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Rui Cordeiro : “Temos cinco diretoras de felicidade”

Diversidade e inclusão, a relação das pessoas e o desenvolvimento pessoal são algumas das funções de quem é responsável pela felicidade na Critical TechWorks, revela Rui Cordeiro.

Helena Garrido | Sérgio Lemos - Fotografia 07 de Fevereiro de 2024 às 12:30
Sérgio Lemos
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    Bilhete de identidade Idade: 51 anosCargo: Critical TechWorks, CEO (desde 2018); Administrador da Critical Holding (desde 2007); Critical Software (1998-2018)Formação: Engenheiro em Ciências da Computação pelo Instituto Superior de Engenharia de Coimbra (ISEC)

    Tinham um problema: iam contratar cerca de 500 pessoas por ano para a empresa que vinham de contextos e culturas diferentes. Tinham de criar uma função que as ligasse, que tivesse nas pessoas a principal preocupação. E avançaram para a contratação de diretoras de felicidade que têm a seu cargo exatamente isso, ligar as pessoas. O presidente executivo da Critical TechWorks é o convidado desta semana de "Conversas com CEO", uma entrevista integrada na iniciativa Negócios Sustentabilidade 20|30 e que pode ser ouvida na íntegra em podcast. A liderar uma empresa que é uma parceria com a BMW, Rui Cordeiro é um defensor do trabalho híbrido e de um modelo horizontal de organização. Entre a direção e o estagiário existe apenas um nível. Durante mais de meia hora falámos do que está a ser desenvolvido para a BMW e das obrigações de reporte de indicadores de sustentabilidade que a empresa quer concluir já este ano.

     

    Está há quase três décadas na área de software. O que o levou para esta área?

    Estou ligado à área do software desde o secundário. Fiz um curso técnico-profissional de informática e continuei no Instituto Superior de Engenharia de Coimbra (ISEC). Fui um ano para Hamburgo, na Alemanha, para a Daimler Benz Aerospace. Trabalhei num projeto bastante interessante, que hoje é o A380. Regressei a Coimbra, já com o curso finalizado, e conheci a Critical Software que estava a nascer, um "spin-off"da Universidade de Coimbra. E juntei-me logo em 1998. Fui o primeiro empregado, para além dos fundadores. Nesses 20 anos fiz todo o percurso na Critical, começando como programador.

     

    E não tem pena de não ter experimentado outra empresa?

    Por acaso experimentei. Entrei na direção da Critical Software em 2005 e passado alguns anos senti que precisava de conhecer outras empresas, saber como funcionavam. Mas não queria sair da Critical. Tirei três meses de sabática para trabalhar noutra empresa. Na altura, os meus colegas não acreditaram… Também porque estava a fazer uma candidatura como estagiário, com 15 anos de experiência e 10 na direção. E também não acreditavam que houvesse alguma empresa disposta a isso. Mas candidatei-me, porque o ‘não’ estava garantido, não tinha nada a perder. Fui três meses para a Volvo Trucks, em Gotemburgo, na Suécia. Foi uma experiência interessante.

     

    A TechWorks expandiu-se para Braga e tem escritórios em Lisboa e no Porto. Nesta área, para que serve um escritório? 

    Depende daquilo que a empresa quer ser. Há empresas que trabalham no modelo remoto e funcionam bem. Há outras que preferem o modelo híbrido, que é o nosso caso. Neste momento, somos cerca de 2.500 pessoas, temos escritórios no Porto, em Lisboa e abrimos em Braga, porque a nossa capacidade estava a ficar limitada. As 500 pessoas que queremos contratar para Braga é até 2027, mas já lá temos cerca de 50.

    O que observámos durante a pandemia [em trabalho remoto] é que as coisas funcionam muito bem no contexto da equipa, mas entre equipas o contacto praticamente desapareceu.

    Mas é necessário haver trabalho presencial, numa área em que é difícil convencer as pessoas a irem ao escritório?

