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Protecionismo europeu e geopolítica abrandam investimento chinês na UE

“Na UE, há cada vez mais processos de monitorização de risco, tem sido um pouco a moda, e é um facto que o investimento chinês não é hoje tão facilitado em certas partes do mundo, nomeadamente na Europa, como era há uns anos", afirma o presidente do IEEM.

Thomas Peter / Reuters
14 de Outubro de 2023 às 10:33
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O presidente do Instituto de Estudos Europeus de Macau (IEEM) defendeu que a retração do investimento chinês na Europa, apesar da projeção de Pequim para o estrangeiro, está relacionada com geopolítica e algum protecionismo na União Europeia (UE).

 

"A retração do investimento não depende apenas do estado da economia chinesa", sustentou José Sales Marques, no momento em que se assinalam dez anos do lançamento da iniciativa 'Faixa e Rota'.

 

Designada pelo Presidente chinês, Xi Jinping, como o "projeto do século", esta iniciativa foi apresentada como um novo corredor económico para a Eurásia inspirado na antiga Rota da Seda, em que a construção de portos, linhas ferroviárias ou autoestradas ligando o leste da Ásia e a Europa, através da Ásia Central.

 

O economista admitiu que "há, obviamente, também mais dificuldades em termos de investimento chinês", mas diz não existirem "sinais de que tenha sido uma retração particularmente sensível ou significativa" por este motivo.

 

"O investimento chinês na Europa tem vindo a decair desde 2017, mas isso não tem a ver apenas com a vontade ou não da China em investir. (...) Na UE, há cada vez mais processos de monitorização de risco, tem sido um pouco a moda, e é um facto que o investimento chinês não é hoje tão facilitado em certas partes do mundo, nomeadamente na Europa, como era há uns anos", sublinhou.

 

E elenca várias razões. Por um lado, a "preocupação europeia em não disparatar investimento de empresas europeias, muitas vezes apoiadas pelo Estado, em tecnologia de ponta", com a UE avessa à aquisição das mesmas.

 

"Há também algumas questões relacionadas com as condições de acesso ao mercado chinês, mas também tem a ver com processos de ordem política e geopolítica, hoje em dia, cada vez mais", ressalvou.

 

O presidente do IEEM salientou que há "uma preocupação, que entretanto tem vindo a surgir na Europa, de se construir uma política industrial europeia, particularmente vinda da França, mas não só".

 

"Há aqui processos que não são assim tão ingénuos como parecem, há obviamente aqui uma intenção de reforço da própria estrutura e da base industrial europeia e processos que têm a ver com a questão da competitividade", apontou, para concluir: "Essas coisas às vezes também têm a ver com um certo protecionismo".

 

José Sales Marques não deixa de lembrar o contexto histórico em que foram realizados investimentos chineses na Europa, num passado não muito distante, e que, "hoje em dia, se calhar, convém não ser recordado".

 

"E o contexto histórico era, precisamente, de que não havia investimento pela parte europeia suficiente, estavam a cortar, estavam a colocar os países do sul da Europa como se fosse um grupo fora-da-lei. (...) Nós todos sabemos que os países do sul da Europa, incluindo Portugal, Grécia, Itália e Espanha, foram bastante maltratados durante uma certa fase e em que havia pouca solidariedade por parte da União Europeia. E nessa altura fez muito jeito o investimento chinês, salvou muitos postos de trabalho em Portugal, como terá feito em muitas partes da Europa", afirmou.

 

Para o presidente do IEEM, é positivo o balanço da iniciativa 'Faixa e Rota', que chegou a mais de 150 países, com "um volume de investimento que não tem comparação com outros investimentos feitos pelos Estados Unidos ou Europa" e que se tem assumido como "uma forma muito própria da China participar na globalização, com evidentes interesses económicos", que passam "pela internacionalização da economia, empresas e da própria moeda chinesa".

 

"O que é verdade é que esta iniciativa chinesa veio colmatar um défice extraordinário que existe a nível mundial de investimento nas infraestruturas. Um défice de triliões, e que continua", tanto mais porque "não é um projeto com um calendário temporal limitado", mas sim "um processo que não assenta numa "vontade unilateral da China, mas também da vontade do outro país", existindo "ao longo do processo momentos mais felizes e casos de insucesso", mas em que "as partes vão aprendendo".

 

Para o economista, o investimento chinês é hoje muito visível sobretudo na América Latina, África e no Sudeste Asiático, destacando o impacto em países lusófonos africanos e no Brasil, apesar de este não estar enquadrado na iniciativa 'Faixa e Rota'. No sudeste asiático, a Indonésia é "considerada por algumas publicações (...) como o destino mais desejado para o investimento chinês", acrescentou.

 

"A 'Faixa e Rota' tem sido "positiva em termos de desenvolvimento, sobretudo em países em vias de desenvolvimento", até porque "há necessidade de criar emprego, há necessidade criar estruturas de mercado interno, há necessidade de inverter ou reverter essa tendência de que os países ricos são cada vez mais ricos e os países pobre cada vez mais pobres", defendeu.

"Temos de ver as coisas nesta perspetiva de desenvolvimento económico a nível mundial", salientou.

 

José Sales Marques disse ainda à Lusa que o Instituto de Estudos Europeus está neste momento a conduzir um projeto de investigação sobre a iniciativa 'Faixa e Rota' e o processo de investimento de transição energética, em parceria com a Universidade de Leiden, através do Instituto Internacional de Estudos Asiáticos, e com o apoio da Fundação Macau.

 

Em dezembro, terá lugar uma conferência na qual será apresentado o relatório preliminar do estudo, que tem pouco mais de um ano e que envolve 25 investigadores e dois coordenadores.

 

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