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Tintos adultos

Foz Torto é, a bem dizer, um projecto que nasceu ontem, mas os seus vinhos estão cada vez mais adultos. O tempo faz destas coisas.

17 de Dezembro de 2016 às 16:00
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A companhar o processo de crescimento de um produtor - de vinhos, de queijos, de azeite ou de fruta em geral - é um exercício que nos obriga a reconhecer que a humildade é boa conselheira. Sempre. Peguemos no caso do vinho. Como seguimos há muitos anos o sector, sempre que surge um novo viticultor sacamos da nossa experiência para esmiuçar pequenos erros ou as falhas típicas dos iniciados. Em certo sentido, isso até é desejável porque, caso contrário, um crítico não teria razão de ser. O problema é que, por vezes, precipitamo-nos.

Quando Abílio Tavares da Silva lançou, há seis anos, os seus primeiros vinhos do Douro, a nossa prova detectava algum excesso de madeira de barrica nova. Notava-se cuidado na selecção das uvas e no trabalho de adega e não havia excessos de extracção ou de álcool, mas os aromas de carvalho novo eram sempre impositivos, coisa que, de resto, era moda.

Sucede que, num almoço há dois anos, a prova dos tais primeiros vinhos do produtor revelou algum mistério e nobreza, em particular no caso dos vinhos brancos. As tais notas de barrica que outrora pareciam excessivas desapareceram e deram lugar a notas minerais e folhas e ervas secas, com a boca a registar profundidade e boa acidez. Se soubesse o que sei hoje, se não tivesse sido tonto e precipitado, teria comprado uma caixa do Foz Torto Reserva Branco de 2011. E agora estaria a regalar-me a mostrar aos amigos um branco de grande nível.

Mesmo nos tintos as coisas têm mudado. E de que maneira. Em particular nos vinhos de gama de entrada, coisa que agradecemos quando está em causa a relação qualidade preço.

E tudo isso porquê? Porque, em primeiro lugar, Abílio Tavares da Silva e a sua enóloga Sandra Tavares da Silva (não, não são parentes) conhecem melhor as vinhas da Quinta de Foz Torto e, segundo, porque as tais barricas novas dos tempos iniciais já não transmitem as notas intensas de carvalho. Fazem agora a sua função primordial: domar os taninos do vinho, tornando-o mais redondo.

Daí que os dois novos tintos Foz Torto de 2014 revelem uma pureza expressiva, assentes mais na matéria-prima do que no trabalho de adega. O Foz Torto Colheita exibe uma fruta muito pura, com laivos vegetais, que nos remete para o cheiro de uma adega em tempo de vindima. A boca acentuará esse carácter frutado e vegetal, bem como frescura a rodos. Por €12, eis um tinto do Douro com capacidade de se bater com uma família alargada de pratos da cozinha tradicional portuguesa.

O Foz Torto Vinha Velhas (€30) é naturalmente mais sério. Embora menos expressivo no nariz do que o seu primo Colheita, vem com aquele nível de profundidade que nos remete para vinhos que evoluem bem com o tempo. Há aqui maior volume de boca, taninos domados e gulosos, mas sem perder de vista a frescura.

Num e noutro vinho, o papel das barricas é reduzido ao mínimo. O Colheita só passa por barricas usadas e o Vinhas Velhas estagia maioritariamente em cascos também usados (70 %).

Esta procura por maior genuinidade também se deve à personalidade de Abílio Tavares da Silva, que, viticultura à parte, coloca sempre em primeiro lugar o conceito de terroir. É evidente que quer retirar lucro do seu trabalho, mas não o faz a qualquer preço. A vinha deve conviver com as oliveiras, com outras árvores de fruto, com uma horta de fazer inveja aos seus amigos e cuja fama chega longe, com a paisagem deslumbrante e com o conhecimento histórico sustentando em comportamentos empíricos. Abílio é um romântico esclarecido e contagiante. Os seus vinhos, mais afinados, começam a testemunhar essa maneira de ser. Devemos comprá-los para algum descanso merecido na garrafeira. Brancos e tintos.



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