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Abel Mateus: "Há indícios de que temos de ter muito cuidado com a dimensão do sector público"

O economista está a coordenar uma proposta de reforma orçamental promovida pela Fundação Francisco Manuel dos Santos, na qual defende que a elevada despesa pública está a forçar graus de tributação e de progressividade nos impostos que desincentivam o trabalho, o investimento e a poupança.     

Bruno Simão/Negócios
26 de Setembro de 2017 às 18:58
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A dimensão do Estado está a atingir um nível perigoso em Portugal, em parte pela ineficiência da despesa, o que exige níveis de tributação e de progressividade que desincentivam o trabalho, a poupança e o investimento. O diagnóstico é de Abel Mateus, consultor do Banco de Portugal e administrador do Banco Europeu para a Reconstrução e o Desenvolvimento (BERD), e enquadra o trabalho que está a coordenar para a Fundação Francisco Manuel dos Santos (FFMS), no âmbito do projecto "Orçamento, economia e democracia: uma proposta de arquitectura institucional" que deverá estar pronto no final de 2018, a um ano das eleições legislativas de 2019.

 

"Há limites à dimensão do Estado que não podem ser ultrapassados", defendeu numa sessão de debate sobre um relatório intermédio, citando por exemplo um estudo de dois economistas da Universidade de Chicago que estimam que "para taxas de impostos superiores a 40% começam a verificar-se implicação relevantes sobre afectação de recursos".  

 

"Há indícios de que temos de ter muito cuidado com a dimensão do sector público" em Portugal, continuou, defendendo que o país, por ser mais pobre, até deveria ter um Estado mais pequeno do que os países mais ricos da OCDE. 

 

Para o economista, além da dimensão, há também ineficiências na execução da despesa, nomeadamente na educação, saúde, pensões e investimento, sublinhando que "um problema adicional da falta de eficiência do sector público tem a ver com a necessidade de cobrar mais impostos" que daí resulta.

 

As conclusões do relatório preliminar chocam com muitas das prioridades que vêm sendo defendidas à esquerda num debate sobre escolhas orçamentais e isso não foi esquecido pelo economista: "Um estudo recente de economistas próximos do PS defende teorias que pensava que já não se usavam, como a ideia de crescer pela despesa", disse no final das sessões de debate que duraram a tarde de terça-feira. Em causa o estudo de Paulo Trigo Pereira, Ricardo Cabral, Luis Morais Teles e Joana Vicente que defendeu que é seria possível ao Governo gastar mais sem ameaçar as contas públicas.

 

Mas se na despesa as coisas não estão bem, nos impostos há "problemas muito sérios", classificou Mateus. No IRS, Portugal enfrenta "elevadas taxas marginais de impostos" e "um dos esquemas mais progressivos que não incentiva a poupança" e "desincentiva o trabalho". No IRC, o país conta com "a taxa efectiva mais elevada que países da Europa de Leste e que não incentiva o investimento. No IVA, a taxa normal é de 23%, mas a taxa efectiva ronda os 10%, o que sinaliza margem para melhoria.

 

As propostas do administrador do BERD foram comentadas por Orlando Caliço, ex-secretário de Estado dos Assuntos Fiscais em 2004, e um dos autores do famoso relatório Ecordep – produzido por um conjunto de especialistas nomeados pelo ministro Pina Moura para proporem uma reforma da despesa pública em 2001 – que nunca chegou a ser implementado.

 

Talvez por essa essa experiência, Caliço centrou os comentários na viabilidade política em sentido lato de uma documento que, pela sua organização e ambição, lhe revelou semelhanças com um "programa político", no qual há dimensões em relação às quais ainda é preciso pensar "um bom bocado". É o caso da multiplicidade de comissões que admite criar para reformar a despesa e os impostos e a ambição de promover uma reforma fiscal de fundo antes de ganhar espaço orçamental do lado da despesa. Por isso, talvez fossem preferíveis medidas pontuais, mas mais exequíveis.

 

O debate contou com contributos de vários dos autores que constituem a equipa de Abel Mateus: os economistas José Tavares e Francesco Franco, da Universidade Nova; André Azevedo Alves e Catarina Leão, cientistas políticos das universidades Católica e Oxford; e Rita Calçada Pires, jurista da Universidade Nova, que analisaram a dimensão redistributiva do Orçamento, a capacidade de estabilização da actividade económica da política orçamental; e os controlos democráticos e constitucionais sobre o Orçamento. As conclusões foram comentadas pelos economistas Carlos Farinha Rodrigues, Ricardo Reis, Teodora Cardoso, João Borges Assunção e pelo jurista Rui Lanceiro.

 

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