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Empresas sensíveis a riscos em África e cada vez mais exigentes com advogados
As sociedades de advogados são sujeitas a um escrutínio e exigências crescentes por parte das empresas internacionais com atividade em África para minimizar os riscos reputacionais e envolvimento em ilegalidades, disse à Lusa o consultor português Rui Amendoeira.
"Hoje em dia o nível de 'compliance' [regras de conformidade] e exigências que são feitas pelos clientes, sobretudo nestas jurisdições [África] são brutais", comenta Rui Amendoeira, consultor da Vieira de Almeida (VdA), um escritório que, além de Portugal, está presente na África lusófona e em países da África francófona como os Camarões, Chade, Congo, República Democrática do Congo e Gabão.
"Noto uma diferença enorme nos últimos anos", acrescenta, em entrevista à Lusa, o advogado especializado na área petrolífera ('oil&gas') que lida com questões jurídicas e regulatórias desta indústria em diversas regiões de África.
Rui Amendoeira ressalva, no entanto, que as "questões relacionadas com corrupção ou tráfico de influências acabam por ter um impacto e relevância pequeníssima" na atividade da maioria das sociedades.
No caso da VdA, que tem como clientes grandes empresas internacionais, "o trabalho acaba por não ser muito diferente em Portugal ou em África", destaca o advogado, admitindo, todavia, que escritórios que assessorem clientes individuais ou empresas locais ou de reputação duvidosa "tenham de ter preocupações acrescidas quanto a estas matérias, nomeadamente identificar a proveniência dos fundos".
Porque "um azar em África pode ser fatal para uma empresa", os clientes procuram cada vez mais salvaguardar-se e as equipas de advogados ocupam boa parte do trabalho inicial com tarefas administrativas e burocráticas que demonstrem o cumprimento das regras e compliance e que não apresentam riscos para os clientes.
"Temos de cumprir regras éticas. Os clientes precisam de nós para cumprir as leis locais e assegurar que estão a atuar nestes países em conformidade com a legislação aplicável", complementa o sócio francês da VdA Matthieu Le Roux, que integra o escritório desde 2015.
O mesmo acontece em sentido inverso, já que os advogados sentem também necessidade de obter informações sobre os clientes.
"São exigências da nossa profissão. Quando aceito um cliente tenho de me certificar de que não nos vai criar um problema legal ou reputacional e isso aplica-se independentemente da sua origem. Tendo em conta o nosso perfil de clientes esse risco está muito mitigado à partida", diz o responsável da VdA, acrescentando que a firma já rejeitou clientes.
O posicionamento de clientes e firmas no mercado é o ponto de partida para uma seleção pré-seleção.
"Um cliente individual ou uma pequena empresa que faz intermediação e que queira fazer um negócio qualquer escuro num país africano não vem bater à porta da VdA. Da mesma forma os grandes clientes internacionais também só trabalham com determinado tipo de escritórios porque também querem ter garantias, querem sociedades com uma determinada estrutura, dimensão e reputação", exemplifica Rui Amendoeira.
A VdA presta serviços de assessoria jurídica e consultoria a empresas internacionais da área de energia, financeira e engenharia, construção e infraestruturas, uma "opção estratégica" assumida desde o início, e conta atualmente com uma equipa de 280 advogados que trabalham de forma integrada.
"Os nossos clientes não estão só num país, por isso faz sentido ter equipas de advogados de língua portuguesa e francesa e outros parceiros locais para trabalhar nestas jurisdições", considera Mathieu Le Roux.
O advogado afirmou que, além da África lusófona "há muitas oportunidades" para as empresas portuguesas nas geografias francófonas, apontando os setores das infraestruturas, novas tecnologias, agricultura como os de maior "potencial de crescimento" e distinguindo o Senegal entre os países mais "interessantes".
Também Rui Amendoeira tem uma perspetiva otimista relativamente a África e aos seus recursos, lembrando que em áreas como a da energia tudo acontece em prazos muito longos e pouco dependentes de ciclos políticos ou de situações conjunturais como a descida dos preços do petróleo.
Em Angola, o país que conhece melhor, antevê ainda um ano difícil em 2019, devido à queda dos preços, mas elogiou os esforços de diversificação da economia que "estão a dar resultados" a vários níveis, nomeadamente a produção alimentar. No entanto, estes setores nunca irão alcançar a "escala única" do dinamismo económico ligado ao petróleo, sublinhou.