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Lixo dos turistas: “Quem paga são os portugueses”, diz SPV

Portugal produz cinco milhões de toneladas de resíduos por ano: 57% vão para aterro e 15% para incineração. Apenas 16% são reciclados. Com o turismo a crescer, aumenta também o lixo deixado para trás pelos visitantes, cuja recolha e tratamento são pagos pelos cidadãos na fatura da água. A Sociedade Ponto Verde diz que é “injusto”.

22 de Agosto de 2024 às 08:30
A presidente da SPV, Ana Trigo Morais, alerta que há embalagens no valor de 35 milhões de euros a seguirem para aterro, quando podiam ser recicladas.
A presidente da SPV, Ana Trigo Morais, alerta que há embalagens no valor de 35 milhões de euros a seguirem para aterro, quando podiam ser recicladas. Bruno Colaço
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Os serviços de recolha e tratamento do lixo produzido por milhões de turistas que todos os anos visitam o país estão a ser pagos pelos contribuintes portugueses. Este custo está a ser cobrado diretamente nas faturas mensais de água. O alerta é deixado pela presidente da Sociedade Ponto Verde (SPV), Ana Trigo Morais, que considera a situação injusta. A entidade privada que gere o sistema integrado de embalagens não tem ainda uma avaliação feita aos custos associados aos resíduos produzidos pelos turistas, mas diz que essa contabilização é urgente.

“Não sei dizer quanto é que isto vale, mas é bastante injusto para os contribuintes terem de pagar na taxa de gestão de resíduos associada ao consumo de água das suas casas os resíduos produzidos pelos turistas. Sejam eles colocados nos ecopontos ou não. Há uma externalidade da atividade turística nas vilas, praias, montanhas, cidades, e quem está a pagar são os moradores desses sítios”, disse a responsável, defendendo que esse impacto pode e deve “ajudar a melhorar a gestão dos resíduos nas regiões afetadas”.

Para isso, defende, o primeiro passo é acabar com a taxa de gestão de resíduos indexada ao consumo de água, o que está previsto para 1 de janeiro de 2025. “No dia em que isso acontecer, os contribuintes vão questionar-se: porque é que eu pago tanto pelos resíduos, se eu só produzo isto?”, garante. Outra solução passa por usar as taxas turísticas cobradas pelos municípios para mitigar o impacto nos resíduos e financiar as melhorias nos serviços de higiene urbana, tal como estava previsto na sua criação. No entanto, essa decisão cabe a cada autarquia.

Do lado dos ambientalistas, Rui Berkemeier, da associação Zero, diz que o principal problema é o atual sistema de recolha de resíduos (também a cargo dos municípios), “que não é bom e está estagnado”. “A pressão extra da atividade turística só evidencia o que não está bem”, refere. E dá um exemplo: “As garrafas de água de plástico que os turistas compram – e os portugueses também – vão parar às papeleiras e daí para aterro ou incineração. Falta implementar os sistemas de depósito e reembolso nos supermercados, a recolha porta a porta, para passarmos a pagar o lixo em função do que produzimos”, defende o ambientalista.

Aterros no limite máximo

Ana Trigo Morais diz mesmo que “a principal razão para Portugal não estar a cumprir as metas está na recolha dos resíduos. “É um fator crítico para o sucesso da reciclagem. Seja de uma embalagem, de um telemóvel, de peças de roupa ou móveis, medicamentos”, explica. Os números mais recentes da Agência Portuguesa do Ambiente (APA), de 2022, mostram que nesse ano o país produziu mais de cinco milhões de toneladas de resíduos urbanos (um quarto são embalagens), com 77% de recolha indiferenciada e 21% de recolha seletiva. Aqui, 9% vêm dos ecopontos e 4% do porta a porta. O relatório da APA diz que “a recolha seletiva se encontra praticamente estagnada”: entre 2017 e 2022, aumentou de 16 para 21%.

Quanto ao destino a dar aos resíduos, 57% – três milhões de toneladas – ainda vão para aterro e 15% para incineração Apenas 16% foram reciclados em 2022. “Chamamos-lhes lixo, mas há valor económico nos resíduos. Neste momento, estamos a enviar para aterro recicláveis no valor de 35 milhões de euros “, avisa a presidente da SPV. Em Portugal há 34 aterros, sendo que no final de 2021 a capacidade dos mesmos era de apenas 15 milhões de toneladas. Neste momento já será ainda mais reduzida, mas não existem números atualizados disponíveis.

“O país tem um grave problema de aterros, que estão a esgotar-se. Por isso, no espaço de 10 anos queremos zero embalagens nos aterros. Não é aceitável que continue a acontecer”, diz a presidente da SPV, lembrando que “Portugal não cumpre historicamente as metas de reciclagem dos resíduos urbanos, exceto nas embalagens, que são da responsabilidade da SPV”. Ainda assim, no vidro as metas também não são cumpridas, alerta a responsável, com 40% das embalagens (de cafés, restaurantes e hotéis) a “perderem-se” para aterro, obrigando a indústria a importar matéria-prima que podia ser reciclada.

Quanto ao futuro, Ana Trigo Morais vê com grande preocupação as novas metas de reciclagem – ainda mais ambiciosas – que Portugal vai ter de cumprir. E espera que a tendência se inverta e que o setor esteja entre as prioridades do atual Governo. “Os resíduos têm sido o parente pobre da política ambiental em Portugal”, remata.

 

16%
reciclagem
De cinco milhões de toneladas de resíduos produzidos em 2022 no país, só 16% foram para reciclagem. 57% seguiram para aterro.

 

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