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Tensão entre ingleses e espanhóis aumenta em torno de Gibraltar
Espanha estará a dificultar a circulação de turistas e habitantes da península inglesa e a imprensa avança que Rajoy poderá implementar mesmo taxa de passagem de 50 euros, valor que deverá ser canalizado para ajudar os pescadores espanhóis. Cameron já criticou e diz que Inglaterra está a considerar todas "as medidas possíveis".
À ameaça de acções legais contra Inglaterra, feita pelo Executivo de Mariano Rajoy, primeiro-ministro de Espanha, durante o passado fim-de-semana, respondeu, esta segunda-feira, Inglaterra, através do porta-voz de David Cameron, primeiro-ministro inglês, com o anúncio da preparação de acções legais “sem precedentes” contra Espanha, noticia o jornal El País.
Estas ameaças mútuas têm um motivo histórico - o conflito sobre a soberania da Península de Gibraltar e consequente controlo do estreito de Gibraltar. O direito de soberania de Inglaterra sobre Gibraltar decorre do Tratado de Utrecht, assinado em 1713, como pagamento de Espanha, após o término da Guerra da Sucessão Espanhola. Porém, ao longo destes 300 anos, a soberania foi sendo disputada de forma mais ou menos veemente.
O reacender da tensão surgiu depois de a administração de Gibraltar ter construído uma barreira artificial marítima, que as autoridades espanholas encaram como uma forma de bloqueio da passagem dos barcos de pesca espanhóis. Apesar de Gibraltar garantir que esta medida se deve a “motivos de protecção ambiental”, Espanha respondeu com o aumento dos controlos fronteiriços, que tem gerado filas e um congestionamento brutal na circulação de turistas e habitantes da península inglesa. Esta medida recorda o regime de Franco, quando estas passagens foram interditas. Para já, segundo avança o El País, Rajoy pondera aplicar uma taxa de passagem de 50 euros com o objectivo de ajudar os pescadores espanhóis prejudicados com a “rescisão unilateral do acordo de pescas de 1999” por parte do Governo gibraltino.
A este toca e foge diplomático, Inglaterra reagiu considerando esta medida do Governo Rajoy como uma represália. Ao que Espanha justificou tratar-se apenas de um incremento das medidas securitárias devido ao aumento do tráfico de tabaco naquela região e porque Gibraltar, tal como Inglaterra, não aderiu ao Acordo Schengen. Rajoy sublinha que é necessário “fazer controlos como os que têm sido feitos, até para fazer cumprir a normativa sobre o meio-ambiente da UE”.
Cameron considera que o controlo fronteiriço imposto por Espanha tem "motivações políticas" e, por isso, Inglaterra está a considerar todas "as medidas possíveis".
Este fim-de-semana assistiu-se ao escalar da tensão. As autoridades espanholas, de acordo com o jornal El País, ponderam levar este assunto a discussão nas Nações Unidas. Para tal tencionam contar com apoio da Argentina, que conta actualmente com assento no Conselho de Segurança da ONU, para onde o ministro dos Negócios Estrangeiros deverá viajar em breve, e que tal como Espanha mantém um diferendo com Inglaterra. Espanha considera que o apoio argentino pode ser vital no convencimento dos demais países com assento na Assembleia Geral da ONU.
O mayor de Londres, Boris Johnson, num artigo publicado no Daily Telegraph, acusou as “autoridades espanholas de, sem qualquer razão, ressuscitarem os controlos fronteiriços e a perseguição da época de Franco. Estão a causar atraso e incómodo e estão a ameaçar taxar os veículos que entrem no Rochedo. Isso é ilegal, à luz da lei da UE, e é equivalente a um bloqueio. Devem parar com isso e já" avisou.
O foco de tensão não pára, pois, de aumentar. O El País noticia que esta segunda-feira o porta-aviões, HMS Illustrious, da Armada Inglesa, zarpou para o Mar Mediterrâneo, com natural passagem em Gibraltar. A frota irá também incluir mais nove embarcações e, pelo menos, três fragatas que, segundo o Ministério da Defesa inglês, irão participar em manobras militares no Golfo Pérsico.
Não obstante a garantia do Ministério da Defesa de Inglaterra, novamente de acordo com o El País, o patrulheiro da Armada espanhola, o Centinela, irá juntar-se, em pleno Mediterrâneo, às embarcações inglesas, e já tem prevista uma escala em Gibraltar. Apesar da suposta gravidade que estas notícias possam indiciar, tanto Rajoy como o seu ministro da Defesa, Pedro Morenés, fizeram questão de retirar qualquer peso político ou diplomático a esta questão, sublinhando que as manobras militares previstas para o Mediterrâneo já estavam previstas desde 4 de Junho e realizar-se-ão pelo terceiro ano consecutivo.
Gibraltar é um pequeno território com cerca de 7 quilómetros quadrados e 30 mil habitantes. Porém, a importância histórica e geopolítica ultrapassa qualquer contabilidade assente em números. A soberania desta península é tema de disputa incessante entre os dois antigos Impérios Coloniais. Tal como o conflito sobre as Ilhas Falkands (Malvinas para os argentinos), o problema sobre Gibraltar é mais do que uma tentativa de obtenção de vantagens económicas ou de alargamento da Zona Económica Exclusiva (ZEE). É, também, uma questão de orgulho idiossincrático e revisionismo histórico, onde quem sai a perder dificilmente aceita a derrota.