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Crise bancária já levou à demissão de dois governadores do euro

O seu estatuto de independência torna praticamente inviável que sejam despedidos, como defendem PCP e Bloco de Esquerda para o governador Carlos Costa. Na Zona Euro, quatro sairam pelo próprio pé nos últimos anos, dois devido crise bancária.

Miguel Baltazar/Negócios
15 de Março de 2017 às 22:20
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Os governadores dos bancos centrais praticamente não podem ser demitidos pelos governos, mas há pelo menos dois casos na Zona Euro em que as pressões política e mediática levaram os responsáveis máximos dos bancos centrais a demitirem-se por causa da crise bancária dos últimos anos. Foram o caso de Miguel Ordoñez e Panicos Demetriades, ex-governadores dos bancos centrais de Espanha e Chipre.

Ordoñez demitiu-se em 2012,  um mês antes do final do mandato, na sequência da nacionalização do Bankia, que exigiu cerca de 20 mil milhões de euros aos contribuintes espanhóis e forçou o resgate a Espanha. Mais polémica foi a demissão do cipriota Panicos Demetriades, em Março de 2014, que não resisitu à pressão do resgate e às críticas do Presidente Nicos Anastasiades que o considerava incompetente e o responsabilizava por uma gestão desastrosa da crise. Apesar da tensão, a demissão só ocorreu depois do ministério público do país ter ordenado uma investigação a um contrato de consultoria ordenado pelo banco central.

Nos últimos anos houve duas outras demissões de governadores, mas que não estiveram associadas à crise bancária. António Fazio, em Itália, que foi apanhado em escutas a tentar influenciar uma operação de venda de banco, saiu em 2005 para dar lugar a Mario Draghi; e  Wolfgang Duchatczek, vice-governador do banco central austríaco, que se demitiu em 2013, envolvido num esquema de luvas numa empresa subsidiária do banco central.

Há outros casos de governadores que ficaram sob pressão política ou mediática, mas resistiram. E em nenhum caso o Governo tomou a iniciativa de despedir um governador, uma posição que é defendida em Portugal pelo PCP e Bloco de Esquerda para o governador Carlos Costa.

O Governo já sinalizou que, apesar de fazer um balanço negativo do desempenho do banco central, em particular nos casos do BES e do Banif, não avançará com um processo de demissão – que o colocaria numa situação única na Zona Euro, em choque com a prática europeia e com a interpretação do Banco Central Europeu quanto à independência dos governadores face ao poder político.

Tão independentes por quê?

Os governadores dos bancos centrais da Zona Euro não recebem ordens dos governos, são inamovíveis e só podem ser demitidos por "falta grave", um conceito vago, que poderá ser contestado no Tribunal de Justiça Europeu com fundamento numa violação dos Tratados da UE. 

Esta protecção legal resulta de um consenso de décadas nas economias avançadas de que a independência dos bancos centrais a conduzir a política monetária – libertando os governadores da pressão e tentação dos governos de estimularem as economias ao sabor do ciclo eleitoral – garante maior estabilidade de preços (inflação próxima de 2%) e com ela maior estabilidade financeira e económica.

Com a crise este consenso sobre a total independência dos banqueiros está a ser colocado em causa. Perante a evidência de que a estabilidade de preços, por si só, não garante a estabilidade financeira, de emprego e crescimento, tendo permitido a formação da maior crise em quase 100 anos, os banqueiros centrais foram ganhando (ou exercendo) mais poderes e funções, alguns deles com implicações políticas relevantes, como a decisão sobre o resgate de bancos que pode custar muito milhões de euros aos contribuintes; ou a opção de fornecer ou não liquidez a bancos em economias em crise que não sigam políticas defendidas pelo UE.

Mas mesmo na política monetária, as escolhas dos banqueiros passaram a estar sob maior pressão. Por um lado, os benefícios de coordenação entre a política monetária e a orçamental quando as taxas de juro estão em zero tornaram-se evidentes, levando os bancos centrais a opinarem com frequência sobre a política orçamental. Do outro lado, vários políticos têm criticado os estímulos monetários em excesso, nomeadamente os programas de compra de dívida pública.

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