- Partilhar artigo
- ...
Há seis anos foi definida a Rede de Pactos para os plásticos. Uma rede com vários países, cada um deles com um pacto. Objetivo: reduzir a utilização deste material e aumentar a circularidade do mesmo. Houve avanços, mas um relatório recente conclui que o trabalho feito não é suficiente.
Segundo a Ellen MacArthur Foundation, durante este período "dezenas de milhares de milhões de artigos de plástico problemáticos ou desnecessários foram eliminados". Os dados indicam que a conceção para reutilização, reciclagem e composição na prática e à escala aumentou 23% e a incorporação de conteúdos reciclados nas embalagens cresceu 44%.
Para compreender o real impacto dos pactos - e o que deve ser melhorado -, a fundação, em colaboração com a WRAP, elaborou o relatório intitulado "Scaling Impact: The Plastics Pact Network’s Six-Year Journey Towards Eliminating Plastic Pollution and Waste".
O documento partilha o impacto e as lições aprendidas nos últimos seis anos da Rede do Pactos para os Plásticos e destaca o seu papel contínuo na condução de ações locais e colaborativas em todo o mundo, informando e complementando a política nacional e um tratado global para os plásticos.
As três conclusões
Os pactos para os plásticos são plataformas bem estabelecidas para a colaboração, criação de conhecimentos baseados em provas, bem como para a partilha e criação de transparência. Os dados indicam que o modelo escolhido produziu resultados tangíveis no terreno, promovendo uma rede robusta de partes interessadas empenhadas em ações responsáveis a nível nacional, regional e global.
A Rede do Pacto para os Plásticos está a demonstrar o impacto rápido e impressionante que pode ser alcançado através de uma ação voluntária de colaboração. No entanto, as informações recolhidas indicam que isso não é suficiente. "As lições aprendidas até agora reforçam a necessidade de medidas políticas vinculativas adicionais e mais ambiciosas, bem como de uma ação voluntária acelerada por parte das empresas. Não se trata de uma questão de ‘ou um ou outro’: ambos são cruciais para combater os resíduos de plástico e a poluição ao ritmo e à escala necessários", lê-se.
O relatório destaca ainda a importância dos pactos, considerando que estes estão numa posição única para informar e apoiar a implementação de um futuro tratado global para os plásticos a nível nacional. "A Rede do Pacto para os Plásticos oferece um meio comprovado de envolver as partes interessadas na cadeia de valor dos plásticos e de as ajudar a efetuar as mudanças necessárias, a um ritmo acelerado."
No decorrer deste estudo, a ONG de ação climática Programa de Ação de Resíduos e Recursos (Waste and Resources Action Programme - WRAP) afirmou que a forma como produzimos e utilizamos os plásticos representa um risco para as pessoas e para o planeta. Para a ONG, a Rede de Pactos para os Plásticos é uma resposta coordenada a nível global a este problema mundial. A entidade refere mesmo que os os pactos para o plástico conseguiram eliminar mais de 360 mil toneladas de plásticos problemáticos e desnecessários, evitando que milhares de milhões de artigos fossem parar a aterros ou filtrados no ambiente. "Globalmente, os membros dos pactos para os plásticos evitaram a utilização de mais de 2,2 milhões de toneladas de plástico virgem até 2022".
Em janeiro de 2023, a Iniciativa de Plásticos da Fundação Ellen MacArthur uniu esforços à WRAP e à Parceria Global para Ação Climática (Global Plastic Action Partnership - GPAP) do Fórum Económico Mundial.
As três entidades desenvolviam, desde 2018, iniciativas para combater a poluição por plásticos. Hoje essas iniciativas abrangem coletivamente mais de 20 países, com quatro objetivos em mente: a eliminação de plásticos desnecessários e problemáticos; a conceção para reutilização e reciclagem; a reciclagem efetiva na prática e à escala; e a inclusão de conteúdos reciclados.
Portugal divulgou em março o 3.º Relatório de Progresso do Pacto Português para os Plásticos que definiu cinco metas a atingir até 2025: eliminar os plásticos de utilização única; assegurar que 100% das embalagens de plástico colocadas no mercado sejam reutilizáveis, recicláveis ou compostáveis; garantir que 70% ou mais das embalagens plásticas sejam efetivamente recicladas, através do aumento da recolha e reciclagem; incorporar, em média, 30% de plástico reciclado nas novas embalagens; e promover atividades de sensibilização e educação dirigidas aos consumidores atuais e futuros para a utilização circular dos plásticos.
Coordenadora do Pacto Português para os Plásticos
Aquando da divulgação do relatório, Patrícia Carvalho, coordenadora do Pacto Português para os Plásticos, referiu que "ao analisarmos o progresso em relação às metas estabelecidas para 2025, é muito importante reconhecer as áreas em que enfrentamos desafios e identificar os caminhos para superá-los", acrescentando que "ao definir as metas para 2025, o Pacto Português para os Plásticos e os seus membros foram muito ambiciosos". "É assim que continuamos, no entanto, a evolução dos resultados é mais lenta do que se esperava inicialmente", frisou.