    Nós já não exigíamos que as pessoas estivessem no escritório os cinco dias. A pandemia mostrou que era possível trabalhar na maioria dos casos de forma remota. Um trabalho totalmente remoto não é o ideal e por isso optámos por um modelo híbrido. Pedimos às pessoas para irem, em média, dois dias por semana. Esses dois dias são fundamentais para se conhecerem, para haver interações, para se falar sobre temas que não se discutem quando uma pessoa está remota. O que observámos durante a pandemia é que as coisas funcionam muito bem no contexto da equipa, mas entre equipas o contacto praticamente desapareceu. O híbrido vem trazer esse contacto entre equipas, entre diferentes áreas, entre pessoas de diferentes contextos. E isso é bom, quer para o desenvolvimento individual, quer para a empresa.

     

    Qual é o perfil profissional preponderante que procuram? Engenheiros de software?

    Ainda é esse o perfil, mas não é exclusivo, nem procuramos apenas engenheiros de software. Temos de criar uma empresa com diversidade e por isso vamos buscar pessoas de diferentes contextos e áreas de conhecimento. Temos cerca de 40 pessoas de países diferentes a trabalhar em Portugal. Apoiamos no Porto a Escola 42, uma das melhores do mundo na área de formação de software, e vêm de diferentes áreas. Temos veterinários, enfermeiros, advogados ou médicos que escolheram mudar de profissão.

     

    Os perfis de que precisam são escassos e disputados. Têm tido dificuldades em contratar?

    Difícil era há 30 anos quando queríamos recrutar e não havia ninguém, isso é que era difícil. Tínhamos de ser nós a formar as pessoas, porque não havia um ecossistema em Portugal, estava a nascer. Hoje existe esse ecossistema. 

     

    E os vossos salários são competitivos a nível global?

    Se não fossemos competitivos não era possível contratar 500 pessoas por ano. É lógico que quem quer trabalhar fora consegue salários muito mais elevados. Também fornecemos outras coisas que não se traduzem em salário. Como a forma como estamos organizados e como puxamos pelas pessoas para impactarem a empresa.

     

    Qual é o conteúdo funcional de quem está à frente de uma direção de felicidade como a que têm?

    A diretora de felicidade foi uma das primeiras funções que criámos na empresa, em 2018. Ainda não se falava muito. Sabíamos que íamos crescer muito, 500 pessoas todos os anos. Muitas pessoas novas, de diferentes contextos e culturas. Precisávamos de alguma coisa que nos ligasse, que se preocupasse connosco. E foi aí que, depois de algum "brainstorming", começou a surgir a ideia da função. Para ser honesto, não sabíamos muito bem o que era. Aliás, o nosso processo de recrutamento de diretora de felicidade foi muito curioso. Como não sabíamos muito bem o que era, perguntámos às candidatas o que achavam que em três anos seria a função de diretora de felicidade.

    E foi construído caminhando.

    E foi construído caminhando. Não sabíamos o que era, mas sabíamos o que não era. Não era festas, nem criar eventos. A missão era o desenvolvimento das pessoas, um bocado também o histórico da Critical Software. Hoje temos cinco diretoras de felicidade. Cada uma é responsável por uma área e não existe o conceito de hierarquia, todas estão ao mesmo nível. O trabalho não é gerir pessoas. E duas estão em Lisboa e três no Porto.

     

    E como é possível criar conteúdo para cinco diretores de felicidade?

    Uma está responsável pela diversidade e inclusão. Outra pelo "engagement" e a relação das pessoas com a organização. A outra está focada no desenvolvimento pessoal… Cada uma tem uma área de responsabilidade e todas trabalham em equipa. Partilham o conhecimento que é gerado. Mas isso tem a ver com o nosso modelo. Temos 33 funções e em todas elas não existe hierarquia.

     

    Não há um líder de equipa?

