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Para uma empresa cumprir os critérios ambientais, sociais e de governação (ESG, sigla em inglês), é necessário que não perca o foco naquilo que será o seu objetivo fundamental: o crescimento económico. "Para sermos sustentáveis temos de crescer mais", referiu Stuart Kirk, colunista do Financial Times e ex-gestor de ativos do HSBC, sublinhando que "nada do que existe em torno do ESG e da sustentabilidade pode ser resolvido sem dinheiro. O mais importante é garantir que a sua economia está a crescer e que as empresas são úteis, saudáveis e lucrativas. Só quando os fundos estão disponíveis é que todos os problemas que estamos a tentar resolver podem ser solucionados."
Na conferência dedicada à governação das empresas, a terceira do Ciclo de Conferências ESG do Negócios Sustentabilidade 20|30, que decorreu nesta quarta-feira, no Centro Cultural de Cascais, o keynote speaker destacou que governos e reguladores também devem ter esta questão bem presente e não devem, por isso, "tirar os olhos do fundamental", sob pena de condenarem as empresas ao fracasso. Sobretudo na Europa, onde o ex-gestor de ativos do HSBC considera que existe demasiada regulamentação. "Existe um risco real na Europa de sufocarmos empresas e gestores de ativos com demasiada regulamentação ESG." E tal pode continuar a favorecer as empresas dos EUA sobre as europeias, defendeu, recordando que só existem 10 empresas europeias entre as 100 primeiras melhores a nível mundial.
Stuart Kirk acredita que o caminho deve ser rumo à sustentabilidade, mas é crítico da subserviência ao ESG que não dá espaço a visões divergentes. Critica também a falta de estandardização nas temáticas, na medida em que significam coisas diferentes para pessoas diferentes, o que pode causar inúmeros problemas. "A sustentabilidade no ESG é bastante nova, não há regras e ninguém sabe realmente a forma correta de a aplicar", salientou na conferência, acrescentando que "todos devemos abordá-la da forma correta, a partir dos mesmos princípios, como seres humanos inteligentes que somos, em vez de receber ordens de pessoas que abraçam árvores ou geram muita burocracia a partir de Bruxelas ou Frankfurt".
Fora as críticas a algum "fundamentalismo", o colunista do Financial Times destacou que a sustentabilidade é o rumo, seja para investidores, empresas ou bancos, até porque o mercado de ativos verdes está em amplo crescimento, há oito ou nove anos. "Vejam os números agora, estamos quase a aproximar-nos dos 60 biliões de dólares e todos sabem que o mercado global de ações é de cerca de 120 ou 130 biliões. Portanto, metade de todo o dinheiro das ações no mundo conseguiu cumprir algum tipo de critério ESG."
O analista sublinhou ainda o papel fundamental das empresas na transição para um mundo mais sustentável, salientando que dois terços das pessoas trabalham para empresas e que questões de ordem ambiental e social podem ser resolvidas em grande parte dentro destas organizações. "As empresas desempenham um papel absolutamente crucial para tornar o mundo num lugar melhor. Não há qualquer dúvida quanto a isso", referiu.
Mercado verde em crescimento
João Nuno Mendes, secretário de Estado das Finanças, que fez a abertura institucional da conferência "Governação | Como gerir a mudança com instabilidade e incerteza?", começou por sublinhar também o crescimento do investimento em produtos sustentáveis. "Nos últimos anos, o ESG tem vindo a crescer de forma extraordinária", nomeadamente "o investimento do ponto de vista das emissões no mercado de produtos que estão relacionados com o ambiente e com a sociedade". O governante destacou que 2021 foi o ano recorde neste sentido, uma vez que 2022 sofreu com "o ambiente de incerteza, com a elevação das taxas de juro e com as consequências da política monetária sobre os mercados. Esta incerteza fez com que houvesse adiamento de emissões." Por outro lado, destacou positivamente o aumento do escrutínio sobre as emissões ESG, considerando que "é fundamental que estejamos efetivamente perante emissões que sejam verdadeiramente verdes e a favor da sociedade", de forma a evitar o greenwashing. João Nuno Mendes sublinhou também o papel da União Europeia como "líder de sustentabilidade à escola global", defendendo que "a União Europeia tem feito coisas absolutamente extraordinárias que têm marcado este percurso. Tem sido líder no sentido em que outros grandes blocos regionais têm seguido aquilo que é a liderança da União Europeia." O secretário de Estado destacou que "é fundamental sublinharmos que o instrumento de cooperação e resiliência que dá origem aos PRR em cada um dos países tem sensivelmente 37% das suas verbas destinadas à transição para uma economia mais verde. É uma verba absolutamente extraordinária." Em Portugal, tal representa cerca de 6,3 mil milhões de euros. "Uma verba que terá grandes impactos na transição para uma economia verde no nosso país e no conjunto da União Europeia", salientou.
