banco de Portugal em vigor é datada de 2008 e não abrange intermediários de crédito, negócio que tem crescido nos últimos anos.
Miguel Baltazar
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A partir de janeiro de 2026 os bancos vão ter de, no seu conjunto, constituir reservas adicionais face às exigências regulatórias atuais. A decisão pode limitar a capacidade de distribuição de dividendos.

Em causa está o facto de o Banco de Portugal ter decidido aumentar para 0,75% a chamada reserva cíclica, que está em vigor desde 2016 mas foi sempre de 0%, o que na prática significa que nunca teve impacto no capital do sistema financeiro nacional. O volume da almofada a criar pelo sistema financeiro pode ser na ordem das centenas de milhões de euros.

Esta reserva constitui uma almofada adicional de fundos próprios principais de nível 1 (CET 1, sigla para a expressão inglesa "Common Equity Tier 1") aplicável às exposições de crédito ao setor privado não financeiro (empresas e famílias).

O objetivo da reserva é permitir que os bancos consigam resistir a perdas relacionadas com o risco sistémico cíclico, mantendo a concessão de crédito à economia. Caso o risco se materialize, a reserva é libertada, total ou parcialmente.

Acontece, porém, que na prática, os bancos portugueses nunca tiveram de constituir esta reserva, porque ela foi sempre nula. E é aí que o Banco de Portugal quer agora intervir.

O aumento (cuja proposta entra em consulta pública nesta segunda-feira e deverá ser anunciado em definitivo no último dia do ano) explica-se com uma alteração na metodologia de cálculo usada pelo regulador. O objetivo último é antecipar o momento em que a reserva é ativada.

O valor da reserva – que por definição vai de 0% a 2,5% em intervalos de 0,25 pontos percentuais – é calculado trimestralmente, em função de um conjunto de indicadores económicos e financeiros (incluindo a evolução do mercado imobiliário, a evolução do crédito, a solidez do balanço dos bancos, o endividamento do setor privado, entre outros). Segundo a metodologia atual, a reserva só entra em ação em momentos em que é detetada uma acumulação do risco sistémico cíclico.

Essa acumulação, visível na evolução dos tais indicadores, acontece tipicamente antes da eclosão de crises. É a terceira das quatro fases do ciclo financeiro, que depois da crise tem a fase da recuperação (económica e/ou financeira), seguida de um período de ambiente neutro, o qual é sucedido por outro em que existe acumulação de risco (o que pode acontecer, por exemplo, se as famílias ou empresas começarem a perder capacidade de pagar os respetivos empréstimos). De seguida vem nova crise e o ciclo recomeça.

O que o regulador liderado por Mário Centeno pretende com esta alteração é antecipar o momento em que a reserva é ativada: em vez de "esperar" pelo período de acumulação de risco, o objetivo é antecipar esse momento para a fase de ambiente neutro. Ou seja, o cálculo do valor da reserva deverá incluir indicadores mais restritivos, permitindo a sua aplicação mesmo em períodos de tranquilidade financeira.

A decisão do regulador acontece depois de um período em que os bancos, fruto da subida dos juros do Banco Central Europeu (BCE), acumularam lucros e capital. A generalidade do sistema financeiro nacional tem rácios de capital muito confortáveis.

A proposta de aumento da reserva contracíclica está em consulta pública a a partir de hoje e até 19 de novembro. Deverá ser anunciada a 31 de dezembro deste ano, devendo estar constituída a 1 de janeiro de 2026.

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