Notícia
A Europa desconfia da China e tem cada vez menos medo de o dizer
A pandemia parecia uma oportunidade para estreitar laços e reforçar a confiança entre o bloco europeu e Pequim. Mas em vez disso, está criar terreno fértil para acentuar desentendimentos e azedar as relações.
Primeiro houve promessas de solidariedade, agora há desconfiança. Por ter sido o primeiro país a lidar com a violência da covid-19, e tendo-se visto forçado a um lockdown inicial de uma parte significativa da sua economia, a China liderou o caminho do combate à pandemia e, depois, da retirada das medidas de confinamento social. Mas a pouco e pouco as relações diplomáticas estão a esfriar.
Com um sentido de oportunidade bem apurado, num primeiro momento, Pequim disponibilizou informação sobre o vírus, equipas médicas, material clínico e know how sobre as medidas de saúde pública. Por exemplo, a 13 de março, quando o número de infetados em Itália ia nos dez mil, a China enviou uma equipa médica da Cruz Vermelha, 30 toneladas de máscaras, caixas com ventiladores, tudo devidamente embalado com a bandeira chinesa, para Roma.
Estreitar relações com a Europa, um mercado que, ao contrário dos Estados Unidos, tem evitado guerras comerciais abertas com Pequim, seria uma vantagem que prometia frutos económicos no futuro. Mas nas últimas semanas a estratégia descarrilou e a desconfiança instalou-se.
Um dos episódios que virou as agulhas da diplomacia passou-se em Paris, a 12 de abril. No site da embaixada chinesa em França, foi publicado um texto não assinado – que se depreende que seja de um diplomata chinês – a acusar os funcionários franceses de lares de deixarem idosos infetados com o novo coronavírus a morrer, entregues à sua sorte, sem assistência. Também critica abertamente os media europeus de "estigmatizar a China" e de culpabilizar Pequim pela pandemia, ao levantarem dúvidas sobre a qualidade da informação disponibilizada sobre os primeiros dias do surto.
O Executivo francês reagiu de imediato, pedindo explicações à China. As afirmações do referido post "não se adequam à nossa relação bilateral", disse o ministro dos Negócios Estrangeiros francês, Jean-Yves Le Drian. Pequim apressou-se a classificar o episódio como um "mal entendido", mas as marcas ficaram.
Até porque a desconfiança já pairava. A Bloomberg conta que numa conferência telefónica a 25 de março, entre ministros dos Negócios Estrangeiros do G-7 (Canadá, França, Alemanha, Itália, Japão, Reino Unido e Estados Unidos), foi referida a necessidade de a Europa se manter atenta às movimentações chinesas e de como Pequim pode explorar a vantagem atual sobre as economias que continuam em lockdown.
A 17 de abril, o Bild, o maior jornal tabloide alemão, publicou uma carta aberta dirigida ao presidente chinês, Xi Jinping, acusando-o de "colocar o mundo em risco". Este é só mais um reflexo de relações tensas. O ministro alemão dos Negócios Estrangeiros, Heiko Maas, disse ao Bild que a revisão recente do número de mortes causadas pela covid-19 na China é "alarmante", o presidente francês, Emmanuel Macron frisou numa entrevista ao Financial Times que "há claramente coisas que aconteceram [na China] que desconhecemos", e Dominic Raab, do Executivo britânico, argumentou que quando a pandemia passar não será possível voltar ao "business as usual" com a China.
Alemanha: uma peça central
No xadrez da diplomacia europeia, a posição da Alemanha está a ser vista como determinante. Segundo a Bloomberg, as exportações alemãs para a China no ano passado ultrapassaram as do Reino Unido, França, Itália, Espanha e Holanda, todas juntas. As relações entre os dois países são fortíssimas e a Alemanha vai assumir a presidência rotativa da União Europeia a 1 de julho.
Por enquanto, o que se vê em Berlim é o aumento das precauções. O país reforçou o seu protocolo de verificação dos regulamentos para a entrada de investimento estrangeiro na economia alemã, sem especificar o caso da China, mas controlando, de qualquer modo, melhor a entrada de capital nas suas empresas. Além disso, reforçou o investimento para desenvolver a sua produção de máscaras – um bem atualmente muito dependente da China, que é responsável por um quarto das exportações mundiais deste equipamento.
