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Nuno Silva Vieira: "Inteligência artificial contribuirá para maior confiança na Justiça"

Entusiasta do uso de novas tecnologias pelos advogados, Nuno Silva Vieira entende, contudo, que na Justiça e na defesa das pessoas, "o fator humano será sempre incontornável".

Miguel Baltazar/Negócios
21 de Março de 2019 às 11:00
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Nuno da Silva Vieira é o sócio fundador de um projeto singular na área da advocacia. É um jovem advogado que tem a sua base de trabalho em Braga e que está envolvido em processos mediáticos, como os que envolvem o apoio aos lesados do BES e do Banif.

 

Estabeleceu recentemente uma parceria com a IBM Portugal, dando origem a um projeto em que a inteligência artificial é usada para tornar mais fácil a prestação de serviços jurídicos. Entusiasta das novas tecnologias, acredita, contudo, que os advogados não são substituíveis. "No dia em que a justiça for feita por máquinas, as pessoas correrão em busca de um humano para as defender", diz.

 

Que serviços jurídicos podem hoje ser assegurados pelos advogados com o apoio da inteligência artificial?

As novas tecnologias associadas à inteligência artificial podem assegurar múltiplas experiências para quem procura serviços jurídicos. Estamos a assistir a uma revolução no setor, desde as simples aplicações gratuitas que facilitam a vida do advogado no agendamento inteligente de reuniões - como é o caso de aplicações que se socorrem da informação em tempo real do GPS para informar sobre eventuais atrasos - até aos potentes algoritmos que nos permitem interagir com as máquinas no estudo de um caso concreto.

 

Essa nova realidade pode de algum modo aproximar o advogado do cliente?

Acreditamos que os advogados nunca estiveram tão perto de garantir serviços jurídicos verdadeiramente próximos dos clientes, com acesso, em tempo real, à informação relacionada com os seus processos e com reporte técnico personalizado, o que, em larga medida, estamos convencidos, muito irá contribuir para uma maior confiança na Justiça, por parte dos cidadãos.

 

Os escritórios de maior dimensão têm escala para investir em novas tecnologias de informação. Como é que um pequeno escritório responde a este desafio?

Acima de tudo, não tendo medo. O medo paralisa-nos e impede-nos de evoluir. O nosso escritório é pequeno em termos de dimensão, mas grande em ambição, ousadia e capacidade de trabalho. Essa é a nossa mais-valia. Claro que conseguir disponibilizar recursos para grandes investimentos é um desafio, mas é aí que reside um pouco da singularidade do nosso ADN.

 

Que singularidade é essa?

Os nossos recursos vêm dos clientes e do tipo de serviços que lhes prestamos. Por essa razão, tentamos trabalhar tendo por base os mais elevados padrões de qualidade. Só assim conseguimos gerar real valor acrescentado aos nossos clientes. Até agora, a "fórmula" tem-se revelado eficaz.

 

Tendo em conta o recurso crescente à inteligência artificial, que papel está reservado aos advogados?

O fator humano será sempre incontornável. No dia em que a justiça for feita por máquinas, as pessoas correrão em busca de um humano para as defender. Da mesma forma que usamos máquinas para o pagamento de portagens, os nossos políticos podem vir a achar uma boa ideia ter uma justiça artificial ou, até, governos artificiais. No dia em que isso for possível, acredito que um novo direito fundamental poderá emergir : o direito fundamental a ter um advogado humano.

 

Em que medida vai a Justiça como um todo poder beneficiar com o trabalho dos robôs?

Na minha opinião não é correto confundir robôs com inteligência artificial. Aliás, a expressão "inteligência artificial" também não é a mais correta. Hoje em dia, lidamos com algoritmos e programas que recorrem a "softwares" muito complexos aos quais podemos chamar "inteligência aumentada".

 

Como é que devemos olhar para este tipo de inteligência?

Como uma forma de incremento das capacidades dos humanos e não como algo que vem substituir a sua inteligência, até porque hoje já somos todos híbridos.

 

A que é que se refere?