João Nuno Mendes deixou também uma palavra positiva sobre a sustentabilidade das contas públicas portuguesas, recordando que, "em 2022, a dívida pública portuguesa ficará próxima de 115% do PIB, em 2023, espera-se que este rácio seja 24 pontos percentuais abaixo daquilo que é o seu pico de 2020, que foi sensivelmente 134,9%. Este é um desempenho absolutamente extraordinário do caso português, no padrão europeu, que tem suscitado um grande interesse por parte dos nossos parceiros europeus. Isto pode-nos levar ao ponto de, em 2023, ficar abaixo da dívida".
A conferência sobre governação contou também com Margarida Corrêa de Aguiar, presidente da Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões, como keynote speaker. A responsável começou por referir que "o conjunto de objetivos ESG tornou-se indissociável nos modelos de desenvolvimento das economias e das sociedades", sublinhando que "as considerações ambientais, das quais a face mais visível é até ao momento o combate às alterações climáticas, bem como os impactos sociais e os modelos de governação, tornaram-se fundamentais no planeamento e decisão ao longo da hierarquia e das cadeias de valor das atividades económicas e financeiras, bem como das políticas públicas.
Focando-se no setor financeiro, Margarida Corrêa de Aguiar evidenciou o seu "papel fundamental na transição para uma economia sustentável", na medida em que este objetivo requer "recursos financeiros consideráveis". Caracterizou também como "desafiante" a promoção do novo paradigma económico que tem levado à produção de um quadro relatório "abrangente e complexo e que exige uma adaptação dos vários intervenientes nos mercados financeiros, passando pelas autoridades de supervisão, operadores e consumidores".
Nesse sentido, evidenciou ser necessário promover a literacia e a sensibilidade relativamente aos temas relacionados com a sustentabilidade, considerando que "subsistem insuficiências generalizadas, tanto ao nível dos operadores, quer financeiros quer dos agentes económicos em geral, como ao nível dos consumidores, para identificar, compreender, comparar ou agregar as métricas climáticas mais apropriadas para cada tipo de uso".
Debater a melhor governação
A conferência abordou quatro temáticas em debates com especialistas em cada área, nomeadamente sobre medição da sustentabilidade, produtos financeiros ESG, desafios da transformação digital e comunicação de práticas de sustentabilidade pelas empresas.
No debate sobre a medição da sustentabilidade, ficou claro que a existência de múltiplos indicadores dificulta a medição dos critérios ambientais, socias e de governação de uma organização, sendo que muitas vezes não há harmonização no setor. Salientou-se também a "excessiva" regulamentação que pesa sobre as empresas nesta área, com o crescente número de leis a ser considerado um enorme desafio para as empresas na transição para a sustentabilidade. O segundo debate debruçou-se sobre a procura e oferta de produtos financeiros ESG, evidenciando-se que existe um claro interesse nestes instrumentos, mas não esquecendo que os "investidores vão querer sempre rentabilidade". Destacou-se a necessidade de escrutínio para se evitar situações de ecobranqueamento. Motivo pelo qual a monitorização do percurso das emissões verdes é essencial, assim como aconselhamento especializado junto dos diferentes intervenientes. As exigências regulatórias, nomeadamente a taxonomia europeia, foram tidas neste painel também como algo muito exigente. A discussão prosseguiu da parte da tarde sobre o papel da tecnologia na promoção da sustentabilidade. Foi considerado que a transformação verde não pode ser dissociada da transformação digital, nomeadamente através de tecnologias de inteligência artificial, cibersegurança ou IoT (Internet das Coisas). Porém, para isso, é necessário que haja literacia digital e conectividade, de forma a desenvolver a participação digital dos consumidores, empresas e administração pública. E também é preciso que uma determinada solução digital traga valor às pessoas para que seja adotada. Por fim, comunicar a sustentabilidade foi também considerado uma estratégia essencial. Os intervenientes no último debate sublinharam a necessidade de as organizações transmitirem o que estão a desenvolver na sua transformação sustentável, não só como forma de transparência, mas também porque interessa cada vez mais aos consumidores e eventuais colaboradores ligarem-se a empresas que tenham estes propósitos.