Da Comissão Europeia, surgem os mesmos sinais de cautela. Margrethe Vestager, comissária para a concorrência, sugeriu numa entrevista ao Financial Times que os Estados podem tomar eles próprios posições nas empresas, para evitar que a China tome conta de setores estratégicos.
Phil Hogan, comissário europeu para o Comércio, sublinhou na semana passada a importância de reavaliar a "autonomia estratégica" da UE, frisando a importância de diversificar mercados para construir cadeias de fornecimento resistentes.
Com um sentido de oportunidade bem apurado, num primeiro momento, Pequim disponibilizou informação sobre o vírus, equipas médicas, material clínico e know how sobre as medidas de saúde pública. Por exemplo, a 13 de março, quando o número de infetados em Itália ia nos dez mil, a China enviou uma equipa médica da Cruz Vermelha, 30 toneladas de máscaras, caixas com ventiladores, tudo devidamente embalado com a bandeira chinesa, para Roma.
Um dos episódios que virou as agulhas da diplomacia passou-se em Paris, a 12 de abril. No site da embaixada chinesa em França, foi publicado um texto não assinado – que se depreende que seja de um diplomata chinês – a acusar os funcionários franceses de lares de deixarem idosos infetados com o novo coronavírus a morrer, entregues à sua sorte, sem assistência. Também critica abertamente os media europeus de "estigmatizar a China" e de culpabilizar Pequim pela pandemia, ao levantarem dúvidas sobre a qualidade da informação disponibilizada sobre os primeiros dias do surto.
O Executivo francês reagiu de imediato, pedindo explicações à China. As afirmações do referido post "não se adequam à nossa relação bilateral", disse o ministro dos Negócios Estrangeiros francês, Jean-Yves Le Drian. Pequim apressou-se a classificar o episódio como um "mal entendido", mas as marcas ficaram.
Até porque a desconfiança já pairava. A Bloomberg conta que numa conferência telefónica a 25 de março, entre ministros dos Negócios Estrangeiros do G-7 (Canadá, França, Alemanha, Itália, Japão, Reino Unido e Estados Unidos), foi referida a necessidade de a Europa se manter atenta às movimentações chinesas e de como Pequim pode explorar a vantagem atual sobre as economias que continuam em lockdown.
A 17 de abril, o Bild, o maior jornal tabloide alemão, publicou uma carta aberta dirigida ao presidente chinês, Xi Jinping, acusando-o de "colocar o mundo em risco". Este é só mais um reflexo de relações tensas. O ministro alemão dos Negócios Estrangeiros, Heiko Maas, disse ao Bild que a revisão recente do número de mortes causadas pela covid-19 na China é "alarmante", o presidente francês, Emmanuel Macron frisou numa entrevista ao Financial Times que "há claramente coisas que aconteceram [na China] que desconhecemos", e Dominic Raab, do Executivo britânico, argumentou que quando a pandemia passar não será possível voltar ao "business as usual" com a China.
Alemanha: uma peça central
No xadrez da diplomacia europeia, a posição da Alemanha está a ser vista como determinante. Segundo a Bloomberg, as exportações alemãs para a China no ano passado ultrapassaram as do Reino Unido, França, Itália, Espanha e Holanda, todas juntas. As relações entre os dois países são fortíssimas e a Alemanha vai assumir a presidência rotativa da União Europeia a 1 de julho.
Por enquanto, o que se vê em Berlim é o aumento das precauções. O país reforçou o seu protocolo de verificação dos regulamentos para a entrada de investimento estrangeiro na economia alemã, sem especificar o caso da China, mas controlando, de qualquer modo, melhor a entrada de capital nas suas empresas. Além disso, reforçou o investimento para desenvolver a sua produção de máscaras – um bem atualmente muito dependente da China, que é responsável por um quarto das exportações mundiais deste equipamento.
Da Comissão Europeia, surgem os mesmos sinais de cautela. Margrethe Vestager, comissária para a concorrência, sugeriu numa entrevista ao Financial Times que os Estados podem tomar eles próprios posições nas empresas, para evitar que a China tome conta de setores estratégicos.
Phil Hogan, comissário europeu para o Comércio, sublinhou na semana passada a importância de reavaliar a "autonomia estratégica" da UE, frisando a importância de diversificar mercados para construir cadeias de fornecimento resistentes.