O que seria de nós sem as capacidades dos nossos smartphones? Eu sou relativamente jovem. O meu primeiro telemóvel foi comprado quando entrei no primeiro ano da Faculdade. Só servia para fazer chamadas e enviar mensagens. A minha inteligência estava muito menos aumentada do que a de alguém que hoje possui um smartphone e que consegue, quase instantaneamente, aceder a um leque gigantesco de informação.

 

Como será a Justiça influenciada por essa "inteligência"?

Irá dotar a Justiça de capacidades nunca antes vistas. Imaginemos a reconstrução da cena de um crime, em realidade virtual: à medida que ouve as testemunhas, o juiz poderá também perceber mais facilmente se os factos poderiam ter, ou não, ocorrido. Como, por exemplo, se a bala disparada da janela indicada pela testemunha poderia ter ferido a vítima do ângulo proposto.

Advogado e "líder empresarial"

Nuno da Silva Vieira tem 38 anos e é advogado desde 2006. Licenciou-se em Direito pela Escola de Direito da Universidade do Minho, para depois apostar na formação pós-graduada em Direitos Humanos, Direito Comercial, Compliance e Gestão. Em 2017, conclui o programa de Inovação e Empreendedorismo do IESE - Business School, na cidade de Nova Iorque. Atualmente, Nuno da Silva Vieira está a concluir um Executive MBA na AESE Business School. No ano passado, aquele que é também sócio fundador da Vieira Advogados integrou a lista dos "40 Líderes Empresariais do Futuro", uma iniciativa do Expresso e do Fórum de Administradores e Gestores de Empresas, sendo o único advogado presente.

"Defender pessoas em tribunal é o último recurso"

Na área do Direito Penal, nomeadamente Económico, em que tem trabalhado, de que modo pode a inteligência artificial auxiliar os advogados?

Na área do Direito Penal Económico, quem acredita que os advogados existem para defender pessoas nos tribunais, está deslocado da realidade. Esse é o último recurso.

 

Deve antes apostar numa atitude preventiva?

É importante que desviemos as pessoas dos tribunais, apoiando-as, previamente, na sua tomada de decisões. Pode parecer estranho, mas é nisso que eu acredito. Atualmente, um advogado tem de estar sentado ao lado do presidente do conselho de administração e deve, de forma permanente, avaliar as decisões dos administradores e das empresas. Chama-se a isto "compliance" ativa.

 

É uma forma de responder aos reguladores?

A regulação das atividades económicas é tão complexa que exige uma avaliação contínua, conjugada com a enorme panóplia de disposições legais nacionais, europeias e internacionais. Presentemente, na Vieira Advogados, já estamos a fazer testes preditivos de sentenças judiciais, através da inteligência artificial.

 

Como é que isso é feito?

Usamos uma base de dados gigantesca que reúne 30 anos de sentenças judiciais em Portugal. Definimos acontecimentos políticos, sociais e económicos relevantes e, a partir daí, é apenas pensar "fora da caixa".

Caso BES: sentença ajuda a "apanhar" ex-administradores 

Nuno da Silva Vieira, que representa os Fundos internacionais que avançaram com a ação de anulação da deliberação do Banco de Portugal que aplicou uma medida de resolução ao BES, disse ao Negócios que os seus clientes vão apresentar recurso da decisão do Tribunal Administrativo do Círculo de Lisboa, que considerou improcedente a ação de anulação daquela deliberação.

 

Apesar de discordar da decisão daquele tribunal, Nuno da Silva Vieira admite que, em parte, a sentença "abre caminho para a responsabilização cível, penal e contraordenacional" de "ex-administradores, auditores, seguros de responsabilidade civil e outros intermediários" na colocação dos produtos financeiros que originaram perdas aos investidores.

 

A perspetiva de Nuno da Silva Vieira assenta no facto de a sentença do Tribunal Administrativo do Círculo de Lisboa caracterizar as atividades do Banco Espírito Santo e do Grupo Espírito Santo, como "devaneios bancários".



 

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