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Cirurgião plástico a quem o Fisco tem exigido IVA diz-se alvo de "acto persecutório"

O médico de cirurgia plástica Edgardo Malheiro, a quem o Fisco exigiu IVA relativamente aos anos de 2009 a 2013 por actos médicos que estão isentos deste imposto, considera que está a ser alvo de um "ato persecutório".

Fisco considera todos os actos médicos isentos de IVA mas exige imposto a alguns. Ricardo Castelo/Negócios
16 de Dezembro de 2017 às 12:08
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O código do Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) tem uma norma que isenta de tributação "as prestações de serviços efectuadas no exercício das profissões de médico, odontologista, parteiro, enfermeiro e outras profissões paramédicas", bem como "as prestações de serviços médicos e sanitários e as operações com elas estreitamente conexas efectuadas por estabelecimentos hospitalares, clínicas, dispensários e similares".

 

O âmbito e a abrangência desta isenção em sede de IVA tem vindo a ser questionada por vários contribuintes, o que tem levado a Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) a emitir instruções vinculativas.

 

Nestas instruções, o Fisco tem esclarecido que beneficiam da isenção as prestações de saúde humana executadas por um profissional legalmente habilitado para o efeito, por exemplo, no âmbito da cirurgia geral, ortopedia, medicina dentária e enfermagem, mas também nas actividades paramédicas (como a terapia da fala, a dietética e a fisioterapia, entre outras).

 

De fora da isenção ficam, por exemplo, as terapêuticas não convencionais, como a acupunctura e fito terapia.

 

No entanto, segundo a fiscalista Adriana Monteiro, que estudou o tratamento fiscal dos actos médicos em sede de IVA numa tese de mestrado na Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, "desde 2010" que o Fisco tem inspeccionado médicos na área da medicina estética e da cirurgia plástica relativamente ao pagamento de IVA.

 

Em declarações à Lusa, a advogada disse que, de todos os clínicos inspeccionados, a AT decidiu cobrar IVA "apenas a dois": um cirurgião plástico relativamente à facturação de 2008, 2009, 2010, 2011, 2012, 2013 e um médico estético que está a ser inspeccionado em 2017.

 

A Lusa teve acesso ao relatório de inspecção tributária feito pela AT a um destes casos, a Uniplástica, uma clínica de cirurgia plástica, reconstrutiva e estética em Vila Nova de Famalicão, considerando que a sua actividade "abrange em exclusivo a cirurgia estética e não a cirurgia reconstrutiva".

 

No documento, o Fisco afirma que "as prestações de serviços que não tenham objectivo terapêutico (diagnosticar, tratar e, na medida do possível, curar as doenças ou anomalias de saúde) estão excluídas" das isenções de IVA e que "os serviços ligados à estética" estão sujeitos a tributação, à taxa normal de 23%.

 

Contactado pela Lusa, o médico Edgardo Malheiro, que também é sócio-gerente desta clínica, diz que tem "vários colegas que foram fiscalizados" e que "a mais nenhum foi colocado o problema de pagamento de IVA", o que o levou a contactar "várias vezes" a AT para saber as razões do que considera ser um "ato persecutório".

 

A resposta que obteve da administração fiscal foi que "teria de pagar IVA", pelo que a sua opção foi recorrer ao tribunal e, para não pagar de imediato o IVA pedido pela AT (mais de 300 mil euros relativamente à facturação de 2008, 2009 e 2010), deu como garantia as instalações da Uniplástica.

 

Em declarações à Lusa, Edgardo Malheiro conta ainda que "em 2013 houve julgamento no Tribunal Fiscal de Braga", no qual "não compareceu ninguém a defender a posição da AT" e que a sentença, emitida em 2015, foi em seu favor.

 

No entanto, nesse ano de 2015 foi inspeccionada a actividade de 2011. Este processo está ainda a decorrer e, como foi instaurado num momento em que a decisão do anterior não era ainda conhecida, o médico deu como garantia "os carros da clínica, as garagens e mesmo o apartamento" onde vive.

 

No ano passado, foi exigido o IVA relativo à actividade de 2012, num processo que também está por se decidir, sendo que, neste caso, Edgardo Malheiro deu novamente como garantia as instalações da clínica, uma vez que o primeiro processo já tinha sido decidido.

 

Este ano foi aberto um novo processo para exigir IVA de 2013, mas "a AT mudou a forma de actuar". Segundo o médico, o Fisco restringiu a tributação aos actos praticados na sua clínica, "deixando de fora todos os actos realizados [por si] noutros hospitais ou clínicas".

 

O Fisco pediu ao médico para indicar quais os actos de foro estético praticados na Uniplástica, um pedido a que Edgardo Malheiro não acedeu invocando o sigilo médico a que está obrigado. A Ordem dos Médicos emitiu um parecer sobre esta questão em que "deu total razão" ao cirurgião.

 

Malheiro alerta para que "cada vez mais as especialidades se focam em cirurgia estética" e dá exemplos: "os otorrinos a realizarem rinoplastias estéticas", "dermatologistas a retirarem manchas melânicas e rosáceas", "urologistas a colocarem próteses testiculares" e "ginecologistas a tratarem esteticamente os órgãos genitais femininos", entre outros.

 

Isto quer dizer que há médicos de outras especialidades que não a cirurgia plástica ou estética que estão a realizar intervenções de mero embelezamento do corpo, mas que, por se tratar de actos realizados por médicos, não pagam IVA.

 

Edgardo Malheiro quer que se clarifique a aplicação daquela isenção e que ela seja aplicada de igual forma a todas as especialidades da medicina: "Pretendo que haja uma lei (...) em que defina se o ato médico é ou não isento de IVA. E, se não for [isento, que se determine] que tipos de actos médicos estarão sujeitos a este imposto", afirmou o médico, pedindo que a lei seja "aplicada uniformemente a todos os médicos, de todas as especialidades".

 

Contactado pela Lusa sobre esta matéria, o Ministério das Finanças não prestou, até ao momento, quaisquer esclarecimentos.

 

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