A descarbonização do setor dos transportes, responsável por cerca de 30% das emissões de CO2, é absolutamente necessária para que Portugal consiga cumprir os objetivos de redução de emissões. "Foi neste contexto que Portugal se comprometeu a duplicar a quota do transporte ferroviário de mercadorias até 2030 e a realizar 50% do transporte de mercadorias por via ferroviária em 2050", nota Miguel Rebelo de Sousa, diretor-executivo da Associação Portuguesa das Empresas Ferroviárias (APEF).
Para o diretor desta associação, que reúne os operadores e empresas ferroviárias, com o objetivo de garantir o aumento da competitividade do transporte ferroviário, "assim como foi necessário investir na transição energética, e hoje temos a grande maioria da nossa produção energética com base em fontes de energia renovável, também se tem de criar medidas de incentivo à transição modal para a ferrovia, garantindo que ela seja mais competitiva e atrativa". De facto, "apenas 0,4 % das emissões de gases com efeito de estufa dos transportes da UE resultam do transporte ferroviário, o que faz dele um meio de transporte respeitador do ambiente", pode ler-se numa nota recente do Conselho Europeu.
Transporte rodoviário domina
Atualmente, e segundo dados da Agência Portuguesa do Ambiente, "a repartição modal do transporte de mercadorias em Portugal é dominada pelo transporte rodoviário, que, em 2021, representou 89,3%, mais 11,9 pontos percentuais do que o registado na UE-27". Neste contexto, segundo a mesma fonte, "em 2021, o modo ferroviário assegurou 17,0% do transporte de mercadorias na UE-27, enquanto em Portugal se situou nos 10,7%, registando-se uma diminuição de 3,5%. relativamente a 2020".
Por isso, para Miguel Rebelo de Sousa, o setor dos transportes e da logística terá, necessariamente, de "ser mais multimodal para poder ser mais sustentável". Refira-se que apenas 1,9 % do consumo de energia no setor dos transportes na UE pode ser atribuído ao transporte ferroviário, segundo dados divulgados pelo Conselho Europeu. No entanto, e segundo este responsável, "o maior de todos os desafios é garantir que as medidas públicas que são implementadas estão alinhadas com os objetivos do Estado Português, nomeadamente no que toca à transição modal e à descarbonização dos transportes". Isso requer que "o Estado garanta igualdade de tratamento aos diversos modos de transporte", diz. O que, segundo o representante dos operadores ferroviários, não está a acontecer: "Não se pode abolir portagens à rodovia e, ao mesmo tempo, aumentar em 23% as portagens à ferrovia, apresentar novo aumento de 8% para 2025 e esperar que o peso da ferrovia aumente. Isso não vai acontecer."
Desigualdade ferroviária
Desta forma, as preocupações do setor centram-se "nos custos operacionais, nas múltiplas taxas que oneram a operação ferroviária face à rodoviária e nas imposições legais que limitam e condicionam a capacidade para sermos mais eficientes e sustentáveis", enumera Miguel Rebelo de Sousa. Assim, a APEF tem como prioridade contribuir para garantir que "o poder político tenha uma visão integrada dos transportes, tratando de igual forma todos os modos de transporte". Para o diretor da associação, a ferrovia, para ser mais competitiva, tem de ser "abrangida por uma política de incentivos e condições que lhe permitam contribuir para a redução da pegada carbónica dos transportes".
Tecnologia inevitável
Neste contexto de aumento da competitividade, a transformação tecnológica do transporte ferroviário, não é um desafio, é uma inevitabilidade. "Temos de integrar esta revolução tecnológica nos nossos negócios, digitalizando as nossas operações, adotando as melhores práticas tecnológicas para podermos ser mais eficientes, mais efetivos na nossa relação com os clientes e para podermos acrescentar valor", explica Miguel Rebelo de Sousa. Porém, avisa o responsável da APEF, "é preciso ter consciência de que não é possível investir em tecnologia quando ainda se tem o básico por resolver na ferrovia".
Atualmente, a ferrovia, como os outros modos de transporte, enfrenta o desafio de responder às mudanças em curso nas cadeias de abastecimento. Para Miguel Rebelo de Sousa, a resposta está na atualização permanente: "Temos de investir na prestação de um serviço que seja cada vez mais eficiente e que responda cada vez melhor e isso significa uma visão cada vez mais multimodal e interoperável." Segundo este responsável, o mercado pede que os operadores garantam fiabilidade, segurança, sustentabilidade e preço. "E isso é um desafio complexo com que nos defrontamos diariamente", conclui.