Notícia
O tempo certo para o material reagir
Sair da cidade, encontrar locais onde a arte floresce com os bons ares do campo. O festival Materiais Diversos, que se desenvolve entre o Cartaxo e Alcanena, aposta mais na criação, envolvendo a comunidade e devolvendo-lhe o empenho em forma de espectáculos.
Tempo para pensar, tempo para criar. O Materiais Diversos está diferente e passa agora a realizar-se de dois em dois anos. "Um festival anual obrigava a um ritmo de decisões mais acelerado", conta a directora Elisabete Paiva.
O novo ritmo não implica que o festival esteja parado. Antes pelo contrário: a aposta está agora na produção e na co-produção. E como é que isso se reflecte? Mais oficinas, momentos de formação, ensaios abertos e residências artísticas no Cartaxo e em Alcanena, os quartéis-generais do festival criado em 2009. "Praticamente todos os meses temos residências", remata a responsável.
As trocas entre artistas e a comunidade resultam em materiais de pesquisa mais diversos. "A grande tónica é sobre passar mais tempo no território", resume Elisabete Paiva. Seja com crianças, com professores, colectividades ou outros públicos específicos. O que agora se oferece é tempo para descobrir o outro e apurar o trabalho.
Um tempo que as grandes cidades, onde também já escasseiam os espaços de ensaio, não permitem. Por isso, o Materiais Diversos tem no Centro Cultural do Cartaxo e no Cine-teatro São Pedro em Alcanena dois espaços para testar hipóteses e apresentar resultados em primeira mão. "As antestreias são uma forma de o artista devolver algo ao local", lembra Elisabete Paiva.
O novo modelo do festival, mais focado no processo de criação, arrancou em Março. Ao longo dos próximos meses, alguns desses resultados vão dar-se a ver. Depois, têm presença marcada também na décima edição do festival, em Setembro e Outubro do próximo ano, num momento de programação mais regular, como o Materiais Diversos tinha habituado o público até agora.
Uma dessas propostas é "Viagem a Portugal" do Teatro do Vestido, de Joana Craveiro, que procura estudar o fenómeno da mobilidade social em diferentes gerações, bem como o seu impacto nas realidades da cidade e do campo em Portugal nos nossos dias. Só chega daqui a um ano, mas a pesquisa já está a ser feita no terreno. O mesmo se dá com "A Menor Língua do Mundo" de Alex Cassal e Paula Diogo, que estarão em residência artística na freguesia de Minde em 2019, antes de estrearem no Festival. Os artistas estão em contacto com as comunidades falantes de minderico, mirandês e barranquenho, variantes linguísticas portuguesas em vias de extinção. Para compor a lista, há "Swan Fake" de António Torres, onde o artista subverte os elementos da dança clássica para colocar em palco questões contemporâneas como o género ou a dualidade homem-animal: para ver a 26 de Outubro no Centro Cultural do Cartaxo.
Há também muita margem, com este novo modelo, para envolver os mais novos nas lides das artes. "Sublinhar", de Marta Cerqueira, apresenta-se em estreia a 16 de Novembro no Centro Cultural do Cartaxo e procura explorar o potencial do corpo como forma de expressão. É dirigido a crianças do primeiro ciclo, tal como "Mesa", assinado por Catarina Requeijo: este último espectáculo, com estreia em Novembro nas Comédias do Minho, será apresentado em Março do próximo ano em Alcanena e no Cartaxo. As Oficinas de Teatro para a Infância e Juventude do Cartaxo vão ter o privilégio de dar uma espreitadela no ensaio aberto a 17 de Outubro, para perceber como um livro infantil pode inspirar a construção de todo um espectáculo.