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Obstáculos ao triunfo das energias renováveis

Para ultrapassar os obstáculos, captar investimento estrangeiro e posicionar Portugal como um “hub” de inovação e investigação na área das energias renováveis, é necessário que este setor seja classificado como um desígnio nacional, como foi no passado a entrada para a então CEE. Infelizmente, este tema tem estado ausente da campanha política.

Bruno Proença 21 de Fevereiro de 2024 às 14:00
Bruno Proença, Consultor de Sustentabilidade
Bruno Proença, Consultor de Sustentabilidade
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Escrevi neste espaço, na semana transata, sobre a evolução das energias renováveis em Portugal e como poderemos ser um "player" relevante neste setor. Esta é uma oportunidade que o país não deve desperdiçar.

Segundo as Redes Energéticas Nacionais (REN), a produção de energia renovável no ano passado atingiu o valor mais elevado de sempre no sistema português, representando 61% do consumo de energia elétrica. Este resultado recorde teve uma componente conjuntural, associado à meteorologia. Mas é igualmente fruto de um investimento consistente de muitas décadas. Desde o século passado que a produção elétrica em Portugal teve uma forte componente hídrica, resultante da aposta em barragens. Na primeira década deste século chegou o investimento na energia eólica. E, mais recentemente, no solar, aproveitando as excelentes condições naturais do país.

O setor das energias renováveis atingiu já em Portugal uma certa maturidade, para além da concentração de conhecimento em diversos "stakeholders". Por isso, Portugal tem condições para se tornar uma potência nesta área. Não na produção de equipamentos, pois aqui, para ser competitivo, é necessária uma escala que não tem. Atualmente, a China é o maior produtor mundial de equipamentos e materiais associados à energia eólica, solar, para além do fabrico de veículos elétricos. Porém, à partida, nada impede que Portugal seja um dos líderes na investigação, inovação e produção de conhecimento. O caminho não será fácil, ainda assim parece-me transponível.

Num estudo, divulgado em janeiro deste ano ("Global energy perspective 2023: Transition bottlenecks and unlocks"), a McKinsey identificou os possíveis obstáculos à transição para um novo paradigma energético (que promova o "net zero" em termos de emissões de gases com efeitos de estufa). Primeiro, a possível falta de materiais, como lítio ou cobre, que são necessários para as novas tecnologias verdes. Segundo, a ausência dos recursos necessários, como, por um lado, mão de obra com os conhecimentos adequados e, por outro, a capacidade de produção das tecnologias verdes. Terceiro, a falta de terrenos para a instalação de projetos de energia eólica e solar. Quarto, será que as infraestruturas, como as redes elétricas, se vão desenvolver ao ritmo necessário? Quinto, as novas tecnologias verdes necessitam de ser competitivas, em termos de custo, relativamente às tecnologias incumbentes. Sexto, será que haverá o investimento necessário para garantir a descarbonização da economia?

Os obstáculos identificados pela McKinsey não devem ser desvalorizados. Ainda assim, podemos verificar que Portugal tem resposta imediata para alguns deles. Nomeadamente, temos das reservas de lítio mais importantes na Europa; não faltam terrenos em Portugal para projetos eólicos e solares e já temos alguma mão de obra com elevados conhecimentos nestas áreas. Os grandes desafios são o investimento na rede elétrica nacional que não está otimizada para aproveitar a produção de energia renovável. E, sobretudo, a captação de investimento internacional para a transição da economia para um modelo de baixo carbono, o que implica outro "mix" energético.

Para resolver estes desafios, captar investimento estrangeiro e posicionar Portugal como um "hub" de inovação e investigação na área das energias renováveis, é necessário que este setor seja classificado como um desígnio nacional, como foi no passado a entrada para a então CEE. Por outras palavras, é necessário um entendimento entre os principais partidos, pois a instabilidade regulatória e de políticas públicas é o que mais assusta (e afasta) os investidores internacionais. Repito o que já afirmei anteriormente: infelizmente, este tema tem estado ausente da campanha política. Mais uma oportunidade perdida?

Ciências e Factos EUAO JPMorgan Asset Management e o State Street Global Advisors abandonaram a Climate Action 100+, isto depois de a BlackRock ter seguido um movimento semelhante. A Climate Action 100+ é uma organização que promove a sustentabilidade ESG nas organizações. Isto é mais uma prova de que a agenda do partido Republicano está a ganhar espaço nos Estados Unidos.

União EuropeiaNão é somente nos EUA que os temas da Sustentabilidade estão a suportar ventos contra. Também na União Europeia se começa a observar fenómeno semelhante perante a pressão de vários "stakeholders", como agricultores e empresários. A aprovação final da nova diretiva relativa ao dever de diligência das empresas em matéria de sustentabilidade deverá ser adiada, depois de a Alemanha levantar novas reservas.
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