Na conferência dedicada à governação das empresas, a terceira do Ciclo de Conferências ESG do Negócios Sustentabilidade 20|30, que decorreu nesta quarta-feira, no Centro Cultural de Cascais, o keynote speaker destacou que governos e reguladores também devem ter esta questão bem presente e não devem, por isso, "tirar os olhos do fundamental", sob pena de condenarem as empresas ao fracasso. Sobretudo na Europa, onde o ex-gestor de ativos do HSBC considera que existe demasiada regulamentação. "Existe um risco real na Europa de sufocarmos empresas e gestores de ativos com demasiada regulamentação ESG." E tal pode continuar a favorecer as empresas dos EUA sobre as europeias, defendeu, recordando que só existem 10 empresas europeias entre as 100 primeiras melhores a nível mundial.
Stuart Kirk acredita que o caminho deve ser rumo à sustentabilidade, mas é crítico da subserviência ao ESG que não dá espaço a visões divergentes. Critica também a falta de estandardização nas temáticas, na medida em que significam coisas diferentes para pessoas diferentes, o que pode causar inúmeros problemas. "A sustentabilidade no ESG é bastante nova, não há regras e ninguém sabe realmente a forma correta de a aplicar", salientou na conferência, acrescentando que "todos devemos abordá-la da forma correta, a partir dos mesmos princípios, como seres humanos inteligentes que somos, em vez de receber ordens de pessoas que abraçam árvores ou geram muita burocracia a partir de Bruxelas ou Frankfurt".
Fora as críticas a algum "fundamentalismo", o colunista do Financial Times destacou que a sustentabilidade é o rumo, seja para investidores, empresas ou bancos, até porque o mercado de ativos verdes está em amplo crescimento, há oito ou nove anos. "Vejam os números agora, estamos quase a aproximar-nos dos 60 biliões de dólares e todos sabem que o mercado global de ações é de cerca de 120 ou 130 biliões. Portanto, metade de todo o dinheiro das ações no mundo conseguiu cumprir algum tipo de critério ESG."
O analista sublinhou ainda o papel fundamental das empresas na transição para um mundo mais sustentável, salientando que dois terços das pessoas trabalham para empresas e que questões de ordem ambiental e social podem ser resolvidas em grande parte dentro destas organizações. "As empresas desempenham um papel absolutamente crucial para tornar o mundo num lugar melhor. Não há qualquer dúvida quanto a isso", referiu.
Mercado verde em crescimento
João Nuno Mendes, secretário de Estado das Finanças, que fez a abertura institucional da conferência "Governação | Como gerir a mudança com instabilidade e incerteza?", começou por sublinhar também o crescimento do investimento em produtos sustentáveis. "Nos últimos anos, o ESG tem vindo a crescer de forma extraordinária", nomeadamente "o investimento do ponto de vista das emissões no mercado de produtos que estão relacionados com o ambiente e com a sociedade". O governante destacou que 2021 foi o ano recorde neste sentido, uma vez que 2022 sofreu com "o ambiente de incerteza, com a elevação das taxas de juro e com as consequências da política monetária sobre os mercados. Esta incerteza fez com que houvesse adiamento de emissões." Por outro lado, destacou positivamente o aumento do escrutínio sobre as emissões ESG, considerando que "é fundamental que estejamos efetivamente perante emissões que sejam verdadeiramente verdes e a favor da sociedade", de forma a evitar o greenwashing. João Nuno Mendes sublinhou também o papel da União Europeia como "líder de sustentabilidade à escola global", defendendo que "a União Europeia tem feito coisas absolutamente extraordinárias que têm marcado este percurso. Tem sido líder no sentido em que outros grandes blocos regionais têm seguido aquilo que é a liderança da União Europeia." O secretário de Estado destacou que "é fundamental sublinharmos que o instrumento de cooperação e resiliência que dá origem aos PRR em cada um dos países tem sensivelmente 37% das suas verbas destinadas à transição para uma economia mais verde. É uma verba absolutamente extraordinária." Em Portugal, tal representa cerca de 6,3 mil milhões de euros. "Uma verba que terá grandes impactos na transição para uma economia verde no nosso país e no conjunto da União Europeia", salientou.
