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Cientista Isabel Gordo: “Este é um vírus novo, temos de direcionar todo o conhecimento para o debelar”

Com a pandemia declarada, as instituições científicas redirecionaram a investigação para a combater. Foi o que fez o Instituto Gulbenkian de Ciência (IGC). A sua equipa sequenciou três genomas (informação genética) do coronavírus da covid-19. “Todos os investigadores estão concentrados nesta urgência”, explica a investigadora Isabel Gordo, que lidera o laboratório de Biologia Evolutiva do IGC.

Isabel Gordo lidera o laboratório de Biologia Evolutiva do Instituto Gulbenkian de Ciência Miguel Baltazar
13 de Abril de 2020 às 16:11
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Com a pandemia declarada, várias instituições científicas redirecionaram a investigação para a combater. Foi o que fez o Instituto Gulbenkian de Ciência (IGC). A sua equipa sequenciou três genomas (informação genética) do coronavírus da covid-19 e, nos próximos três meses, serão sequenciados cerca de 2.000 genomas do SARS-CoV-2. "Com essa informação, conseguimos conhecer o vírus e as suas possíveis mutações, informação determinante para definir estratégias de contenção, tratamento e prevenção", explica a investigadora Isabel Gordo, que lidera o laboratório de Biologia Evolutiva do IGC. Em entrevista (por escrito) ao Negócios, a cientista sublinha: "Todos os investigadores estão concentrados nesta urgência".

 

Quantos investigadores do IGC estão envolvidos na sequenciação dos genomas? Trabalham em parceria com outros institutos, portugueses e internacionais?

Com a pandemia decretada, o Instituto Gulbenkian de Ciência rapidamente redirecionou as suas áreas de investigação e otimizou as plataformas tecnológicas de última geração que detém para fazer parte da resposta ao novo vírus. A Fundação Calouste Gulbenkian criou um fundo de emergência de 5 milhões de euros, onde a ciência ocupa um lugar de destaque. Temos cerca de 100 investigadores envolvidos na "task force" que criámos para responder a esta crise. Estes profissionais estão envolvidos em diagnóstico (estão a integrar equipas dos laboratórios de hospitais para aumentar a capacidade de resposta) e em investigação, onde se enquadra a sequenciação do vírus. A equipa de genómica processa os genomas dos vírus (de casos positivos que recebemos de hospitais) e, com essa informação, conseguimos conhecer o vírus e as suas possíveis mutações, informação determinante para definir estratégias de contenção, tratamento e prevenção.

 

Sequenciaram três genomas (informação genética) do coronavírus da covid-19 e nos próximos três meses serão sequenciados cerca de 2.000 genomas do SARS-CoV-2. O que é que, em termos práticos, isso vai possibilitar?

Os genomas sequenciados até agora no IGC pertencem aos "clusters" A1a e A2a, do conjunto de 10 atualmente identificados em todo o mundo. A sequenciação fornece informação sobre as possíveis cadeias de transmissão, o que nos permite fazer o "tracking" da cadeia de propagação do vírus. Em termos práticos, com esta informação, podemos avaliar como o vírus se vai geneticamente alterando, à medida que se propaga pela população e geograficamente. Esta informação é crucial para definir estratégias para o conter e para futuros tratamentos da doença que provoca.

 

Os três primeiros genomas do SARS-Cov-2 em circulação em Portugal têm sido comparados com outros genomas do coronavírus. O comportamento é semelhante?

Os dados obtidos são depositados em plataformas de acesso aberto, para que toda a comunidade científica partilhe esta informação. O que já sabemos é que a taxa estimada a que o vírus adquire mutações é, atualmente, de cerca 26 mutações por ano e, até à data, não há nenhuma indicação de que os genomas dos vírus em Portugal sigam um padrão diferente do observado no resto do mundo. Aliás, a acumulação de mutações no tempo é o esperado numa situação em que um novo vírus se espalha numa população de hospedeiros suscetíveis.

 

Posteriormente, usando ratinhos como modelo, vão estudar como é que o SARS-Cov-2 se comporta num organismo vivo e analisar a resposta do sistema imunitário, que é ainda uma incógnita. Ou seja, ainda se sabe muito pouco sobre este vírus…

Este é um vírus novo. Na verdade, surgiu há três meses e temos de direcionar todo o nosso conhecimento científico e as plataformas tecnológicas de que dispomos para o conhecer e debelar. Existem várias linhas de investigação a decorrer no IGC: uma delas pretende perceber de que forma o ser humano reage a este vírus - em algumas pessoas é mais crítico e noutras não -, que fatores genéticos estão na base desta diferença. Por outro lado, outros investigadores querem aprofundar a biologia do vírus a um nível mais básico, usando células que ele infecta, de modo a ajudar a perceber como é que o nosso organismo pode tolerar este vírus.

 

O IGC vai colaborar na produção de uma vacina ou no tratamento da doença?

Toda a informação que é apurada, especialmente a que resulta da ciência fundamental, é crucial para encontrar uma forma de tratamento desta doença. Todos os investigadores estão concentrados nesta urgência, e os investigadores do IGC não são exceção, mobilizaram-se rapidamente para encontrar soluções e fazerem parte da resposta à pandemia: a doar material, a desenvolver novos equipamentos ou a apoiar no diagnostico. Sabemos que as respostas são para dar com a maior urgência, mas tem de se garantir a eficácia e a segurança.

 

Estes são tempos desafiantes para um cientista?

São tempos em que todos somos postos à prova e em que o sentido de dever e de envolvimento é exaltado. As crises, muitas vezes, ajudam as instituições a reorganizar-se, e isso torna-as mais fortes e unidas.

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