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Professores: Centeno acusa PSD de violar a Constituição. CDS pede retificativo
O ministro das Finanças garante que a antecipação da recuperação do tempo de serviço para todas as carreiras teria um impacto de 240 milhões de euros por ano, o que considera incompatível com a norma travão. Mas acabou por não explicar aos deputados qual é a verba para recuperação do tempo do serviço que consta do orçamento. A oposição alega que é possível gerir os excedentes, usar a dotação provisional ou mesmo aprovar um orçamento retificativo.
O deputado do PS, Porfírio Silva, já o tinha referido. Esta terça-feira, numa audição na Assembleia da República – pedida pelo PS – foi Mário Centeno quem usou o argumento que também foi sugerido pelo Presidente da República:a proposta do PSD para antecipação da recuperação do tempo de serviço dos professores viola a Constituição.
Numa audição na comissão de Educação, tão agitada que levou o Presidente a pedir a todos que parassem com a "gritaria", o ministro das Finanças acusou os restantes partidos – em particular o PSD – de irresponsabilidade e de eleitoralismo.
"É evidente que esta proposta [do PSD] viola a lei travão, mas violar a Constituição é um hábito que ficou ao PSD", atirou Centeno. "A lei travão não diz nada sobre dotações provisionais, sobre execução orçamental", porque essa é uma tarefa do Governo, referiu.
Em causa está o artigo 167.º da Constituição, que estabelece que "os grupos parlamentares e os grupos de cidadãos eleitores não podem apresentar projetos de lei, propostas de lei ou propostas de alteração que envolvam, no ano económico em curso, aumento das despesa ou diminuição de receitas do Estado previstas no orçamento".
As propostas apresentadas por BE, CDS, PCP e PSD têm artigos que aumentam os custos deste ano, pelo menos quando comparados com o decreto-lei do Governo (já que ninguém esclarece o que está no orçamento), uma vez que antecipam para 1 de janeiro a recuperação de dois anos, nove meses e 18 dias.
Na mesma audição, que foi pedida pelo PS com caráter de urgência, o ministro das Finanças ainda referiu que "podemos sempre pensar em retificativos, que também rima bem com o seu partido, e com derrapagens orçamentais". "Não nos enganemos: o comportamento da regra da despesa é incompatível se não forem estipulados quais os aumentos de impostos ou despesa cortada".
Reiterando alguns números, Centeno explicou que em velocidade de cruzeiro, daqui a alguns anos, a recuperação dos mais de nove anos de serviço dos professores teria um custo permanente 635 milhões de euros (800 milhões de euros em todas as carreiras), com 35 mil professores (cerca de um terço do total) a chegar ao topo da carreira até 2023.
Já a antecipação da recuperação de uma parte do tempo de serviço - a que o Governo quer recuperar ao longo de vários anos – em todas as carreiras (não apenas na dos professores) custaria 240 milhões de euros.
Mário Centeno acabou por não esclarecer qual é afinal a verba para a recuperação do tempo de serviço dos professores que está no orçamento do Estado, apesar de ter reiterado que a recuperação de uma parte do tempo de serviço em todas as carreiras custa 40 milhões. Num comunicado divulgado depois da audição, o Governo revelou mais dados.
CDS pede retificativo
Todos os partidos (excepto o PS) têm propostas para a recuperação de todo o tempo de serviço dos professores. Mas enquanto o PCP e o Bloco de Esquerda apresentam um calendário fechado, PSD e CDS fazem depender o cumprimento deste princípio das condições orçamentais.
O PSD sustenta que é possível usar a dotação provisional para antecipar o efeito da recuperação do tempo de serviço para o início de 2019.
"Aprovou uma dotação provisional de 330 milhões que em última análise pode ser usada", disse a deputada Margarida Mano. Além disso, segundo explicou o Parlamento aprovou no ano passado uma verba de 130 milhões para descongelamento de carreiras e só foram usados 7 milhões.
Mariana Mortágua, do Bloco de Esquerda, sugeriu que é uma questão de opções políticas. "É para o pagamento do buraco de novo banco – que não estava em nenhum programa eleitoral – que vai dirigir a folga orçamental?"
A questão é colocada noutros termos pelo PCP, que tem argumentado que a verba tem de estar contemplada: "O orçamento do estado prevê a recuperação de ‘o’ tempo de serviço", alegou o PCP, através da deputada Ana Mesquita.
Já Ana Rita Bessa, deputada CDS, sugeriu um orçamento retificativo. "Há vários instrumentos para resolver esta situação e há uma decisão política que lhe cabe a si assumir se quer usar ou não. Uma delas é um retificativo. E não lhe caem os parentes na lama se fizer um retificativo", disse. "Tem outro caminho que é possível fazer: pode simplesmente creditar na conta dos professores o tempo e fazer o pagamento desvantagem. Qual a vantagem? Evitar as ultrapassagens."
Mário Centeno reagiu mal: "Seria obviamente o descrédito da República portuguesa".
Aumentar o IVA? As contas de Centeno
Aumentar o IVA em um ponto percentual para garantir a recuperação total do tempo de serviço dos professores? É a hipótese colocada (em teoria) por Mário Centeno. São estas as contas do ministro das Finanças, que garante que os dados são "líquidos" de aposentações. Os deputados consideram a informação insuficiente:
1) O mero descongelamento do tempo de serviço, em vigor desde o início de 2018, implica uma despesa permanente, em velocidade de cruzeiro, de 574 milhões de euros por ano. Permite que até 2023 20 mil professores cheguem ao topo de carreira (a ganhar cerca de 3.374 euros). "Por docente significa um aumento médio de salário de 15% entre 2018 e 2023, equivalente da 309 euros."
2) Com o decreto-lei que recupera 2 anos, 9 meses e 18 dias, aprovado pelo Governo, o custo "total" das progressões sobe para 760 milhões de euros. "Até 2023 cada professor terá em média duas progressões", com um aumento médio salarial de 21% ou 410 euros por mês.
3) A recuperação dos nove anos, quatro meses e dois dias – proposta pelos partidos – teria um impacto permanente com salários de docentes de 635 milhões de euros em velocidade de cruzeiro, ou seja, daqui a uns anos (800 milhões se se incluirem as outras carreiras). Somada ao descongelamento, a despesa sobe para 1.209 milhões de euros.
Mário Centeno diz que neste cenário 35,5 mil professores atingiriam o topo de carreira e nos dois últimos escalões estariam metade dos professores. "Os 800 milhões de euros de despesa adicional com progressões [de várias carreiras] representaria 4% de toda a massa salarial do Estado. Adicional. Isso significa exatamente o mesmo do que cerca de 3 anos de aumentos do Estado à taxa de inflação, o mesmo que repor a sobretaxa ou aumentar o IVA um ponto percentual ou o equivalente àquilo que nesta legislatura foram as decisões sobre o impacto geral das pensões", concluiu.
Notícia atualizada às 17:04 com mais informação, incluindo as contas do ministro das Finanças.