    Não. Se existe, e acredito que nalguns casos exista, acontece de forma natural. Não definimos nenhum líder de equipa e isso tem a ver com a forma como definimos os papéis, que valem por si só. Não temos o modelo típico de gestão de carreira com uma função e depois aquela escadinha em que vamos passando para o nível um, dois...

     

    Como se faz carreira?

    A carreira está mais focada no impacto que a pessoa pode trazer. As funções estão definidas para o mínimo esperado, porque o máximo depende de cada pessoa. São as pessoas que fazem as funções, não são as funções que fazem as pessoas. Todos nós temos as nossas motivações, paixões, investimos o nosso tempo a fazer determinadas coisas. O modelo de ‘papéis’ desafia as pessoas a trazerem isso para a organização. Por exemplo, uma diretora de felicidade que tem um gosto especial pela área da diversidade e inclusão, mesmo na sua vida pessoal e social, contacta com pessoas dessa área e traz isso para a organização. É o modelo que aplicamos a qualquer função. E temos apenas um nível intermédio. Entre um estagiário, uma pessoa de uma equipa e a direção existe apenas um nível. O nosso modelo é horizontal e não vertical. E o crescimento é uma espécie de mitose celular: quando uma equipa é demasiado grande, criamos duas. Quando uma unidade é demasiado grande, criamos duas e vamos dividindo.

     

    Qual é o maior desafio no objetivo de mudar a forma como nos movemos?

    Como Critical TechWorks o nosso objetivo é acrescentar valor aos produtos da BMW. Não queremos ser apenas um centro que faz o que lhe mandam fazer. Estamos a trabalhar com mais de 260 produtos no contexto da BMW, em diferentes áreas como automação, fábricas, logística, mobilidade. Quem faz essa diferença são as equipas no terreno, que trabalham junto com os colegas da BMW e propõem soluções e iniciativas para melhorar os produtos. O nosso plano original para a empresa era, hoje, sermos à volta de 650 pessoas. Somos 2.500. Isso traduz o que tem sido o contributo para a BMW.

    Estamos a trabalhar na atualização das fábricas para os modelos do futuro, de elétricos e também de condução autónoma, nas fábricas que a BMW tem pelo mundo.

    Como é que a inteligência artificial pode mudar o vosso negócio ou acrescentar valor?

    A inteligência artificial já é utilizada, por exemplo, quando nos sugere um determinado destino sem fazermos nada. Claro que na condução autónoma será mais evidente. É difícil estar a especificar uma em particular. Mas, por exemplo, a deteção de padrões. Perceber que existem crianças no banco de trás um pouco agitadas e que se pode colocar o entretenimento com os desenhos animados. Ou se fechar o carro e deixar uma criança avisar-me por telemóvel que isso está a acontecer. Há muitas áreas onde isso já está a ser utilizado. E terá mais evoluções no futuro.

     

    Há alguma área a desenvolver-se de forma mais significativa?

    As áreas onde se está a ver mais investimento é na eletrificação e na condução autónoma. Mas há também muito investimento da BMW na otimização das fábricas e na utilização de inteligência artificial para as fábricas reduzirem o consumo de energia. Estamos a trabalhar na atualização das fábricas para os modelos do futuro, de elétricos e também de condução autónoma, nas fábricas que a BMW tem pelo mundo.

     

    Está a entrar em vigor um conjunto de exigências para as grandes empresas europeias de reporte de indicadores de sustentabilidade. Como é que isso vos vai afetar?

    A BMW participa num consórcio europeu que é uma plataforma para a transparência dos fornecedores. E nós estamos a trabalhar nessa plataforma. Internamente, na Critical TechWorks, estamos a recolher as medidas para o reporte. Não acreditamos que tenhamos de fazer nada de adicional para cumprir ou satisfazer as metas. O nosso objetivo é ter o reporte já pronto este ano. Queremos antecipar um ano para conseguir perceber o que temos de melhorar para, quando for necessário, estar pronto. E depois a BMW entregará toda essa informação que vamos criar.
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