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Fitch vê incertezas na continuidade do Ruanda em Cabo Delgado
O financiamento da UE para a presença da força ruandesa em território moçambicano pode ser afetado por controvérsias políticas", lê-se numa análise da Fitch Ratings,
A agência de notação financeira Fitch vê "incertezas" na continuidade do apoio do Ruanda no combate aos grupos terroristas em Cabo Delgado, devido às "controvérsias políticas" com a União Europeia (UE), que financia o contingente ruandês em Moçambique.
"A nossa suposição de que uma força ruandesa, em vigor desde 2021, continuará a dar suporte à segurança na área ao redor do desenvolvimento está sujeita a incertezas. O financiamento da UE para a presença da força pode ser afetado por controvérsias políticas", lê-se numa análise da Fitch Ratings, consultada hoje pela Lusa.
Como exemplo, a agência de notação recorda que a UE impôs este mês "restrições a alguns membros da Força de Defesa de Ruanda" pelo "suposto envolvimento no conflito armado na República Democrática do Congo" (RDCongo).
Sublinha igualmente os riscos e ameaças que ainda permanecem em torno da segurança e instabilidade que condicionam a retoma do megaprojeto de Gás Natural Liquefeito (GNL) da TotalEnergies em Cabo Delgado, suspenso há quatro anos devido aos ataques terroristas.
Uma força de mais de dois mil militares do Ruanda combate desde 2021 os grupos terroristas que operam na província de Cabo Delgado, protegendo nomeadamente a área em que a francesa TotalEnergies tem esse empreendimento para explorar GNL, após acordo entre os dois governos.
Esta força começou a ser reforçada em abril de 2024, na sequência da saída progressiva da missão militar dos países da África austral.
O Conselho da União Europeia (UE) aprovou, em novembro, um apoio adicional de 20 milhões de euros para as forças do Ruanda no combate ao terrorismo em Cabo Delgado, considerando que este destacamento "tem sido fundamental".
A medida, um "complemento" à assistência existente ao abrigo do Mecanismo Europeu de Apoio à Paz, visa "continuar a apoiar o destacamento da Força de Defesa do Ruanda na província moçambicana de Cabo Delgado", indicou na altura um comunicado da estrutura que junta os Estados-membros da UE.
O Conselho referiu que este apoio permitiria a aquisição de equipamento pessoal e cobriria os custos relacionados com o transporte aéreo estratégico necessário para apoiar o destacamento ruandês em Cabo Delgado.
A União Europeia adotou em 17 de março sanções contra uma refinaria sediada em Kigali e nove pessoas ligadas às recentes ofensivas do grupo rebelde M23 no leste da RDCongo.
A lista adotada pelo Conselho da UE, que visa líderes do movimento M23 e das forças revolucionárias congolesas ligadas ao Ruanda, tem ainda como objetivo evitar que as receitas provenientes da extração e do tráfico ilegais de recursos naturais do leste da RDCongo sejam usadas para financiar a escalada do conflito.
O grupo rebelde Movimento 23 de março (M23) tem avançado no território democrático-congolês desde janeiro, altura em que tomou Goma, capital da província de Kivu Norte.
Em Cabo Delgado, o destacamento do Ruanda teve início em julho de 2021, a pedido das autoridades moçambicanas, para apoiar a luta contra o terrorismo em Cabo Delgado e, de acordo com o Alto Representante da UE para os Negócios Estrangeiros e Política de Segurança, "tem sido fundamental para fazer progressos".
A verba adicional aprovada no ano passado complementa a medida de assistência paralela, no valor de 89 milhões de euros, às Forças Armadas moçambicanas anteriormente formadas pela Missão de Formação da UE Moçambique.
O Mecanismo Europeu de Apoio à Paz foi criado em março de 2021 para financiar ações externas da UE com implicações militares ou de defesa, visando prevenir conflitos, preservar a paz e reforçar a segurança e a estabilidade internacionais.
Desde outubro de 2017, Cabo Delgado, rica em gás, enfrenta uma rebelião armada, que provocou milhares de mortos e uma crise humanitária, com mais de um milhão de pessoas deslocadas.
Só em 2024, pelo menos 349 pessoas morreram em ataques de grupos extremistas islâmicos na província, um aumento de 36% face ao ano anterior, segundo dados divulgados recentemente pelo Centro de Estudos Estratégicos de África, uma instituição académica do Departamento de Defesa do Governo norte-americano que analisa conflitos em África.