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Santos Silva: Não acho que o FMI seja neoliberal

Liberalização dos despedimentos implicaria violar ou alterar a lei fundamental, lembra Augusto Santos Silva, para quem a "troika" não impõe nada. Negoceia

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Os portugueses podem esperar um corte no valor das pensões, o aumento do IRS sobre os reformados, mas não é certo que haja liberalização dos despedimentos. Essa é uma das matérias que diferencia o ideário socialista da ânsia liberal do PSD, diz Augusto Santos Silva que, embora não garanta taxativamente que a "troika" não possa impor a medida, diz que a Constituição é para cumprir. O coordenador do programa eleitoral do PS reafirma a disponibilidade para promover um governo alargado, mesmo que seja só com o CDS-PP.

Com Portugal cativo pelas condições que vão ser impostas pela "troika", o que é que um futuro governo do PS terá de socialista?
Tem que ter uma agenda própria com valores da esquerda democrática. O que nas condições actuais significa resolver o problema da dívida e do défice, ter uma agenda para o crescimento económico - porque só ele gera emprego - e ter uma agenda de defesa do Estado Social.

Na redução da dívida e défice, muito do ideário de esquerda pode ficar pelo caminho.
Não. Elas colocam restrições adicionais, mas há opções políticas a fazer - embora essas políticas estejam agora muito mais condicionadas porque o País tinha uma solução que dispensava o recurso à ajuda externa e que a oposição rejeitou.

Que tipo de escolhas há a fazer?
Por exemplo há uma agenda na qual o PS não se revê, que pretende usar o FMI como pretexto para impor em Portugal uma agenda neoliberal, com a liberalização do despedimento individual, redução muito forte dos direitos dos empregados com a ideia absurda dos contratos a prazo meramente verbais .

Se a "troika" impuser a liberalização dos despedimentos, com alteração do conceito de justa causa, o PS recusará?
A "troika" não pode impor, por exemplo, medidas que seriam ilegais porque violariam a Constituição. Há uma negociação em curso - não se trata de uma imposição unilateral -, vamos ver as condições em que ela pode ser concluída.

Com um programa externo que tem de ser cumprido, no que é que uma governação PS se distinguirá do PSD?
Há perguntas óbvias que são colocadas e para as quais os dois partidos têm respostas antagónicas. O PSD quer a privatização da CGD, não quer a manutenção das garantias constitucionais em matéria de proibição de despedimentos por justa causa, quer um sistema misto na Segurança Social, não quer avaliação nas escolas e quer entregar educação aos privados, não quer uma saúde pública e gratuita. É ouvir o "Mais Sociedade" e o vice do PSD, Diogo Leite Campos.

Acha que o "Mais Sociedade" e o PSD são mais neoliberais do que o FMI, o BCE e a CE?
Não acho que o FMI seja neoliberal. É uma instituição que tem tido uma evolução, por alguma razão o presidente é um socialista francês. A Comissão Europeia não tem ideologia como tal e o BCE tem uma agenda demasiado monetarista. Mas as instituições europeias não estão a pedir a Portugal que mude a sua Constituição, quem o quer fazer é o PSD.

O PSD tem de ficar na fotografia do memorando de entendimento para o pedido de ajuda?
A experiência em matéria de fotografias tem sido um pouco excêntrica. Não consigo compreender como é que um partido se recusa a uma fotografia oficial e depois faz circular uma fotografia de telemóvel numa casa particular. Mas nem creio que as instituições precisem de uma fotografia. Precisam é de garantias de que aquilo que o governo negoceia com eles tenha o apoio das forças políticas que em Junho possam estar no governo: PS, PSD e CDS.

Um acordo tácito é suficiente ou é preciso um apoio expresso?
O PS assumirá integralmente as responsabilidades decorrentes da celebração desse acordo. Se outros partidos querem fingir, ficar numa posição de nem ser nem deixar de ser, de brincar a "hamlets" neste domínio, isso só revelaria que não teriam aprendido o valor da responsabilidade política e institucional.

Disse há pouco que quiseram evitar um pedido de ajuda com a apresentação do chamado PEC IV...
... E o objectivo foi conseguido no quadro europeu. A declaração conjunta do BCE e CE diz "conhecemos, apoiamos e acolhemos" as medidas propostas pelo Governo português.

Mas essa declaração não diz que Portugal não precisaria de pedir ajuda financeira no futuro.
Desculpe, mas essa declaração faz toda a diferença. Significaria que o Ecofin e a União Europeia convalidariam as medidas de austeridade e traçariam uma fronteira na qual Portugal ficaria do lado de dentro do conjunto de países que não precisariam de recorrer à ajuda externa.

É ou não verdade que o ministro das Finanças já alertava para a necessidade de accionarmos a ajuda desde 2010?
Não tenho esse conhecimento. O que sei é o que decidiu. E o Governo decidiu, sempre aliás com a participação, sob proposta do ministro das Finanças. Foi justamente fazer o que era preciso e possível e útil fazer para evitar ajuda externa.

Mas há uma altura a partir da qual evitar a ajuda se torna mais oneroso.
Não, não, o que foi ruinoso para o País foi a votação parlamentar de 23 de Março, porque nos 15 dias seguintes os juros da dívida pública dispararam (e esse movimento ainda não parou), e nos dias seguintes as agências baixaram os "ratings" da República, das empresas públicas e dos bancos, dizendo expressamente que isso se devia ao novo risco político.

O PS apresentou à oposição um PEC que já sabia que estava desactualizado.
Não.

Não sabiam na altura que o Eurostat ia obrigar à inclusão das imparidades do BPN e das empresas de transportes?
Contesto tecnicamente o que diz. Os novos cálculos, que em função das alterações metodológicas foram acrescentados em 2010, não têm qualquer impacto para o défice orçamental de 2011 em diante. Estou a citar a CE.

Não é líquido no caso das empresas de transportes, o que implica medidas adicionais.
Não, o ponto é justamente esse. A redução prevista em 2011 e na actualização do PEC para 2012 e 2013 são independentes da revisão feita em 2010.
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