Os militares do MFA que chegaram ao Rádio Clube Português, quando pouco passava das 03h da manhã de 25 de abril de 1974, tiveram de arrombar o armário onde estavam guardados os discos proibidos pela censura. Só assim, recorda António Costa Santos no livro "Antes do 25 de Abril era Proibido" (editado pela Guerra & Paz), foi possível pôr no ar "a banda sonora" da revolução. Mas não era apenas a música, a literatura, a imprensa ou o cinema a ser alvo de proibições. Dos costumes ao modo como se cumpria a lida da casa, passando pelo amor ou pelos pequenos vícios, tudo era regulamentado pelo Estado, que contava com a vigilância dos cidadãos para manter a ordem vigente.
"O clima era de proibição generalizada, incluindo coisas que não eram proibidas mas era como se fossem", recorda, ao Negócios, António Costa Santos, na época com 16 anos. Enquanto adolescente politizado, António sentia a opressão no dia a dia. No verão de 1973 tinha sido surpreendido pela GNR quando dava um beijo à namorada. "Fui parar ao posto e raparam-me o cabelo. A partir desse momento, já estava tudo perdido e não me importava de provocar a GNR com os beijos", conta o jornalista, que "visitou" o posto da GNR outras 12 vezes nesse verão.
O namoro e, mais do que isso, as demonstrações públicas de afeto eram regulados ao ponto de apenas escaparem de punição com coima castos beijos na testa e passeios de mãos dadas. Um beijo na boca entre um par heterossexual implicava identificação pelas autoridades, coima de 57 escudos e cabelo rapado (no caso do homem). Já a homossexualidade era proibida e criminalizada, podendo conduzir os "infratores" à prisão.
"Não se podia fazer nada de agradável: para se poder andar de bicicleta, era preciso licença, que tinha de ser paga. E se se andasse – e eu andava – sem licença, estava-se sujeito…", continua António Costa Santos, que lembra que a autoridade não era exercida apenas pelas forças da ordem. "Havia um jardineiro no Jardim do Campo Grande que nos podia chatear", conta.