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Mulheres ganham menos 20%. “É difícil justificar”

Não são promovidas e só um terço chega a cargos de topo, segundo estudo um da EY. O cenário piora quando são mães. António Pires de Lima, do BCSD Portugal, lembra que há uma menor representação do género feminino ao longo da carreira.

Raquel Wise
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Existe paridade na qualificação e acesso ao emprego, mas a partir daí o fosso entre homens e mulheres tende a agravar-se.

131 anos. Este seria o tempo necessário para colmatar as disparidades de salário e oportunidades de evolução na carreira profissional que existem entre homens e mulheres no mercado de trabalho, a nível global, de acordo com as conclusões do mais recente "Global Gender Gap Report" do Fórum Económico Mundial.

Neste contexto, Portugal também não fica bem na fotografia: regista apenas 31% de mulheres em conselhos de administração e nos cargos de topo das empresas apenas 14% são do sexo feminino, tendo o país caído três lugares no ranking mundial - de 29º para 32º - em termos de paridade de género, num total de 146 países avaliados pelo FMI.

Estas conclusões foram confirmadas pelo estudo "Diversidade, Equidade e Inclusão no meio empresarial português", levado a cabo pela consultora EY e pelo Business Council for Sustainable Development (BCSD) Portugal, uma associação sem fins lucrativos da qual fazem parte mais de 200 empresas que operam no país e são responsáveis por cerca de 10% do PIB nacional.

27%LIDERANÇA
Ao nível da direção executiva, 73% são homens e apenas 27% são mulheres, revela o estudo levado a cabo pela EY.

Neste inquérito - cujo objetivo foi avaliar a maturidade das políticas e práticas em termos de diversidade, equidade e inclusão (DEI) - participaram 73 empresas de todo o país (grandes, médias, pequenas e micro), com quase 100 mil colaboradores (54% homens e 46% mulheres), dos mais variados setores de atividade

34%PROMOÇÕES
Depois de serem contratadas, só 34% das mulheres são promovidas, face a 66% dos homens, revela o estudo.
"Com este estudo, concluímos que existe paridade nas qualificações e no acesso ao emprego. Mas termina aí, porque as promoções só abrangem um terço de mulheres [34%]. Ou seja, há claramente uma menor representação do género feminino - um afunilamento da sua presença - ao longo da cadeia hierárquica e de poder dentro das empresas, sobretudo em funções de liderança e direção executiva", onde apenas 27% são mulheres e 73% homens, explicou em entrevista ao Negócios, António Pires de Lima, CEO da Brisa e presidente do BCSD desde 2022, que terminará o seu mandato em março.

António Pires de Lima está em final de mandato no BCSD Portugal. Ao Negócios lembra o papel das empresas na mudança.


Além desta falta de representatividade feminina no topo das empresas, há um outro "gap" que Pires de Lima diz que "é difícil de justificar". "Para funções idênticas, ainda há diferenças salariais entre homens e mulheres em Portugal que vão até aos 20%", diz o CEO.

Na prática, a fazerem exatamente a mesma coisa que os seus colegas homens, dentro da mesma equipa e da mesma empresa, as mulheres recebem até menos 20%. Num salário de 1500 euros para os trabalhadores masculinos, as mulheres acabam por ganhar apenas 1200 euros (menos 300 euros por mês). Esta diferença "acentua-se nas direção executivas", refere o estudo.

Mulheres acabam por ficar para trás quando são mães. A maternidade é um fator de desaceleramento das carreiras.António Pires de Lima
Presidente do BSCD Portugal

E alerta ainda para um outros problema, que não é exclusivo de Portugal: "Em muitos países, as mulheres acabam por ficar para trás quando são mães. A maternidade é percecionada como um fator de desaceleramento das carreiras", reconhece o gestor, dizendo que, "para inverterem esta tendência, as empresas têm de introduzir práticas de responsabilidade familiar que permitam às mulheres uma melhor conciliação".

Para tentar mudar este panorama, Pires de Lima diz que o primeiro passo está dado e passa por identificar os problemas. "Se não tivermos números e factos concretos, é difícil de trabalhar sobre uma realidade só com base nas intuições", refere o presidente do BCSD.

"Grandes empresas têm maior responsabilidade"

Depois de mais de 20 anos com a sustentabilidade climática no centro da sua atividade (descarbonização, proteção da biodiversidade), desde 2022 o BCSD passou então a olhar mais atentamente para os temas da diversidade, equidade e inclusão (que se inserem na área Social dos critérios ESG) e criou um novo grupo de trabalho (o sexto) do qual fazem já parte mais de 70 empresas associadas.

"A agenda ESG não se reduz à dimensão ambiental. O social é o nosso segundo pilar de desenvolvimento, que partiu de uma preocupação da direção, e foi confirmada na auscultação aos associados através deste estudo" disse Pires de Lima, defendendo: "As empresas portuguesas que promovem políticas DEI tomam decisões mais qualificadas e estão mais preparadas do ponto de vista da competitividade".

Nos temas das vertentes social e de governance do ESG, o BCSD colabora de perto com outras organizações que operam em Portugal: o GRACE - Empresas Responsáveis e o Instituto Português de Corporate Governance (IPCG), com o qual assinou um protocolo de cooperação em 2024.

Quanto a resultados práticos em termos de melhorias das políticas DEI nas empresas portuguesas - depois do estudo e da constituição do grupo de trabalho -, Pires de Lima diz que ainda é cedo para avaliar, e que será um tema herdado pela futura direção e pela equipa do BCSD, organização que conta já com quase duas dezenas pessoas.

"Neste grupo de trabalho são partilhadas as melhores práticas em termos de diversidade, equidade e inclusão que temos dentro das empresas do BCSD, e do caminho que têm trilhado aquelas que estão mais avançadas nestas matérias, e já têm até 50% de mulheres nas funções de topo. É um trabalho em ecossistema, para que os bons exemplos possam inspirar", diz Pires de Lima, lembrando: "No final de contas, o trabalho e a responsabilidade é de cada associado. Não nos compete substituir as empresas".

É fundamental haver códigos de ética com regras claras, dar formação aos colaboradores e estabelecer canais de denúncia.António Pires de Lima
Presidente do BCSD Portugal

Quanto ao terceiro pilar - da governance - o responsável reconhece que é um tema muito importante, mas que ainda não cabe no orçamento do BCSD, apesar de este ter aumentado para 1,5 milhões de euros em 2025. "Portugal está a evoluir positivamente nas três temáticas: ambiental, social e de governance.

Nesta última, tem havido uma preocupação grande das empresas que operam em Portugal - sejam internacionais ou com capital português -, para levarem a cabo as melhores práticas. É fundamental existirem códigos de ética com regras claras, dar formação aos colaboradores e estabelecer canais de denúncia. As grandes empresas têm maior responsabilidade", reconhece Pires de Lima.

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