Sobre a situação portuguesa, a associação ambientalista Zero lembra que, nos plásticos, apenas a parte relativa às embalagens está sujeita a uma contabilização mais próxima, uma vez que existem metas comunitárias a cumprir.
A associação acrescenta que, "oficialmente, Portugal cumpre as metas de reciclagem de embalagens de plástico, contudo, dado que a Zero tem contestado os dados que são considerados para o seu cálculo e ainda aguarda pela publicação do estudo feito pela Agência Portuguesa do Ambiente (APA) e pelo Instituto Nacional de Estatística (INE), que deverá esclarecer este assunto, reservamo-nos o direito de duvidar dessa avaliação".
Os números divulgados por várias instituições e entidades oficiais mostram que a maioria dos resíduos de embalagens de plástico ainda vão para aterro e incineração, o mesmo acontecendo com a esmagadora maioria de outros plásticos. Cenário que dificulta o atingir do objetivo da circularidade dos plásticos.
Mesmo que as empresas queiram utilizar plástico reciclável como matéria-prima das suas embalagens a verdade é que este não existe em quantidade suficiente. A Zero dá outra perspetiva do mesmo problema. A associação considera que as empresas, quando promovem mudanças, tentam mudar de material e não de abordagem (de descartável para reutilizável). "A alteração de um modelo descartável para reutilizável implica alterações mais estruturais em termos de organização interna, logística, comunicação e interação com o cliente, que a maioria das empresas só desenvolverá se forem obrigadas (nomeadamente por legislação). O modelo descartável, ainda que seja uma importante fonte de impactos negativos para o ambiente, continua a funcionar bem para as empresas que o promovem, pelo que não há grandes incentivos para a mudança. Daí a necessidade da intervenção através da legislação e de um sistema de incentivos e penalizações", explica ainda a Zero.
Diretor-geral da SDR Portugal
O sistema proposto pela SDR Portugal, associação sem fins lucrativos cujo objetivo é criar e gerir o Sistema de Depósito e Reembolso (SDR) das embalagens de bebidas de uso único, pode ser uma solução. Como refere o seu diretor-geral, Miguel Aranda da Silva, o Sistema de Depósito e Reembolso é um exemplo de economia circular na medida em que promove a recolha dedicada destas embalagens, com vista a reduzir significativamente o número de embalagens depositadas no ambiente de forma inadequada e, ao mesmo tempo, melhora a qualidade do material reciclável recolhido para que este?possa ser incorporado na produção de novas embalagens.
Miguel Aranda da Silva diz mesmo que com o SDR a funcionar, como é esperado a partir de janeiro de 2026, Portugal terá possibilidade de triplicar a atual taxa de recolha de embalagens, que se fixa na ordem dos 30%. E lembra que em Portugal, anualmente, há milhares de milhões de embalagens que não têm o destino devido. Algo que a SDR pretende corrigir, "criando condições para que o cidadão-consumidor participe, de forma voluntária e interessada, na recolha e deposição adequado destas embalagens".
Para a Zero, as metas do novo regulamento europeu podiam ser mais ambiciosas, dado que o que está previsto não será suficiente para atingir os objetivos de redução previstos. Razão pela qual a associação defende maior ambição, assim como a clarificação das regras (uma embalagem reutilizável é mesmo para ser reutilizada tantas vezes quantas possível, e incentivos e penalizações, de forma a fomentar as melhores soluções e dar-lhes um impulso inicial). Sem esquecer a colaboração entre as várias entidades, dado que a "reutilização requer colaboração e partilha de soluções".
Já no que concerne à recolha seletiva e à reciclagem, a Zero considera que há trabalho a fazer, nomeadamente no que se refere ao planeamento de embalagens para que sejam monomaterial e de materiais facilmente identificáveis pelo consumidor (portanto, logo na fase do design da embalagem). Depois é fundamental ter um sistema de recolha seletiva de embalagens de grande proximidade (a Zero defende a recolha porta a porta pelos resultados que apresenta), aplicar sistemas de "Pay-as-you-throw" (PAYT), onde quem não separa é penalizado financeiramente, e é também fundamental promover a sustentabilidade financeira do Sistema Integrado de Gestão de Resíduos de Embalagens (SIGRE), dado que no momento quer o ecovalor (pago por quem coloca as embalagens no mercado), quer o valor de contrapartida (valor recebido pelos municípios os pelos sistemas de gestão de resíduos pelos serviços de recolha e triagem) está muito abaixo do necessário.
Medidas essenciais se se quer promover a diminuição da utilização do plástico e aumentar a reutilização do mesmo. E que, no caso de Portugal, defende a Zero, são imprescindíveis, dado que o país importa uma boa parte das matérias-primas que utiliza. "Apostando na economia circular podemos potenciar recursos que já estão em circulação na economia, evitando que se tornem resíduos e promovendo uma economia mais resiliente, promovendo, ao mesmo tempo, a indústria nacional", explica a Zero.