João Nuno Mendes deixou também uma palavra positiva sobre a sustentabilidade das contas públicas portuguesas, recordando que, "em 2022, a dívida pública portuguesa ficará próxima de 115% do PIB, em 2023, espera-se que este rácio seja 24 pontos percentuais abaixo daquilo que é o seu pico de 2020, que foi sensivelmente 134,9%. Este é um desempenho absolutamente extraordinário do caso português, no padrão europeu, que tem suscitado um grande interesse por parte dos nossos parceiros europeus. Isto pode-nos levar ao ponto de, em 2023, ficar abaixo da dívida".
A conferência sobre governação contou também com Margarida Corrêa de Aguiar, presidente da Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões, como keynote speaker. A responsável começou por referir que "o conjunto de objetivos ESG tornou-se indissociável nos modelos de desenvolvimento das economias e das sociedades", sublinhando que "as considerações ambientais, das quais a face mais visível é até ao momento o combate às alterações climáticas, bem como os impactos sociais e os modelos de governação, tornaram-se fundamentais no planeamento e decisão ao longo da hierarquia e das cadeias de valor das atividades económicas e financeiras, bem como das políticas públicas.
Focando-se no setor financeiro, Margarida Corrêa de Aguiar evidenciou o seu "papel fundamental na transição para uma economia sustentável", na medida em que este objetivo requer "recursos financeiros consideráveis". Caracterizou também como "desafiante" a promoção do novo paradigma económico que tem levado à produção de um quadro relatório "abrangente e complexo e que exige uma adaptação dos vários intervenientes nos mercados financeiros, passando pelas autoridades de supervisão, operadores e consumidores".
Nesse sentido, evidenciou ser necessário promover a literacia e a sensibilidade relativamente aos temas relacionados com a sustentabilidade, considerando que "subsistem insuficiências generalizadas, tanto ao nível dos operadores, quer financeiros quer dos agentes económicos em geral, como ao nível dos consumidores, para identificar, compreender, comparar ou agregar as métricas climáticas mais apropriadas para cada tipo de uso".
Debater a melhor governação
A conferência abordou quatro temáticas em debates com especialistas em cada área, nomeadamente sobre medição da sustentabilidade, produtos financeiros ESG, desafios da transformação digital e comunicação de práticas de sustentabilidade pelas empresas.
No debate sobre a medição da sustentabilidade, ficou claro que a existência de múltiplos indicadores dificulta a medição dos critérios ambientais, socias e de governação de uma organização, sendo que muitas vezes não há harmonização no setor. Salientou-se também a "excessiva" regulamentação que pesa sobre as empresas nesta área, com o crescente número de leis a ser considerado um enorme desafio para as empresas na transição para a sustentabilidade. O segundo debate debruçou-se sobre a procura e oferta de produtos financeiros ESG, evidenciando-se que existe um claro interesse nestes instrumentos, mas não esquecendo que os "investidores vão querer sempre rentabilidade". Destacou-se a necessidade de escrutínio para se evitar situações de ecobranqueamento. Motivo pelo qual a monitorização do percurso das emissões verdes é essencial, assim como aconselhamento especializado junto dos diferentes intervenientes. As exigências regulatórias, nomeadamente a taxonomia europeia, foram tidas neste painel também como algo muito exigente. A discussão prosseguiu da parte da tarde sobre o papel da tecnologia na promoção da sustentabilidade. Foi considerado que a transformação verde não pode ser dissociada da transformação digital, nomeadamente através de tecnologias de inteligência artificial, cibersegurança ou IoT (Internet das Coisas). Porém, para isso, é necessário que haja literacia digital e conectividade, de forma a desenvolver a participação digital dos consumidores, empresas e administração pública. E também é preciso que uma determinada solução digital traga valor às pessoas para que seja adotada. Por fim, comunicar a sustentabilidade foi também considerado uma estratégia essencial. Os intervenientes no último debate sublinharam a necessidade de as organizações transmitirem o que estão a desenvolver na sua transformação sustentável, não só como forma de transparência, mas também porque interessa cada vez mais aos consumidores e eventuais colaboradores ligarem-se a empresas que tenham estes propósitos.